sábado, 19 de novembro de 2011

Somos o futuro da nação.


 Estava no teatro. Eu e meu amigo tínhamos pegado lugares separados. Era uma peça concorrida. A enorme platéia estava lotada. Eu fiquei lá no fundo. Ao meu lado um casal de jovens.
 É muito raro ver jovens no teatro. Ainda mais numa peça de uma companhia francesa.
 Eram os dois algo meio underground. O rapaz tinha um brinco bem interessante. Uma argola de um material que nunca tinha visto. Um tênis bem suave e camisa xadrez. Parecia mais pé no chão que a menina. Um futuro publicitário talvez. Havia nele algo de maduro. Alguém que curte estar entre os contestadores, mas que é absolutamente a favor do establishment. Ele poderia ser latino, mas tinha também algo nórdico na aparência. Poderia ser desde um anglo-saxão até um espanhol.
 Já ela era mestiça. Japonesa talvez. Ela era um tipo mais sensível. Cabelos coloridos, um ar de loucura. De alguém que mexe com criatividade e poesia. Parecia uma artista plástica. Alguém mais franciscana. Tinha um piercing no nariz.
 Quatro horas de peça, não me contive e puxei conversa durante o intervalo.
 “Vocês fazem teatro?”
 Eles riram e me disseram que não. Então perguntei se eram artistas. Se eles estudavam teatro. Outra vez uma negativa. E então a menina perguntou:
 “Pareço uma artista?”
 “Muito” Eu disse. “Vocês estudam o que?”
 Foi então que me disseram que eles estavam no colegial. Eram namorados. Estudavam na mesma escola.
 E depois da minha surpresa, não lembro qual dos dois disse a frase. Acho que falaram juntos:
 “Somos o futuro da nação.”
 Já faz mais de um mês eu acho. E desde então eu quero escrever algo sobre isso. Mas não sei o que afinal  mexeu comigo ao ouvir isto deles. A frase. Eles terem dito aquilo me deixou confuso, nervoso. O Renato Russo fez esta letra, “Geração coca cola” antes deles nascerem.
 Uma letra que eu acho tão boba hoje. Tão sem sentido. Um casal tão rico, moderno, fortes, altos. Tão americanos. Cultos, bonitos, internacionais. Ele nórdico e ela japonesa mestiça de cabelos pintados.
 Eles não tinham nada de Giberto Freire. Nada de Caio Prado Junior. Nada de Sérgio Buarque de Holanda. Nada de Leo Chacra e muito de Steve Jobs.
 Aqueles meninos estavam no SESC. Nenhum norueguês da idade deles tem acesso a coisas que eles não têm. Aquele casal não eram seres colonizados. São cidadãos inclusos.
 Eu não sei de que planeta eles vieram. E de que futuro e de que nação eles estavam falando. Mas eles, o casal de jovens é o que a humanidade tem de melhor. Eles são o esforço de milênios de cientistas, artistas, filósofos, políticos.
 Eles são o esforço de séculos de brasileiros que lutaram e morreram para termos gente como eles. E não eram a tal zelite não. Eles eram classe média, estavam lá de metro. Estavam lá porque queriam ver teatro.
Talvez eles ainda sejam exceção. Talvez sejam muito poucos. Mas nós vivemos os anos de ouro. Vivemos sim. Eles já transcenderam a própria idéia de “geração”, palavra, aliás, inventada pela geração baby boom.    
 “Que País é esse?” Eu não reconheço mais o Brasil. Aqueles meninos falam a mesma língua que eu. E só.
 Eu me emocionei ao ver a bandeira do Brasil ser hasteada na favela da Rocinha no Rio.
 Aquele casal, no fundo, no fundo mesmo, eles disseram aquela frase pra agradar. Eles eram cultos e espertos. Sabiam que eu conhecia muito bem a frase. Foi para me agradar. “Uma frase do seu tempo tiozão.”
 Até então nos meus 37 anos de vida eu nunca vira algo assim. Brasileiros sem a menor vergonha de ser brasileiro. Com uma segurança na voz e no olhar: “O mundo é nosso”.
 The world to be Brasil.