domingo, 30 de janeiro de 2011

Amor à primeira vista.


 Minha missão ou intenção era clara. Entrar na loja da operadora de telefonia e explodir tudo. Radicalismo. Eu sou uma pessoa muito tranqüila.
 Na verdade eu sabia que estava fazendo um serviço de utilidade pública, já que a ANATEL não funciona. Não era uma questão só particular, talvez por isso eu parecesse calmo zen.
 Ela percebeu de longe o extremista. Saída do seriado 24 horas, num gesto pequeno fez com que as outras funcionárias se afastassem de mim. Tinha coincidentemente 24 anos de idade e cinco de experiência em negociações.
 Levou-me para uma sala e disse-me que se chamava Leidiane.
 “Como a personagem do Ricardo III?”
 Enquanto eu falava sobre Shakespeare e a incrível cena de Lady Anne com Ricardo III e os atores que já vira fazendo, ela com seus olhos verdes e rosto de Mangá japonês me encarava sem expressar nada. Procurava nos seus arquivos de memória como classificar aquele cliente.
 “Melhor eu falar qual é a minha queixa, né?”
 Nessa altura eu já sabia que ela era casada ou morava junto com o mesmo rapaz há seis anos. Tinha um filho e no fundo estava morrendo de vontade de rir. Eu mesmo nem me lembrava muito qual era ou eram as minhas queixas:
 Não ser casado? Não ter ninguém que se preocupe com o que vou comer, almoçar, jantar? Minha mãe não está nem aí. Tive uma vez uma fisioterapeuta que cuidou do meu ombro. Ela realmente se interessava: “Como foi o seu dia?” “Melhorou?” Me tocava e se preocupava. Se a fisioterapia não terminasse, ela corria o risco de tornar-se minha esposa.
 Leidiane percebeu que estava ganhando fácil na negociação. Também o que eu mais gosto no mundo são mulheres jovens, bonitas, com personalidade e inteligentes.  Leidiane é daquelas pessoas perigosas que tem um equilíbrio perfeito entre o emocional e o racional. Eu reconheço fácil esse tipo, porque eu também sou assim.
 Ela percebeu que eu ia detonar. Discou para alguém e saiu da sala. Como no seriado 24 horas, ela disse:
 “Ele vai explodir! Temos que dar o que ele quer.”
 A gente nunca sabe o dia em que vamos nos apaixonar. Muita gente, eu não sei como não acredita em amor à primeira vista.
 Conversando com esse tipo de ser humano na maioria das vezes eles me questionam que não entram nesse caminho fácil.
 Como se fosse uma escolha minha. Estou lá, coloquei qualquer roupa, com uma espinha inesperada, ninguém me avisou que seria hoje o dia e eis que ela surge do nada.    
 Não leitora não me apaixonei por Leidiane. Só tive vontade não de ter uma namorada, mas sim uma esposa como ela. Batalhadora, branquinha, loira, uma bonequinha ao mesmo tempo firme e perigosa.
 Ao se despedir essa mulher se quebrou numa menina deu uma risada, depois parou. Olhou-me e deu um sorriso. Não resisti dei dois beijinhos (no rosto) e segui.
 Eu estou falando de outra menina. Uma que eu nem deveria me apaixonar. Alias, eu sempre tenho um movimento contrário. Um movimento de tentar fugir. Acontece que depois da primeira vista é como uma flechada, nossos olhos vão para ela como imãs.
 Por mais que disfarcemos e tentamos olhar em outras direções, falar de outros assuntos, nossa cabeça vai registrando cada detalhe. Nosso olhar retorna. Os pelos do braço dela. O jeito dela andar, os cabelos despenteados. A voz que entra dentro da gente e sentimos todo nosso corpo se arrepiar. As roupas.
 E eu pra variar fico um monstro, grosso e babaca. E apesar de só querer uma coisa a de me declarar ali mesmo, fico pedindo que acabe logo. Que ela me ache realmente um babaca e pronto.
 E talvez nunca me declare. E talvez por uns segundos eu acredite no que eu disse agora mesmo: Nunca me declare.
 E mesmo na São Paulo no século vinte e um, eu sou um personagem de Shakespeare.
 Sim porque quando nos apaixonamos a primeira vista, nós não aceitamos. Eu pelo menos entro em pânico.
 Começar a gostar dos defeitos da pessoa e achar aqueles defeitos atraentes. 
 E querer só aquela pessoa. E querer aqueles defeitos pra mim. E de repente vem àquela dúvida:
  E se o cupido jogou só uma flecha? Só em mim?
  Menina eu não pude falar antes. Mas falo agora. Você é linda e eu estou apaixonado por você. Não sou poeta, o que não sei se é bom ruim, tem tanta poesia disponível... O que eu vi em você? O que eu quero com você?
 A possibilidade de ser feliz. De o mundo ser mais interessante. Quem sabe algumas crônicas. Fazer bem a você. Deixar-te ainda mais feliz também. E daqui muitos e muitos anos, poder dizer:
 “Foi amor à primeira vista.”