segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Paulista da capital

Estava eu, com uma carioca e um mineiro no prestigiado Santo Grão, uma espécie de café-bistrot da Rua Oscar Freire.


“E o senhor vai pedir o que?”

Perguntou-me o garçom.

E eu quase respondo.

“Seis pãezinhos, 250 gramas de queijo e 250 gramas de presunto e aqui estão os vasilhames”.

Antes de o leitor me chamar de encrenqueiro explico. O lugar onde está o Santo Grão hoje, ficava a antiga padaria Domani, a qual minha mãe me mandava comprar pão.

Na época em que a loja Side Walk se chamava sorveteria Caramba e que a sorveteria Soto Zero era a loja de brinquedos Piá.

Ao ler a revista Veja São Paulo dessa semana sobre os marcos e pessoas importantes, para a consolidação da metrópole me fez pensar na minha vila.

Na doceira Duomo com suas tortinhas de morango, seu lustre colorido que minha mãe e minha avó me levavam e de onde eu via os ônibus elétricos da Rua Augusta.

O Pão de Açúcar chamava-se Casa da Banha. Meus amigos eram do Dante e do São Luiz, mas nós estudávamos num colégio descolado lá pros lados de Pinheiros. Acho que meus pais achavam o Dante em desacordo com a redemocratização ou coisa que o valha.

Ainda havia a La Baguette na Rua Padre João Manoel em que os clientes devolviam a embalagem de papel para levar o pão tal quais os Parisienses. O clube Paulistano já não era mais só dos Prados e ensaiava sua conversão ao cosmopolitismo conservador atual.

A loja de departamento Sandis na também Rua Augusta a livraria Argumento e a ótica Elegante, vizinhas na Oscar Freire e eu moleque trocava dizendo: Ótica Argumento e livraria Elegante.

Mais tarde quando cresci fui descobrindo alem dos “jardins” os bairros da Liberdade, Itaim, Morumbi, Vila Madalena, Bixiga, Mooca, Perdizes o lindo bairro de Higienópolis e o inquietante centro.

Mas vendo a Veja nada me emociona. Antigos industriais Italianos existem na Itália na Argentina e nos EUA. Comerciantes árabes aos milhões no oriente médio e pelo mundo. Sushis, pizzas idem. Intelectuais como os Andrades pelo Brasil todo. Futebol então...

Eis que vejo um dos vinte e cinco marcos da reportagem e começo a chorar descabidamente. Chorar mesmo. Ali está o homem que falava a língua que eu falo uma espécie de português. O único ser humano que já me fez ter vontade de cantar. O único marco que é genuinamente paulistano.

O encontro da África com a Itália, com o caipira, com o circo.

Ali está Adoniran Barbosa.

Nunca entendi porque existem tão poucos bares de Samba em São Paulo. Por que não existem casas de Samba no meu bairro? Nenhuma.

Não sei por que ele me toca tanto. Do café viemos e ao café voltaremos.

“Um café lati ou latte si vu ple”. É o que eu digo ao garçom do Santo Grão.

Enquanto meus amigos vão conversando sobre Sampa. Palavra que eu nunca entendi. Porque a minha vila se chama São Paulo. E eu sou paulista da capital. Das Alamedas: Lorena, Tiete, Casa Branca, Pamplona, Itu, Jaú, Santos, Franca, Batataes, Caconde, Tatuí, Riberão Preto, Campinas, da Rua Augusta e claro da Avenida 9 de Julho.

Não dei nenhuma googada, mas acredito que não exista rua ou praça com o nome de Adoniran Barbosa.

Fica aqui a minha homenagem. Ele não ergueu prédios, não fez fortuna, não teve jornais, nem nada.

 O que ele fez então?

 Ele? Nos inventou.