terça-feira, 14 de dezembro de 2010

A menina da classe de matemática

Eu tinha 17 anos e olhava pelas enormes janelas o frio do Colorado lá fora. Em quase um ano de intercambio eu tive uma vez só vontade de fugir para a Califórnia. Ser ator em Hollywood.


Acho que o que me impediu foi à menina da classe de matemática. Ela se sentava na minha frente. Atrás de mim e dos lados só mexicanos legítimos. Um deles Jesus (se pronuncia Resus) era um excelente aluno. Quase tão rápido nas operações matemáticas quanto o senhor Fischer. Um professor quieto e calmo. O qual era chamado carinhosamente de senhor Pescador pelos meus colegas.

Era a classe mais fraca de matemática, mesmo assim eu tinha dificuldades em acompanhar aquele “Incrível exército de Brancaleone”. Sempre odiei duas coisas na infância e adolescência: Matemática e futebol. Mas lá estava ela, tentarei descrevê-la.

Era linda. Completamente americana, dessas que saltam dos filmes de Tarantino. Era branca tendendo para o ruivo, mas sem sardas. Uma das pessoas mais simpáticas que já vi. Sorria feliz obsessivamente. E devia ser muito feliz.

Eu a achava a menina mais linda do High School. E era com certeza. Mas nunca a vi fora da classe de matemática. Nem no refeitório, nem nos corredores, nos jardins... Só uma vez a vi caminhando pela rua arborizada indo embora depois da aula. Não sei para onde.

Nunca soube o seu nome. Nunca puxei conversa. Sentia-me bem em apenas vela.

Ela emanava uma energia muito especial. Uma luz. Hoje penso que talvez tenha sido uma ilusão, uma fantasia, um delírio. Talvez ela nunca nem tenha existido.

Acabei mudando de família americana. E para a minha infelicidade voltei a freqüentar não mais a igreja protestante aos domingos e sim a católica.

Ela estava lá na classe, sorrindo para mim. Uns olhos e um jeito de fada, de santa, de melhor amiga, de espelho, de louca, de irmã, de prima, de mãe. Então num suspiro disse:

“Lio você é da minha religião”. Disse isso em inglês. “Eu te vi domingo na igreja”.

Um medo e espanto subiram meu corpo. Eu não a tinha visto na igreja. Seria ela realmente um anjo?

Eu quis dizer a ela que sempre fui católico, que no Brasil alias somos todos católicos. No fundo eu sou metade cristão ortodoxo, mas e daí? Sou batizado na católica apostólica romana.

Nesse dia me senti tão orgulhoso de ser católico. Tão feliz por deixar ela tão feliz. Os americanos são para mim uns paradoxos. Eles sabem como ninguém que dois e dois são quatro. São selvagens ao mesmo tempo em que são fanáticos, conseguem ainda ser lógicos.

Aquela menina com certeza era a América. Seus defeitos eram todos lindos. Suas qualidades inalcançáveis. Mesmo Hollywood não conseguiria mostrar aquele estado bruto de americanidade. E ela era católica. Ou ainda um delírio católico.

Por que, quem iria reunir um Pescador, um J( r )esus, um Leonardo e uma santa americana, numa aula de matemática?

Menina da classe de matemática se você foi um delírio, uma fantasia, por favor, reapareça. Não para me namorar, mas para eu ter fé.

Não fé na igreja, mas essa fé que vocês americanos tem nos sonhos. Que vocês tem na criatividade fanática, selvagem e lógica.