sábado, 24 de maio de 2014

Rápida autobiografia de um quarentão, Leo Chacra.

Leo Chacra:

Aos 10 anos:
Eu queria ser um Jedi. Morar em outra galáxia. Meu carro preferido era uma nave espacial. O país mais maravilhoso do mundo era os EUA, mas eu tinha uma curiosidade pela União Soviética. A mulher mais linda eram as mais velhas, as de onze anos. Fazia ginástica olímpica.


Aos 15 anos:
 Eu queria ser diretor de cinema. Outra opção era ser o 007. Morar em Mônaco, desde que Mônaco ficasse na Califórnia. Meu carro preferido era um Passat ou qualquer carro que eu pudesse dirigir. Meu país preferido era o mar, um navio pirata. A mulher mais linda eram todas as mulheres. Eu gostava de Rock and Roll. Fazia Polo Aquático.


Aos 20 anos:
 Eu queria muito, muito, muito mesmo ser arquiteto. Não sabia desenhar, ainda não sei. Morar na Europa. Meu carro preferido era um carro pequeno, ainda é. Meu país preferido era o Brasil. Ouvia música clássica. Lia literatura clássica, via filmes clássicos. E era completamente apaixonado por uma menina drogadinha de 14 anos. Era ateu. E também era budista, além de marxista. Fazia circo.


Aos 25 anos:
  Eu queria ser o Moliere. Era contra televisão, carro e publicidade. Minha religião era o teatro. Lia literatura policial e muitos livros de teatro. Amava minha namorada. Queria morar onde tivesse teatro. De preferência dentro do teatro. Era um fanático. Não fazia esporte nenhum. Mesmo assim até que era bem em forma.


Aos 30 anos:
 Queria ter a minha própria casa e tinha. Queria ser escritor. Mas escrever o que? Morar numa cidadezinha bem pequena, de mil habitantes, com a natureza. Agora era marxista só uns 3 dias por semana. O resto era conservador. Bebia. Acho que era um pré-alcoólatra. Pela primeira vez fui um pouco playboy. Andava metade do tempo com playboys e a outra metade com artistas. Nunca misturados, que não dava certo. Parei com babaquice de país preferido. Carro? Sei lá, taxi, qualquer carro, desde que não fosse assaltado. Amava a ex-namorada. Tinha muita facilidade para pegar mulher. Ouvia o que estava tocando. A noite ia beber na Vila Madalena. Fim de semanas na praia. Meus amigos iam se casando.


Aos 35 anos:
 Eu era dono de restaurante e diretor de teatro. Queria ser ator. Fazia muito esporte, regime, engordava e emagrecia. Era completamente apaixonado por outra ex-namorada. Aproximei-me do cristianismo. Me interessei por história, ao mesmo tempo que nunca mais me interessei por clássicos. Comecei a me preocupar com o futuro. A me preocupar com meus pais. Na mesma intensidade que os meus pais começaram a se preocupar muito comigo. Muito. Meus amigos já eram quase todos eles, pais. Tive uma fase samba. Cogitei viver no Rio. E me achava decadente.


Aos 40 anos:

 Eu amava minha mulher. Ou melhor, amo. Quero ter uma CIA de teatro. Estou fazendo um filme. Faço esporte todo dia. Muita natação. Escuto o que a minha mulher coloca pra ouvir, e o rádio do carro também. País preferido é o país que eu ainda não conheço. Dei pra gostar de cerveja. Não só dos destilados, que, aliás, nem ando indo muito em bares. É raro. Não me arrependo dos caminhos que segui. Acho que podia ter sido mais ousado. Mas será que não fui? Me dei conta de que eu não sou alto como eu imagino que sou. Carro? Odeio todos. Com a política sou desiludido. Mas me provoca, pra ver. Me preocupo muito com o presente. E acho que sou bem feliz. Pra ser sincero eu não sabia antigamente se chegaria tão longe. Quarenta. A melhor idade. Será que me convenci?