domingo, 26 de dezembro de 2010

Você não queria se esconder... Capítulo 4 e final.

 ATO 2


PRIMEIRO QUADRO: (Paris, apartamento de Fred, um militante político. Campainha toca).

FRED- (Entrando em cena vai abrir a porta). Quem é que está aí?

ALE- É a Gestapo! Abra logo! (Fred sorri e vai abrir a porta, entra Juliana, agora Alexandra). Fred!

FRED- Você? Ale? (Os dois ficam se olhando).

ALE- Eu mesma, Alexandra. (Juliana está mudada, ficou madura e muito mais segura). Quanto tempo amigo.

FRED- Quando foi que você chegou em Paris?

ALE- Agora à noite, acabei de chegar.

FRED- Então é verdade! Ale... (Ele a abraça, depois de um tempo ela também o abraça, ele pega a mala dela e coloca para dentro). Você veio direto para cá?

ALE- O trem veio de Praga, foi uma burocracia para sair de lá. Daquele país.

FRED- Me disseram que você estava no México.

ALE- (Que se senta). México depois Havana, depois Praga e agora, Paris! (Suspira).

FRED- (Também se senta). Eu soube do que aconteceu. Amiga, eu fiquei...

ALE- Soube?

FRED- (Escolhendo as palavras). Ale que bom que você escapou.

ALE- (Mudando de assunto). E você Fred, escrevendo? Têm notícias do Brasil?

FRED- Arrumei um emprego num jornal Francês . Ale estou escrevendo em Francês , você acredita?

ALE- Um jornal de esquerda?

FRED- Não. Quer dizer... Um jornal ético. Se é esta a palavra. Mas me dão total liberdade. Ale, por que você não me escreveu dizendo que vinha? Eu teria arrumado as coisas. Você está com fome? Quero saber de tudo, por favor, me conte. Oh Ale! Nem acredito Alexandra a guerrilheira mais linda que existe, bem aqui no meu apartamento. (Olha para cima, e fala para o céu). E eu heim, que não acredito em você? Que loteria, ah, que dia feliz!

ALE- Não se preocupe, eu vim dar um alo. Vou arrumar um lugar para ficar. Um hotel, república sei lá.

FRED- De jeito nenhum. (Que faz uma cara de apaixonado). Você vai ficar aqui comigo, o apartamento é suficiente para os dois. (Olhando Ale e mudando de assunto). Como você está mudada.

ALE- Mas você está sozinho, digo... Você entendeu né Fred?

FRED- (Ainda abobado). Ale como você está realmente diferente.

ALE- É Fred o tempo passa, to meio sofrida. Você sabe. (Ela abaixa os olhos).

FRED- Não é isso, nunca te vi tão linda. (Ale ri). Quanto tempo você pretende ficar em Paris?

ALE- (Séria) O suficiente para resolver uma questão.

FRED- Questão?

ALE- (Sorri) Já está me mandando embora?

FRED- (Ainda feliz). Por mim, você pode ficar aqui até o dia em que voltarmos para o Brasil.

ALE- E quando será este dia? Paris é tão linda.

FRED- Pena que é tão tarde, mas se você não estiver cansada podemos sair, agora mesmo. Você viu o Sena? Ale...

ALE- Amanhã Fred. Amanhã. Agora o que eu preciso é dormir. Estou quebrada.

FRED- Aceita um conhaque?

ALE- Nossa! Finalmente, pensei que você não iria me oferecer nada. (Fred pega a garrafa e serve duas doses, os dois bebem). Fred, Fred, Fred. Você não sabe o que passei desde de a última vez que nos vimos. (Bebe).

FRED- Foi tudo tão rápido, Ale. Faz quase um ano que eu estou tentando te contatar. Tudo ficou tão mal resolvido.

ALE- Eu não estava bem para falar com ninguém.

FRED- Eu entendo.

ALE- (Séria encarando Fred). Entende?

FRED- Hei calma sou eu, o Fred.

ALE- Desculpe. Fred eu senti muito a sua falta. (Levanta e abraça Fred). Mas você acabou não me respondendo, Fred. Você o rei do deboche, o jornalista mais perseguido da república das bananas, continua sozinho?

FRED- Eu estou importante assim? O jornalista mais perseguido da república das bananas. Alias quando é que você Ale, começou a ler meus artigos? Ou você só repete o que ouve?

ALE- Não seja bobo, sou uma fã. Mas não fuja. Ta sozinho?

FRED- É claro que eu estou sozinho. (Se levanta e coloca um disco na vitrola). Vem cá dançar.

ALE- Estou morta de cansaço, você não faz idéia, do que é a burocracia, de vir de trem de Praga. Não faz idéia. (Se espreguiça).

FRED- Ah, que é isso? Lembra como costumávamos dançar? Eu e você?

ALE- Nossa que coisa burguesa! (Os dois dançam alguma música ao mesmo tempo pop, ao mesmo tempo um clássico hoje em dia, ambos muito felizes).

FRED- Vou te levar ver os vitrais de Notre-Dame.

ALE- Ah! Paris,cidade luz. Fred me diz por que é que você veio para Paris? Por causa da nouvelle vague? (A música continua hora eles dação, hora eles param).

FRED- Vim por causa da comida, da cozinha francesa.

ALE- Logo se vê que você emagreceu. (Ale ri. Fred chega mais perto os dois se olham e se beijam).

FRED- Aquele dia, como eu sonhei com aquele dia. Você era tão menina, nunca achei que você iria me notar... (Ale beija Fred novamente). Mas foi só uma noite. Depois veio tudo aquilo, mas agora estamos aqui em Paris.

ALE- Talvez eu tenha ficado grávida naquele dia.

FRED- Grávida? Conte-me tudo Ale. Se você quiser estou todo a ouvidos. (Abaixa o som).

ALE- (Aumenta o som novamente, e dança). Amanhã, Fred. Hoje eu não quero falar de passado, só de presente, hoje é hoje. Amanhã falaremos de hoje e de ontem.  (A luz vai descendo devagar). 


SEGUNDO QUADRO : (Mesmo apartamento, manhã seguinte, Fred lê sentado, entra Alexandra).

FRED- (Ao ver Ale, para de ler). Oi! eu não quis te acordar. (Ale está com uma cara séria de melancolia, seus movimentos são blasé). E aí. Vamos dar uma volta? Louvre, Jardim de Luxemburgo? (Se levanta). Ah, eu fiz café para você. Comprei uns croissants. (Ale se senta). E então?

ALE- Fred senta aqui. (Fred se senta). Eu estou bem. Fred... Tem tantas coisas que eu queria saber, queria te perguntar.

FRED- Já entendi. (Alexandra faz uma cara de quem esta esperando uma estória) Vamos lá. Eu tava saindo do jornal, indo pra casa, já era noite. Talvez fosse encontrar uns amigos num bar eu nem lembro. Um carro parou. No começo... (ele para) No começo achei que era imaginação minha, mas não.  Eles me colocaram dentro e me levaram para interrogatório. Era um dia quente. Depois foi uma longa noite, eu não sabia se era noite ou dia era uma sala fechada, ficou frio, passou sei lá quanto tempo. É isso.  Libertaram-me, negociaram minha troca e aqui estou. (Ri). Terei de viver com isso para sempre. Mas aqui na França têm tantos como eu que apanharam na guerra. A diferença é que eles derrotaram o inimigo.

ALE- Eu estava grávida.

FRED- Eu não sabia.

ALE-Talvez você fosse o pai. Fred, eu sempre te achei um cara sensacional, mas eu amava o Pedro. Você me disse que ele estava reencontrando a Marina, por isso fiquei aquela noite com você, acho que era por vingança, eu sou muito vingativa, mas eu amava o Pedro.
-

FRED- Você acabou na casa da Marina. Que tal é ela?

ALE- O que ela fez por mim eu não teria feito por ela.

FRED- Nós estudamos juntos. Mas eu não a conheço bem. Você me disse naquela noite que iria numa missão secreta. No dia seguinte é que eu fui pego.

ALE- A missão foi adiada. Fred me diz foi você?

FRED- Ale, você não sabe o que é ser...

ALE- O que? Torturado. Talvez o Pedro saiba.

FRED- (Suspira). Não seja como eles, pare agora.

ALE- Eu estava lá. Naquela casa.

FRED- Eu não sabia, você disse que iria embora em uma missão.

ALE- Por isso você falou?

FRED- Eu não sei o que eu falei. A gente não sabe o que esta falando, não tem controle quando estamos lá, não estamos completamente acordados. Não quero lembrar, não foi culpa minha! Você nunca passou por isso , não sabe de nada!

ALE- Me disseram que você foi entregando o aparelho, nem resistiu o normal, o mínimo.

FRED- Quem te deu esta informação não falou a verdade, nem existe este mínimo. Somos seres humanos. Temos reações humanas e basta.

ALE- Não , não basta. Você achou que matando o Pedro, eu ficaria com você Fred?

FRED- O que... O que é que você está insinuando que eu sou um assassino? Pare Ale, você está distorcendo tudo, nós somos aliados, eu , você, o Pedro, todos , o movimento.

ALE- Como você pode Fred?

FRED- Eu sou jornalista! Ale, eu não sou guerrilheiro.

ALE- Cala a boca, não deixe eu te odiar.

FRED- O Pedro não teria feito diferente, ele não te amava. Ele teria me entregado também. Não existem heróis. Era ele ou eu. Se eu não dissesse onde era o aparelho, eles me matavam você sabe. Matavam-me.

ALE- Covarde!

FRED- Eu lamento. Minha arma é imprensa, eu não sei usar armas não sou um soldado. Mas de uma coisa eu tenho certeza se eu soubesse que você Ale, não tinha ido naquela missão, eu teria morrido, mas não entregaria o aparelho. Eu te amo desde a primeira vez que eu te vi você sabe disso. Qualquer outro homem na minha situação teria feito o mesmo. O mesmo. Olha vamos esquecer isto, pelo menos por enquanto, acho que já fomos muito longe por hoje. Que tal darmos uma volta? Eu prometo que depois retomamos a conversa.

ALE- Uma vez Fred, o Pedro disse que você escrevia bem pacas. Se dói viver com o que você fez saiba que ele te admirava e muito. Mas ele não tinha o intelecto da Marina , nem a tua ironia e argumentação, há mas ele sabia lutar, ele acreditava. Ele , sim morreu para me salvar. Eu não acredito em você. Mesmo que você soubesse que eu estava lá teria falado. Gente que nem você só pensa em si mesmo.

FRED- Eu só escolhi o lado, era eu ou ele. Eu teria sido covarde se tivesse escolhido ele. Eu achei sim que você estivesse apaixonada por mim, ele estava saindo com a Marina, ela não te disse?

ALE- Eu também escolhi um lado Fred. (Ale tira uma arma da roupa e aponta para Fred).

FRED- Ale! Nunca amei alguém como você. Se você não acredita... Olha vamos sair logo e dar uma volta, almoçar, ver o Louvre... (Ale atira em Fred. Ele morre. Ela então limpa a arma e põe na mão dele, pega a sua mala e vai embora).

                                                

                                                             PANO


sábado, 25 de dezembro de 2010

Você não queira se esconder... Capítulo 3


TERCEIRO QUADRO (Marina está sentada em uma poltrona, Juliana anda de um lado para o outro)

 JULIANA- Cara como é que você consegue ficar ai parada sentada, fica pensando em que?

MARINA- E você pensa em que quando fica ai andando de um lado para o outro?

JULIANA- Eu estou aqui na sua sala porque eu não posso sair. Primeiro porque eu corro o risco de ser presa e torturada, depois porque este telefone pode tocar a qualquer momento.  Que mais eles te disseram? Quando vão trocar os companheiros pelo idiota do gringo?

MARINA- O idiota a quem você se refere é o embaixador americano?

JULIANA- Ah não! Marina você vai começar de novo! Você pode não querer participar da luta armada, mas ser contra é ser a favor deles, dos repressores.

MARINA- (Levantando-se e indo na direção de Juliana). Diz-me garota, você gostou de assaltar os bancos. Que é que você sentia? Matou algum segurança?

JULIANA- “O que é um assalto a um banco, comparado a um banco.” Bertolt Brecht.

MARINA- Não seja idiota, Brecht nunca assaltou um banco.

JULIANA- Então está certo. Ficar aí parada é que vai ajudar a vencer a ditadura.

MARINA- Achei que você queria a revolução e não vencer a ditadura.

JULIANA- É a mesma coisa. Marina você não têm paixão por nada? O que é que te move, o pensamento pelo pensamento. Ler só por ler, acumular conhecimento e não realizar nada? Eu sou uma revolucionária sim senhor.

MARINA- Veja o que a revolução francesa fez: Um mar de sangue e depois : Monsieur Napoleão.

JULIANA- Se não houvesse tido a queda da Bastilha, ainda haveria um rei sol por lá.

MARINA- Na Inglaterra têm e eles vivem bem democraticamente com isso.

JULIANA- Têm o que?

MARINA- Um rei.

JULIANA- Rainha.

MARINA- Aí, ta bom rainha! Mas vivem em harmonia.

JULIANA- Ah, vivem. Tinham um terço do mundo, exploravam bilhões de seres humanos até pouco tempo atrás, mas não...  Eles são resolvidos. Marina quase todas as noites eu tenho um sonho. Eu estou andando numa floresta, numa trilha é de noite só ouço os meus passos, qualquer um pode me atacar mas eu não tenho medo, sabe por que? (Marina não responde). Porque eu tenho isto aqui. (Juliana mostra sua arma). Isto me trás a igualdade com os homens. Com ele nenhum gorila é mais forte do que eu. É isto que me trará o Pedro de volta.

MARINA- Você quer saber o que eu acho de verdade? Não quer? Eu sinceramente acredito que se meninas como você continuassem a brincar de bonecas ao invés de roubar bancos eles, os repressores , como você diz não teriam pré-texto para usar a força, a repressão. E digo mais. Eles só não acabam com vocês , porque eles precisam de palhaços como vocês para justificarem o regime de segurança. Quem você acha que a população dos EUA, estou falando de milhões de pessoas vão apoiar, depois do que vocês fizeram? Um grupo de fanáticos que seqüestram o embaixador deles, um país democrata ou nos gorilas que têm apoio popular.

JULIANA- Eles os EUA, pegaram em armas e ainda pegam. Ou você acredita que o rei da sua Grã-Bretanha, deu a liberdade para eles sem luta? (Pausa). E por isso que você perdeu o Pedro, Marina. Você nunca foi lutar por ele.

MARINA- Nem ele por mim. Ele preferiu tirar uma garotinha das bonecas e transforma-la em uma assassina, ou revolucionária como você diz. Olha desculpa Jú. Divergir não é brigar. Vocês vão se encontrar na França. Nem vão se lembrar de mim. (Toca o telefone, Marina atende). Alô! Pode falar. É a Marina. Só um segundo. (Para Juliana). É a revolução.

JULIANA- (Pegando o telefone). Alô! É a Juliana. Mário, que bom te ouvir. Estou bem. Hoje claro. (Ela fica um longo tempo ouvindo). Impossível. Tem certeza? Não. Por quê? Por quê? (Mas um tempo ouvindo). Entendi. (Juliana desliga. Ela está terrivelmente perturbada).

MARINA- O que houve?

JULIANA- Eles trocaram os companheiros e virão daqui a pouco me buscar.

MARINA- Mas então... O que é que deu errado?

JULIANA- Pedro.

MARINA- (Que percebe). O que houve?

JULIANA- Ele não conseguiu. Já estava morto à muito tempo. (Marina não sabe o que fazer, as duas se calam).

MARINA- O Pedro! Pedro. Não.

JULIANA- Eles estarão aqui em minutos Marina. É melhor nos despedimos. Caramba! Eu o amava Marina. Talvez eu nem queira está luta. Talvez fosse por ele. E agora? Canalhas, como alguém pode fazer isso com um cara que sempre só quis ajudar , só isso. Por que?

MARINA- Juliana, você vai para França. Vai ficar tudo bem.

JULIANA- Meu nome é Alexandra.

MARINA- Vai ficar tudo bem. Calma.

JULIANA- A gente ia pra França, ia viver junto em Paris, eu e o Pedro e agora. Perdi meu filho e ele.

MARINA- Você têm de ir pra Paris. Recife é que você não pode voltar.

JULIANA- Porto Alegre. Eu sou de Porto Alegre. Eu sou a Alexandra.

MARINA- Não. Você é a Juliana, você é de Recife. Você é a menina mais corajosa que eu já conheci. (Juliana sorri).

JULIANA- Não Marina , você é a pessoa mais corajosa que eu já conheci. (Campainha, Marina olha pela janela).

MARINA- São eles. A gente se vê, no futuro garota. (Se abraçam).

JULIANA- Ele te amou muito. Adeus. Vive la france!

MARINA- Vive la france. Vive la revolucion!

JULIANA- Vive.

MARINA- Adeus. (Juliana sai. Marina fica só em cena, ela vê que Juliana esqueceu a arma. Ela apanha a arma, Marina só, olhando a arma): Até quando? Até quando você vai perseguir os nossos caminhos. Por que é que você está sempre aí prometendo esperanças e trazendo tragédias? Nunca existirá uma história feliz, se você fizer parte dela. Nunca. Quem chega ao poder te usando, só tem uma maneira de preservá-lo é continuar te usando. Tenho nojo da ditadura. (coloca a arma no chão). Pedro, você me disse certa vez que não era escravo e que ninguém lhe convenceria do contrário. Você morreu acreditando nisso. Você morreu livre. Sua morte não foi em vão. Minha vida também não será. 
 
(Black-out). 

sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

Você não queria se esconder... Capítulo 2

SEGUNDO QUADRO: (Mesma sala da casa de Marina. Algumas semanas depois. Juliana entra cantando, Marina está em cena sentada em uma poltrona).




MARINA- Nossa que alegria. Deve ser bom ficar o dia todo em casa sem por o pé na rua!



JULIANA- (para de cantar , mas não se deixa abalar pelas provocações de Marina). Se ao menos você tivesse uma t.v. Como alguém pode viver sem uma tv?



MARINA- É o caso de se acostumar. Quando você pegar o hábito de não ter, não conseguirá mais assistir.



JULIANA- Será? (Pausa). Marina quando é que você vai fazer outro bolo de cenoura com chocolate?



MARINA- Assim você irá engordar. O médico...



JULIANA- Fábio, ele se chama Fábio.



MARINA- Eu sei. Fábio.



JULIANO- Ele é bem interessante.



MARINA- Então o médico, dr. Fábio disse que você já esta recuperada, mas também quantos dias você já está aqui? Quer dizer a quantas semanas?



JULIANA- Quase um mês, pra sua sorte. Alguém pra te fazer companhia. Marina? (silêncio). Eu acho que o dr. Fábio te paquera. (Marina fecha a cara, Juliana ri). Já rolou alguma coisa?



MARINA- Não é da sua conta.



JULIANA- Nossa que amargura!



MARINA- Juliana. Eu tenho que te dizer uma coisa.



JULIANA- Pode falar. Eu sou muito bagunceira?



MARINA- Na verdade eu também sou. Não é isso. Daqui a pouco vai chegar um aluno é bom você estar quieta lá dentro. Com essa cantoria, logo, logo alguém desconfia. Se ainda cantasse bem.



JULIANA- Eu queria poder sair, para ver gente. Nem o seu aluno eu posso ver. Que droga o único cara que veio aqui foi o médico mas este é paquera sua. Queria poder ir comprar umas roupas pra você marina. Quem é que compra as suas roupas? (Juliana ri).



MARINA- Para uma marxista você é bem materialista heim, Juliana?



JULIANA-(Fingindo achar graça). Há! Há! Há! Só estou querendo... (Silêncio). Me fala de novo do Sartre.



MARINA- (Se animando um pouco). Que é que você quer saber?



JULIANA- Sobre aquilo... Dele só ter se preocupado com política aos 30 anos.



MARINA- Não é que ele fosse um alienado. Ele era professor de filosofia na província e queria ser ficcionista. Romancista e dramaturgo. Mas um fato fez com que ele tomasse uma posição, como você mesma diz.



JULIANA- Um fato? Uma posição.



MARINA- Sim. A França fora invadida pelos alemães. Ou você era a favor dos invasores ou contra. Um colaboracionista ou um resistente.



JULIANA- Marina você se arrepende de ter tomado a decisão de me proteger?



MARINA- (Mudando de assunto). Como é que você conheceu ele?



JULIANA- Têm certeza de que quer falar disto?



MARINA- Juliana, você já está na minha responsabilidade a mais de três semanas. Infelizmente, você está a par por conta disso de todas as minhas intimidades... Não que o Pedro não tenha querido falar de você ou sobre você. Mas ambos estão na luta armada, então... E depois no dia ao contrário de hoje eu não quis saber.



JULIANA- Foi por causa de você, Marina.



MARINA- O que?



JULIANA- Vamos lá. Eu havia acabado de entrar na faculdade. Conheci uma menina super engajada, ela e outras são suas fãs. Viviam te citando. Um dia me chamaram, disseram que haveria uma palestra sua seguida de um debate, lá na PUC. Você ia debater com um filosofo francês convidado. Jenileupen, se não me engano.



MARINA- Eu lembro deste dia.



JULIANA- Foi lá que eu o vi. Eu e minhas amigas parecíamos tontas, ficávamos rindo, todas nós impressionadas com o Pedro. No começo ele não percebia. No intervalo fomos tomar um café, um amigo da minha amiga estava falando com o Pedro, então abordamos os dois. Quando dei por mim já estávamos nos beijando.



MARINA- Então aquele beijo, foi o primeiro? Que tola que eu fui. Eu vi vocês se beijando. Já esperava por aquilo, quer dizer que um dia iria acontecer. O Pedro é lindo, sedutor, razoavelmente inteligente...



JULIANA- Razoavelmente?



MARINA- (seca). Razoavelmente sim. Sempre achei que teria uma relação aberta. Mas a verdade é que não consegui, fiquei perdida e decidi, não velo mais, com certeza foi quando vocês começaram a sair. Agora tudo fica claro.



JULIANA- E quando foi que vocês se reencontraram? Quero dizer...



MARINA- Não importa! (Pausa). E a palestra você gostou? O que você achou?



JULIANA- (Sem graça). Só lembro de te achar muito jovem. A mulher mais inteligente que já ouvi falar. A sala toda em silêncio ouvindo. Eu não sabia que o Pedro era o seu namorado.



MARINA- E mudaria alguma coisa?



JULIANA- Mudaria. (Marina faz uma pausa. Muda o olhar e diz num tom sério).



MARINA- Eles entraram em contato comigo.



JULIANA- Mas por que você não me disse? Quando?



MARINA- Foi hoje, é o que eu estou tentando te dizer.



JULIANA- Então eles sabem onde estou?



MARINA- Sabem.



JULIANA- Eles vem me buscar?



MARINA- Em breve. Disseram que o Pedro está na lista dos presos que vão ser trocados pelo embaixador americano.



JULIANA- Como é que é? (Juliana fica extremamente feliz). Eu vou ver o Pedro?



MARINA- Vão te enviar pra França. Ele segue para o México e depois te encontrara lá, em Paris. (Campainha). É meu aluno, depois conversamos. (Marina vai sair).



JULIANA- (Feliz). Precisamos fazer um bolo de cenoura com chocolate pra comemorar. (Juliana percebe que falou bobagem) Marina , eu sinto muito.

(Saem as duas).

Você não queria se esconder, queria me achar

Este texto nasceu de uma encomenda. Um produtor de teatro me pediu um texto com uma hora de duração e com no máximo 4 atores. Um texto ainda que falasse de política para os jovens. Já que seria apresentado em colégios e faculdades. Pensei então numa trama policial em que o didatismo surgisse sem que a platéia percebesse.



Quando ele leu o texto pronto, disse-me que as meninas iriam adorar, mas que lamentavelmente ele me chamara na expectativa de uma comédia. Acho que não é o caso. Aqui eu fujo do meu estilo. Enfim eu amo essas duas meninas (personagens), espero que o leitor também. A verdade é que elas são os meus dois lados: O racional intelectual, Marina. E o visceral agressivo, Juliana. Com vocês em algum lugar do século vinte: Abrem-se as cortinas.

 A é, quase esqueci, serão 5 capítulos. Feliz Natal e boa leitura.


PERSONAGENS


JULIANA                 MENINA  REVOLUCIONÁRIA.

MARINA                  FILÓSOFA  PASCIFISTA.

FRED                     JORNALISTA  EXILADO.

ATO 1.



PRIMEIRO QUADRO: (sala da casa de Marina. Entram Marina e Juliana).



MARINA- Entra. Pode sentar onde quiser. Juliana, né?



JULIANA- Isso. (senta-se em uma poltrona).



MARINA- Quem mesmo que você disse que me indicou?



JULIANA- É... A prima de uma amiga: Joana. Agora não me lembro bem o sobrenome , ela é uma loirinha de olho verde.



MARINA- (Que também se senta). Joana? (Pausa). Você disse pelo telefone ,que está ansiosa para aprender francês.



JULIANA- Eu leio muito. Tenho autores franceses que eu quero ler no original.



MARINA- Joana! Claro lembrei.



JULIANA- Marina, eu te chamo de professora ou pelo nome mesmo?



MARINA- Juliana, pode me chamar de Marina ou Má se preferir. Posso saber o que você estuda? Trabalha?



JULIANA- Arquitetura.



MARINA- Você não é de São Paulo?



JULIANA- Não de Recife. Sou de Recife. (Juliana começa a ficar , um tanto impaciente, não encara Marina, seus olhos buscam conhecer toda a sala).



MARINA- Quer um copo de água? Alguma coisa?



JULIANA- (Que percebe sua auto euforia se controla e sorri). Não obrigado, Má.



MARINA- Que autores?



JULIANA- (Ainda sorrindo). Os que eu gosto?



MARINA- É.



JULIANA- Balzac. Sou apaixonada por Balzac. Mas também por Sartre. Sartre.



MARINA- Com quem você mora aqui em São Paulo, Juliana?



JULIANA- Numa república.



MARINA- Aqui perto?



JULIANA- Mais ou menos. Eu estudo na Fau. Mas moro por aqui em Higienópolis.



MARINA- Mas sua família está toda no Recife?



JULIANA- Sim. E a sua?



MARINA- São daqui mesmo de São Paulo eu nasci aqui. Não quer mesmo um copo de água?



JULIANA- Por que é que você fica me olhando com tanta desconfiança? E perguntando tanto da minha vida?



MARINA- (Que se assusta). Desculpe , mas é que...



JULIANA- Eu sei. Me desculpe eu. Você mora sozinha. Uma louca liga e diz que quer urgentemente aprender francês. Desculpe é natural que a gente se conheça, se apresente. Má, acho que vou aceitar sim, o copo de água.



MARINA- Você está bem? Quero dizer, está tudo bem?



JULIANA- (Sorri). Foi um dia ruim, muito ruim. Mas vai acabar bem. Agora que eu te conheci.



MARINA- Claro. (Se levanta). Vou buscar a água. (Marina sai. Juliana, para de sorrir, põe as mãos no rosto. Depois quando têm certeza de não estar sendo observada, abre a casaco e passa um pano dentro da blusa, tira o pano ele está todo ensangüentado, Marina volta trazendo uma água que dá para Juliana que segura o copo mas não bebe). Eu te disse que morava sozinha?



JULIANA- Você não mora?



MARINA- (Pensando antes de responder). Mais ou menos.



JULIANA- Como assim , mais ou menos?



MARINA- Você não vai beber a água? (Pausa, as duas se encaram, Juliana Sorri, mas não toma, põe a água em cima da mesa).



JULIANA- Vamos começar.



MARINA- Sim.



JULIANA- Onde você aprendeu Francês?



MARINA- Morei em Paris.



JULIANA- Que romântico. (Irônica). Conheceu alguém por lá?



MARINA- (Desconfiada). Por que está pergunta?



JULIANA- Má, você é sempre assim reservada?



MARINA- Desculpe. (Olha para Juliana e sorri). Você é mais bonita do que eu imaginava.



JULIANA- Como assim? Obrigado, pelo bonita, mas que papo é esse bicho?



MARINA- Desculpe.



JULIANA- Você falou como se nós já nos conhecêssemos, quero dizer...



MARINA- Me enganei? Juliana há cinco anos dou aula de francês. Eu arrisco dizer que você não quer aprender francês.



JULIANA- Como?



MARINA- O que te trouxe aqui? (Pausa).



JULIANA- Você é bem esperta, ou sou eu é que sou tonta?



MARINA- Ainda não sei, mas podem ser as duas coisas. O que te trouxe aqui?



JULIANA- Não sei ainda. (Olha para o chão, pausa, Marina vai falar algo, mas Juliana atropela).



MARINA- Pode...



JULIANA- É isso a gente se conhece , mas não se conhecia. Nem uma das duas tem certeza de nada ou têm?



MARINA- (Bem nervosa se levanta). Vai embora da minha casa!



JULIANA- Eu não tenho para onde ir! Eles estão atrás de mim. Pra matar.



MARINA- Eles quem? A polícia?



JULIANA- Eles está corja de canalhas covardes, traidores!



MARINA- Mas eu não posso te esconder aqui, lamento. Mas afinal quem é você? Porque eu deveria ajudar alguém que eu nem sei quem é?



JULIANA- Você sabe muito bem quem eu sou. Você mesmo disse a pouco que não imaginava que eu era bonita. Pois temos isto em comum: eu também não imaginava que você fosse tão linda.



MARINA- O que houve, cadê ele?



JULIANA- Eu só vi eles o levando. Eu não pude fazer nada. Eu estava chegando no aparelho, quando a polícia o estava levando.



MARINA- Quando foi isso?



JULIANA- Horas atrás. Fiquei desesperada. Então te liguei e marquei esta aula, foi um disfarce.



MARINA- Mas por que eu?



JULIANA- Eu não tenho ninguém em São Paulo. Ele sempre me disse, que se algo acontecesse para eu te ligar, que você me esconderia.



MARINA- Menina, por que cargas da água eu ajudaria meu pior pesadelo?



JULIANA- Porque ele disse que você é a pessoa mais boa que ele já conheceu.



MARINA- Que mais ele falou?



JULIANA- Que você tinha fraquejado, mas que um dia você voltaria para a luta, ainda mais forte do que no início.



MARINA- Então você sabe toda a minha história. Mas como você é ingênua, nunca imaginou que eu também tenho um lado, uma versão. E esta é a minha versão: Eu amei um homem, como talvez nem um outro foi amado por uma mulher e este homem era tudo na minha vida. Eu queria me casar e ter filhos com ele e se isto tivesse acontecido eu hoje seria a mulher mais feliz do mundo. Mas não uma menina apareceu. Uma alienada, burra desgraçada, que agora vem que nem um papagaio falar em Sartre. E esta cretina, que arruinou a minha vida, agora quer ajuda.



JULIANA- Eu não vou implorar nem me humilhar. Não sou covarde e nem tenho medo que me torturem. Se eu estou sofrendo é por ele. Só temo por ele. É pelo que vão fazer com ele. Ao contrário de você que nem se preocupa, nem com ele nem com ninguém. Gente que nem você termina só mesmo. (Marina chora, mais calma). Me desculpe. Me desculpe, hoje é o pior dia da minha vida. Marina me perdoe.



MARINA- Agora sai da minha casa!



JULIANA- Não sem antes esclarecer umas coisas. Posso não ser brilhante como você, mal entendo filosofia, mas sei o mínimo. Não entrei nesta luta ao contrário do que você imagina, por causa do Pedro. Foi algo que eu refleti muito. Me apaixonei por ele porque temos coisas em comum.



MARINA- Quer parar com esta baboseira vazia. Que se apaixonou o que garota. Pra você tudo isso é uma aventura, depois cresce se arrepende e volta pra Recife , pro colo da mãe. Este é teu pior dia? O meu foi quando eu vi o Pedro te beijando. Eu não acreditei, me senti traída, parecia que tinham tirado o chão dos meus pés.



JULIANA- E agora quer me matar?



MARINA- Eu não quero matar ninguém só quero que você vá embora!



JULIANA- E não é a mesma coisa? Me expulsar daqui é o mesmo que me matar!



MARINA- Você devia pensar nisso antes de entrar pra luta armada.



JULIANA- Eu não escolhi entrar pra luta armada. Eu não tive outra opção.



MARINA- (Irônica). Não teve?



JULIANA- Você mais do que ninguém sabe que se manter neutro é o mesmo que colaborar com os militares, com a repressão. Não existe posição neutra. Não tomar posição é o mesmo que tomar, me por pra fora é o mesmo que me matar. Se fosse o contrário eu te salvaria.



MARINA- Me diga menininha, qual é o problema em querer ser mãe. Ter filhos uma família. Eu não tenho o resto da vida pra ser mãe!



JULIANA- Então é este o seu sonho? Ser mãe? (Marina não responde). Como o Pedro te mistificou. Só ele não, já vi tantos companheiros dizerem o quanto você é brilhante. Que desperdício : brilhante porém covarde. Ser mãe.



MARINA- Me diz uma coisa oh, Juliana ou seja lá qual for o seu nome. Se todas mulheres pensassem como você, o que aconteceria com a população do mundo?



JULIANA- Como você pode pensar em botar alguém num mundo deste.



MARINA- E até hoje estava ruim o seu mundo? Vivendo com um homem que você diz que ama? Se não o tivessem levado...



JULIANA- Mas o levaram. Aí. (Cai no chão).



MARINA- (Que se comove). O que houve, você está bem? (Vê o sangue em Juliana).



JULIANA- Acho que...



MARINA- Oh! Eles atiraram em você.



JULIANA- É eu estava lá. Ele me salvou. Ele ficou enfrentando os Gorilas pra que eu fugisse. (Marina chora). O que, o Iceberg está se derretendo! É isso mesmo demoiselle filósofa. O Pedro enfrentou os gorilas, pra nós fugirmos.



MARINA- Nós?



JULIANA- Eu estava grávida. Mas... (Sente dores). Aí. (suspira). Qual hospital eu poderia ir? (Marina vai ajudar Juliana). Para aí.



MARINA- Estou querendo ajudar.



JULIANA- Eu posso ir embora sozinha.



MARINA- Você não tomou a água, porque achou que estaria envenenada? Você acha que eu quero te matar?



JULIANA- Não é isso que você está fazendo, me mandando embora? Assinando minha sentença?



MARINA- Eu não sabia. Como eu podia saber?



JULIANA- Se comoveu por causa da criança? Como você pode saber que não é um truque? E mesmo se não for, você vai me dizer que nunca fez um aborto?



MARINA- Não fale assim. Eu já disse que não sabia.



JULIANA- E como você poderia saber? (Pausa). Quanto tempo você não vê o Pedro?



MARINA- Então me condena o sonho, mas estava vivendo ele. Que eu saiba a organização proíbe casamentos. (Juliana, ainda no chão piora, Marina a pega e a ajuda sentar na poltrona). Tome beba não seja paranóica. (Juliana toma a água). Mas você tem de ir embora. Se eles pegaram o Pedro devem estar atrás de você, vão vir aqui.



JULIANA- Este é o último lugar que eles viriam é o mais seguro. Se eles já pegaram o Pedro.



MARINA- Mas vão querer você. Vão sondar os amigos de vocês.



JULIANA- Você é uma amiga?(Campainha, as duas se olham, pausa, novamente a campainha).



MARINA- (Vai até a janela). São eles a polícia. (Juliana serra os olhos e os aperta e mal se ouve a sua voz).



JULIANA- Então termina assim. Se você não responder talvez pensem que não há ninguém.



MARINA- Eles já viram a luz acesa. Arrombariam a porta seria pior.



JULIANA- Por favor, me ajude.



MARINA- Pensei que você não iria implorar. (Campainha) É melhor eu ir até a porta.



JULIANA- Espere tem algo que eu quero te dizer. (Campainha).



MARINA- Não se mexa. Vou despista-los. (Marina sai de cena, Juliana fica, ouvem-se vozes em off).



POLICIAL- Boa noite, desculpe o transtorno.



MARINA- Boa noite.



POLICIAL- Mas estamos perseguindo subversivos. A senhora por um caso não notou nada de anormal hoje?



MARINA- Anormal, não.



POLICIAL- Nem viu nenhum estranho, suspeito.



MARINA- Não senhor. Não vi.



POLICIAL- Então tenha uma boa noite e desculpe. Tchau.



MARINA- (Voltando). Pronto foram embora.



JULIANA- Você me salvou!



MARINA- Mas isto não quer dize que você vai continuar aqui.



JULIANA- Mas porque você fez isto? Por que me salvou?



MARINA- Eu não sou uma assassina.



JULIANA- Não é?



MARINA- O que você queria me dizer?



JULIANA- Não tenho mais certeza. É melhor esquecer.



MARINA- Temos que arrumar um médico para você.



JULIANA- Pensei que você não quisesse se envolver.



MARINA- É mas já estou envolvida. Depois não sabia que você estava grávida. (Pega a agenda e folheia). Talvez eu tenha algum conhecido que não vai nos denunciar.



JULIANA- Como é que você está se sentindo? É bom não é? Voltar para a luta.



MARINA- Já disse menina que não sou uma assassina, mas daí a gostar de você são outros 500.



JULIANA- Você está dizendo que me ajudou, como quem ajuda uma cachorra ferida.



MARINA- Você é realmente certeira em metáforas. (Juliana tira um revolver do casaco).



JULIANA- Veja se isso parece uma metáfora!



MARINA- Não entendo?



JULIANA- Mas eu já entendi. Nosso aparelho era novo, ninguém caiu, ninguém foi preso, então me diga como é que a polícia chegou até nós?



MARINA- Como eu posso saber.



JULIANA- Fala mais alto. Não te ouvi.



MARINA- Juliana. Você está enxergando as coisas de uma maneira torta. Eu posso não gostar de você, mas isso não significa que mudei de lado.



JULIANA- Pensei que você tinha largado a revolução? (Continua apontando a arma na direção de Marina).



MARINA- Uma revolução não é feita só de armas.



JULIANA- Ah, é! E do que é feita a sua revolução companheira?



MARINA- De idéias. Juliana você está agindo que nem eles. Por que você acha que eu denunciei vocês?



JULIANA- Você estava se encontrando com ele? Com o Pedro?



MARINA- Mas já faz um mês que eu não o vejo. Eu confesso nos vimos algumas vezes este ano sem você saber. Ele queria me contar coisas, conselhos.



JULIANA- E porque eu iria acreditar em você?



MARINA- E por que você acha que estou mentindo?



JULIANA- Você disse que eu sou mais bonita do que você imaginava, mas depois disse que me viu beijando o Pedro.



MARINA- O que isso quer dizer?



JULIANA- Que você tentou fingir que não sabia que a polícia já tinha agido.



MARINA- Que absurdo!



JULIANA- Confesse.



MARINA- Talvez tenha sido sim um ato falho. Eu vi na época uma mulher beijando ele. Nem sabia quem era você. Não reparei mas você tem razão. Eu sabia que era você quando você entrou, logo reconheci que não era uma aluna. Mas eu não sabia que o Pedro tinha sido pego. Imaginei que você tivesse descoberto nossos encontros.



JULIANA- Eu suspeitei.



MARINA- Pois saiba que ele me viu algumas vezes. Foi péssimo, porque da minha parte eu já estava quase curada, mas daí tudo voltou. Não sei que dúvida ele teve, mas a última vez que nos vimos ele me disse que te amava. Mas quer saber se vai atirar atira logo.



JULIANA- Não acredito em você e você só faz isso para eu ter pena de você.



MARINA- Pena de mim. Garota , você tomou um tiro, o amor da sua vida, como você o diz foi pego. Você estava grávida e têm pena de mim? Você não veio aqui se esconder! Veio me achar ?



JULIANA- Vou te matar! (Marina realmente se apavora). Como que você ta gritando assim?



MARINA- Menina você precisa de um médico! Eu tenho um amigo médico na organização, vou ligar. Ele é de confiança. Vai ajudar. (Tenta ir à direção de Juliana).



JULIANA- Pra trás! O Pedro disse que você é mandona, está tentando me controlar e depois me entrega para polícia.



MARINA- Se eu quisesse já tinha te entregado.



JULIANA- Mas você quer que eu morra sem contar a ninguém meu segredo: Que foi você que entregou o aparelho, que por sua vaidade e egoísmo Pedro vai morrer. Sua malvada. Você diz que ele te largou mas na época ele disse que foi você que o abandonou antes. Com sua indiferença, com seu egoísmo, você só quer seus livros, só eles e que o resto do mundo se dane. Que pretensão achar que ficando em uma biblioteca, irá entender o mundo. Você Marina na verdade é uma pessimista, mesquinha. Você não se deixou ser amada. Eu amo o Pedro, eu amo a causa.



MARINA- Ama? Então porque deixou ele lá com os gorilas e fugiu? É fácil acusar apontando uma arma. Não Juliana, não sou covarde, nem pessimista. Sou realista as vezes eu penso que o motivo deles baterem na gente é porque têm gente que não larga as armas. Eu to aqui não vou fugir. Eu sou democrata se você quiser conversar? Divergir não é brigar. Me fale é preciso coragem pra segurar esta arma, Juliana?



JULIANA- Palavras, palavras, palavras, sem ação o mundo não vai a lugar nenhum. Se eu ficasse e morre-se com ele, de que ia adiantar. Ainda posso salva-lo.



MARINA- (rindo). Pode?



JULIANA- Cala a boca! (Juliana aponta a arma, vai atirar, mas cai, Marina corre para socorre-la). Ta doendo! Ai! Ah! Pedro cadê você? Pedro me tira daqui eu não quero morrer.



MARINA- Calma ta tudo bem , vou chamar um amigo médico. Calma. (Marina com a cabeça de Juliana no colo). Juliana não fui eu, não fui eu.



JULIANA- Meu filho! Pedro me tira daqui!

(black- out).

quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

Dois cegos e dois detetives

Uma praça de uma grande cidade.


Personagens:



Primeiro cego

Segundo cego

Turista

Chofer do primeiro cego

Apresentador Chicão

Detetive Sir Ernest

Detetive Ted





(Os dois cegos entram em cena, um de cada lado do palco. Ambos estão com óculos escuros e bengalas, vão caminhando para o centro do palco. Em alguns momentos triangulam com a platéia. Até que uma hora os dois cegos se chocam um com outro e caem no chão. As bengalas caem e é um tombo dolorido, na tentativa de se levantarem um xinga o outro.)



PRIMEIRO CEGO- Você não me viu seu cretino?



SEGUNDO CEGO- E você também não me viu, babaca?



PRIMEIRO- (Já de pé, mas falando para uma direção oposta de onde ficou o outro cego.) Isso não vai ficar assim. Minha honra foi ferida.



SEGUNDO- (Respondendo também numa direção oposta.) Hora! Não é para tanto. É só você se desculpar comigo e está tudo bem.



PRIMEIRO- Eu me desculpar?! Isto é a gota de água. Volto daqui a quinze minutos, para um duelo. Passar bem, até já. (Vai saindo.)



SEGUNDO- Eu lá vou duelar com você seu maluco. (O primeiro cego deixa o palco, sem escutar.) O que é ficou surdo? (Entra um turista com um mapa.)



TURISTA- O senhor poderia me dizer se essa é a praça Mário de Andrade?



SEGUNDO CEGO- Onde é o que?



TURISTA- A praça Mário de Andrade.



SEGUNDO CEGO- E agora finge que não aconteceu nada? (Dá uma bengalada no turista.)



TURISTA- O que é isso seu cretino?



SEGUNDO CEGO- Para você aprender a respeitar os deficientes visuais. (Dá outra bengalada na cabeça do turista e vai saindo de cena.)



TURISTA- (Sem entender.) Que é que eu fiz?



SEGUNDO CEGO- Tome! (Joga spray de pimenta em cima do turista.)



TURISTA- Nossa! Fiquei meio tonto. Melhor eu sentar aqui no banco e descansar um pouco, está tudo escuro. (Senta. O primeiro cego retorna com seu motorista.)



PRIMEIRO CEGO- Você está vendo ele?



CHOFER- (Que vê o turista com uma cara de bobo.) Já vi o valentão, ele está sentado ali no banco.



CEGO- (Falando baixo para o chofer.) Agora se lembre de que a arma descarregada é para ele e a carregada para mim. Você é o Juiz. (Os dois se aproximam do turista.)



CHOFER- Senhor tenha a bondade de escolher as armas. Mostra as duas pistolas para o turista.



TURISTA- Mas a cidade é toda maluca!



CHOFER- Trata-se de um duelo por você ter ofendido a honra do meu patrão, o senhor Valdir.



TURISTA- Um duelo?



CHOFER- Sim e eu serei o juiz.



TURISTA- Do lugar de onde eu venho às coisas não são assim. (Turista que pensa que o primeiro cego, tratar-se do segundo cego.) Afinal é ele que me deve desculpas pelas grosserias. Vamos resolver de outra maneira.



CHOFER- Hora cale-se e escolha uma pistola.



TURISTA- (Para o Chofer.) Esse babaca é realmente cego?



CEGO- Cego sim, mas não sou surdo.



TURISTA- (À parte.) Então não tem como ele me acertar. (Pega uma das pistolas, o chofer coloca munição na outra e entrega ao cego sem que o turista perceba.)



CHOFER- (Para o turista.) Você vai ter de dar uns gritinhos a todo instante para que o meu patrão saiba onde você está.



TURISTA- Gritinhos?



CHOFER- Assim. (Dá uns gritinhos como um alarme de rádio relógio, turista imita.) Isso mesmo. Vocês contam até dez virem-se e atirem. Ok?



TURISTA- Ok.



CEGO- Ok. (Um fica de costas para o outro e o chofer recua um pouco, começam a andar, o cego cada hora aponta para um lugar e o turista começa a dar os gritinhos até que se viram e o turista aperta o gatilho nada acontece. De repente a luz cai ouvimos um tiro e a luz volta, o turista cai morto.)




CHOFER- Excelente pontaria senhor Valdir. Vamos embora?



CEGO- Claro. Rápido. (Chofer guia cego para fora do palco, turista permanece morto com a arma na mão. Entra um apresentador, uma espécie de mestre de cerimônia.)



APRESENTADOR- Senhoras e senhores bem vindos a mais um campeonato de detetives. Vamos agora chamar o representante do estilo inglês de investigação: Sir Ernest Scroll. (Entra um detetive de chapéu e cachimbo Sherlock Holmes, ele também veste um casaco quadriculado.) Bem vindo Sir Ernest.



ERNEST- (O olha de cima abaixo.) Me diga senhor...



APRESENTADOR- Chicão.



ERNEST- Senhor Chicão, qual era a sua relação com a vítima?



CHICÃO- Eu sou o apresentador do campeonato. Nem conheço a vítima.



ERNEST- Sei. (Anota em um caderno.) E como você acha que a vítima morreu? (Vai até o cadáver e continua anotando as coisas em um caderninho.)



CHICÃO- (Para de sorrir.) Acho que levou um tiro.



ERNEST- (Encarando o apresentador.) E o que o leva a crer nisso?



CHICÃO- Já voltaremos com o senhor Ernest, mas antes vamos dar as boas vindas ao detetive Ted. (Entra um detetive de, sobretudo capa e um chapéu. Ted acende um cigarro.) Ted senhoras e senhores segue a escola americana de investigação. Enquanto Sir Ernest é mais observador da perícia e da psicologia da vítima, Ted é daqueles detetives que saem da biblioteca e vão para a rua investigar. Vão até o submundo se necessário.



TED- Isso mesmo quem me ver na Augusta saiba que é investigação.



ERNEST- (Para Ted.) O que você acha que aconteceu com a vítima?



TED-Veremos. (Vai até o cadáver do Turista e tira a carteira dele do bolso, sem que Sir Ernest perceba pega o dinheiro que está dentro.) Talvez tenha sido suicídio.



ERNEST- Impossível. E me diga senhor Ted, onde você estava quando o assassinato ocorreu?



TED- Isso é absurdo eu estava no camarim com você.



ERNEST- Mas em determinado horário você saiu por alguns instantes do camarim.



TED- Eu fui ao banheiro.



ERNEST- Mas nesta ida ao banheiro você teve tempo suficiente de vir até aqui e atirar na vítima pelos bastidores do palco.



TED- Ok eu confesso.



ERNEST- Viram ele confessa.



TED- Mas eu estou debochando. Qual seria o motivo de eu matar este sujeito que eu nem conheço?



ERNEST- Simples você é um serial killer.



TED- É verdade eu não fui ao banheiro. Eu vim até aqui no palco, mas não fui eu quem matou a vítima.



ERNEST- Então quem foi?



TED- Foi ele. (A ponta para a platéia, a luz ilumina o segundo cego, que agora está sentado na platéia e parece não perceber a luz em cima dele.)



ERNEST- Impossível este senhor é cego. Como ele acertaria o tiro?



TED- Muito simples, a vítima dava gritinhos. (Imita os gritinhos do turista.) Logo era só seguir o som.



ERNEST- E qual seria o motivo?



TED- Não sei. Maldade? Talvez ele nem seja cego. (Cego começa a se sentir desconfortável com a situação.) Talvez ele ande assim para fazer uns trocos.



ERNEST- Assim como?



TEDE- De cego. Quis se vingar do outro cego, o cego rico que também estava presente. Eu o vi fugir com o chofer.



ERNEST- Você quer incriminar um inocente no seu lugar. Foi você quem o matou eu tenho certeza disso.



APRESENTADOR- Ok. Agora vamos voltar à fita e descobrir quem realmente matou a vítima. (A luz volta, mas o cadáver continua imóvel.) Vamos fazer a reconstituição. (O turista não se mexe. O apresentador vai até ele e da umas mexidas nele com o pé. Apresentador para o turista.) Ei rapaz levanta vamos fazer a reconstituição. (Como nada acontece apresentador da um sorriso e emenda.) Mais um caso de morte envolvendo drogas, um traficante é morto não se sabe se por brigas de quadrilha ou ainda executado pela polícia. As investigações continuam e a polícia diz que vai revelar detalhes da morte assim que tiver um. Mais um crime sem solução, nem com a ajuda americana, aponta Ted, nem com a colaboração inglesa chegamos a um desfecho.



SIR ERNEST- O criminoso deixou cair o rg. É o teu Ted.



TED- Você está plantando provas.



ERNEST- Como eram mesmo os gritinhos que a vítima fazia. (Ted imita os gritinhos.) Bom faz de novo. (Ted começa a fazer de novo, barulho de tiro. Ted cai morto. Luz no canto do palco, primeiro cego com a arma na mão.)



PRIMEIRO CEGO- Oh, cara difícil de morrer.

(Pano.)

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Museu de armas

Personagens:

Jovem Alexandre o grande

Aristóteles

Um ator magro

Um ator gordo



Cena:



Antiguidade, escritório do jovem Alexandre da Macedônia, manhã.



Cenário:



Uma mesa, a qual debaixo de um dos seus quatro pés há um livro de calço. Algumas cadeiras.



(Alexandre e Aristóteles discutem durante a aula.)



ARISTÓTELES- Mas que idéia Alexandre, um museu de armas?



ALEXANDRE- É isso mesmo professor Aristóteles. Quero investir em marketing.



ARISTÓTELES- Então construa bibliotecas, centros esportivos, teatro, dança para juventude. Mas não posso concordar com um museu de armas.



ALEXANDRE- Blá,blá,blá... Além do mais já construí uma biblioteca em Alexandria.



ARISTÓTELES- Sim mas essa fica no meio do deserto.



ALEXANDRE- Tanto melhor assim ninguém lê aqueles livros.



ARISTÓTELES- Não entendi? Para que fazer uma biblioteca onde ninguém lê os livros?



ALEXANDRE- Porque passa a imagem de um bom governante preocupado com o social. Depois se as pessoas começam a ler vão ficar instruídas e se ficarem instruídas irão querer derrubar o meu governo.



ARISTÓTELES- Isso é censura!



ALEXANDRE- Eu sou o dono do mundo, faço o que eu quiser. E além do que nenhum daqueles livros fui eu que escrevi, não levo os méritos e sim os autores, já um museu de armas.... (Suspira). A glória é só minha, pois sou um guerreiro. O maior do mundo e chega de teoria Aristóteles.



ARISTÓTELES- Não permito.



ALEXANDRE- Você acha que sempre tem razão não é? Pois saiba que descobri furos em suas teorias.



ARISTÓTELES- Furos? Impossível!



ALEXANDRE- Achei.



ARISTÓTELES- Furos?



ALEXANDRE- Furos.



ARISTÓTELES- Furos?



ALEXANDRE- SIM! E testei. E comprovei.



ARISTÓTELES- Em qual delas por exemplo?



ALEXANDRE- Na da gravidade. (Pega a apostila e lê.) Aqui você diz que objetos mais pesados caem mais rápidos do que os objetos leves.



ARISTÓTELES- E está correto.



ALEXANDRE- Não. Não está e vou te provar. (Vai até a porta e grita para fora.) Mandem entrar os dois voluntários. (Entram o ator gordo comendo um saco de pipoca e ator magro, o gordo encontra-se feliz e não percebe a gravidade do que vai acontecer já o magro está distante um tanto quanto melancólico.) Estes são os voluntários, já testei em outros e vou agora te provar.



ARISTÓTELES- Mas afinal o que você vai fazer com estes homens Alexandre?



ALEXANDRE- Como assim? O que eu vou fazer? Vou jogá-los.



ARISTÓTELES- Jogá-los aonde?



ALEXANDRE- Pela janela, vou jogá-los exatamente juntos para vermos quem chega primeiro ao solo, se é o mais pesado (Aponta para o gordo) ou se é o mais leve? (Aponta para o magro, nisso o ator gordo fica desesperado e para de sorrir e comer pipocas.)



GORDO- (Olha para o magro, mas este está olhando para o infinito e não muda a expressão, depois diz para Alexandre.) Mas não vai machucar a gente?



ALEXANDRE- Qual nada.



GORDO- (Vai até a janela e olha para baixo.) Mas é muito alto, não estou treinado. (Volta a olhar para o magro, que continua imóvel.) Você não acha? (O magro dá de ombros).



ALEXANDRE- Você que é mais fortinho não dá nada.



GORDO- Não quero.



ALEXANDRE- Cala a boca é pela ciência. (Empurra os dois, o gordo e magro, em direção a janela. No que o magro ao ver o livro de Aristóteles calçando a mesa corre até ele e o retira.)



MAGRO- Mas este livro sobre existencialismo é ótimo. Fez-me sentir tão leve.



ARISTÓTELES- (Bravo, tira o livro da mão do magro.) Não acredito Alexandre! Você colocou o meu livro calçando o pé da mesa?



ALEXANDRE- Eu dei uma utilidade a ele. Ou a mesa ia ficar bamba?



ARISTÓTELES- Vou me embora daqui.



ALEXANDRE- Mas não é para tanto!



ARISTÓTELES- Vou para o Brasil, aceitar o cargo de reitor numa universidade federal, com cartão corporativo e tudo. (Sai.)



ALEXANDRE- (Corre até a porta e fala para o lado de fora do palco.) Espera ainda nem jogamos os caras. É divertido, precisa ver o jeito que eles gritam. (Ninguém responde ele volta e encara o magro.) E você precisava mostrar que o livro era o dele? Eu nem tinha reparado.



GORDO- Estamos liberados Seu Alexandre?



ALEXANDRE- Estão nada, pode pular é já. (Tira uma faca o gordo sai correndo de cena como se pulasse uma janela, ouvimos os gritos e depois uns gemidos.)



GORDO- Estou vivo! Ai! Ai! Estou vivo. Escapei! Consegui! Não acredito! Uhuh! (Barulho de caminhão buzinando que atropela o gordo.)



ALEXANDRE- (Para o magro.) Bonito, agora quem vai resolver o meu problema? Se meu filósofo, ministro de assuntos especiais foi embora?



MAGRO- (Olha em volta e depois confiante.) Eu?



ALEXANDRE- (Irônico.) Claro, você um peão qualquer, vai me dizer como construir um museu de armas sem tirar dinheiro do estado, porque a oposição vai dizer que eu estou gastando dinheiro público em benefício próprio e sem tirar da minha fortuna pessoal porque eu não sou bobo nem nada. Como então? Você tem um minuto para me dizer. (Mostra a faca ao magro.)



MAGRO- (Depois de refletir um pouco.) Essa é fácil.



ALEXANDRE- Fácil?



MAGRO- Faça como eu e minha patroa fazemos todo mês.



ALEXANDRE- E o que vocês fazem?



MAGRO- Reservamos quatro por cento do nosso ganho para atividades culturais.



ALEXANDRE- Não entendi qual a relação?



MAGRO- Museu não é cultura?



ALEXANDRE- Sim e daí?



MAGRO- Então faça os comerciantes e grandes banqueiros tirarem todo mês quatro por cento... Digamos do imposto de renda deles, seria assim uma isenção fiscal, o contribuinte ou a empresa contribuinte ficaria isenta desses quatro por cento e se tornaria um mecenas.



ALEXANDRE- (Fazendo as contas.) Taí gostei. A lei do mecenato. Todo mundo fica feliz e meu museu sai.



MAGRO- Já que gostou, que tal uma bolsa de estudos para mim em Atenas?



ALEXANDRE- Farei melhor que isso.



MAGRO- Melhor?



ALEXANDRE- Qual o seu nome?



MAGRO- Rouanet.



ALEXANDRE- Darei o seu nome a lei. Agora suma. (Magro sai correndo.)

(Pano.)