sábado, 2 de julho de 2011

The girl from Nebraska.


 Dizem que Ava Gardner foi descoberta na rua. E se tornou alem de estrela de Hollywood o sonho de pelo menos duas gerações de homens e com certeza de algumas mulheres também. Inclusive o meu.
 Acontece que depois de duas semanas na Califórnia, forno quente em espanhol, eu já começava a acreditar que Los Angeles é um lugar decadente, habitado por pessoas com sobrepeso, derretidas, feias e mal vestidas.
 Finalmente encontrei uma espécie de café, que me pareceu ao mesmo tempo belo e com um toque de humor.     
 Eram duas da tarde, logo havia apenas uma mesa. Uma menina de óculos me sorriu atrás do balcão e disse, em inglês claro:
 “Onde você quiser”.
 Leitor, esta menina, saiu de trás do balcão e veio atravessando o salão em minha direção no jeito mais lânguido que já vi. Ela deslizava como numa tomada de cena de um filme, perfeita. Como a melhor tomada de cinqüenta, oitenta vezes. 
AÇÃO!
 “Você é realmente campeão mundial de frisbee?”
 Ela disse isso sem nenhuma pressa. E no mesmo instante eu pensei: “Encontrei.” Encontrei a loucura da Califórnia. A transgressão, a arte, o cinema... Tudo em apenas uma única frase.
 Frisbee? Que diabo é frisbee? Pensei. E me lembrei da camiseta que eu vestia. Sou realmente um brazuca. Vestia uma camiseta envelhecida artificialmente, que dizia ser eu vencedor do campeonato mundial de frisbee em 1979.
 A verdade é que apesar da minha altura não ser large a minha largura é. Logo eu tinha comprado àquela droga de camiseta porque outras tantas dez não haviam servido.
 “Não. Não sou não. É só...”
 Ela sorriu claro que estava me gozando.
 “O que você me sugere?”
 “Para café da manhã, almoço ou jantar?”
 Achei tratar-se de outra gozação, afinal eram duas da tarde. Mas percebi que não.
 Então veio um prato que era uma mistura de carne, espinafre, pimentões e cebolas. Na verdade dentro de uma tigela, tudo realmente misturado. E uma limonada. Depois ela me trouxe uma pimenta. E disse com sua voz sensual e tranqüila.
 “Feita aqui mesmo em Venice.”
 Falou de um jeito que Venice o bairro ficou mais charmoso do que Veneza a cidade.
 “De onde você é?” Ela quis saber.
 “De onde você acha?” Eu devolvi.
 “Continue falando.” E continuei.
 “Russo!”
 Russo? Acho que vi uns dois ou três Russos na vida, mas acho que eu não pareço um Eslavo. De maneira nenhuma.
 “Acertou.” Eu não gosto de desapontar as pessoas, depois os Russos não são mais inimigos da América há alguns anos.
 “E você?”
 “Eu sou de Nebraska”.
 “De Lincoln?”
 Ela não podia acreditar que aquele Russo pudesse conhecer a cidade de Lincoln. Fechou a mão e fez um “Yes!”
 “Mas não. Eu sou de uma pequena cidade de 400 habitantes”.
 Foi então que eu reconheci a música de Tom Jobim que estava tocando.
 “Olha que coisa mais linda que vem e que trás,
 Esta limonada
 A caminho de Santa Monica..."
 Isso foi no último dia de viagem. Porque se não fosse eu levaria meu violão lá todos os dias e cantaria, para aquela Deusa de óculos. A garota de Nebraska. 
 Isto foi em junho e ela disse ter chegado em L.A. apenas em janeiro.
 Ou seja, se esta garçonete se tornar uma estrela, porque ela inclusive já é, eu vou poder dizer que fui eu quem a descobriu.
 E quando eu menos esperava, ela veio com um outro copo de limonada. E disse agora como uma garota da fazenda.
 “Beba tudo. Você vai precisar.”
 CORTA!
  Perfeito. Ou melhor, perfeita!
 E aquele sussurro vai ficar para sempre nos meus ouvidos. Close da câmera nos lábios:
 “Venice”.