terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Vinte anos.


 Bruno estava decidido iria terminar o namoro. Só não sabia se antes do francês ou depois. Conhecera Gabi no cursinho. Magra, alta e linda. Todos eram apaixonados por ela, inclusive os professores e até algumas professoras. 
 Um dia ela lhe disse que ele deveria ter um estilo, faltava isso nele. Estilo? Mas estilo é pra gente com grana e alta. Eu sou duro e baixinho, foi o que ele pensou. 
 "Veja eu, por exemplo. Eu sou uma Roqueira da Daslu. Entendeu? Esse é o meu estilo." Ela declarou.
 "Eu sou um cara que gosta de carro, de cerveja e futebol." Ele se defendeu.
 "Mas você nem tem carro, usa o do seu irmão." Ela contra atacou. 
 Meses depois, bêbado de sono, ele vê Gabi entrar na sala de aula, completamente mudada. Cabelo fashion, esmaltes fortes, colares e roupas modernetes, não era mais uma roqueira e sim uma budista-contemporânea, como ela mesma se definiu. Depois vieram as tatuagens. O sexo também mudou, Gabi dizia que ele era menino e não fazia nada direito. Ficou mais burocrático também. 
 Conheceu então Marcela. Uma mina muito simpática, que sentava atrás dele. Corinthiana adorava uma cerveja e um sambão. Gostava de carros e principalmente caminhões. 
 Um dia ele levou Marcela pra casa. Depois de um dogão ela abriu o jogo:
 "Quer saber acho a sua mina meio sem bunda." 
 Meu Deus! Foi aí que ele se deu conta, Marcela era um amigo. Marcela tinha um puta estilo. Algo under-ground. Mas era um amigo. 
 Era de tarde um dia de verão. O porteiro talvez tivesse avisado a empregada que ele ia subir. Mas naqueles tempos as coisas eram menos paranóicas. Será? 
 Gabi pega de surpresa o recebeu na porta.
 "Olha Gabi eu andei pensando... O problema é comigo não com você... Deixa eu entrar." Tentou forçar a porta. Mas Gabi segurou.
 "Depois a gente conversa. Você não tinha aula de francês agora?" 
 Quando ela ia empurrando a porta, ele vê o Mário vindo sem camisa. Ma o que o Mário seu amigo estaria fazendo na casa da sua namorada de tarde? Vindo dos quartos e sem camisa? 
 "Depois a gente a conversa." Ela disse isso e fechou a porta. 
 Hoje dezesseis anos depois vi Gabi num restaurante sofisticado dos jardins. Ela estava de shorts jeans e uma bonita camisa. Segurava uma bolsa bem cara e continuava bem apresentável. Mas muito magra. Não havia estilo nenhum, nem nada que não a fizesse uma balsaca alienada, vazia,  com um toque de perua elitista. 
 Aos vinte anos todos olhavam pra ela. Hoje todos devem olhar e imaginar que menina linda deve ter sido aos vinte. 
 Daquele tempo de cursinho vejo muito a Marcela. Ela sempre me dá um oi discreto. Ela é umas das principais formadoras de opinião em moda do país. 
 Mário está praticamente careca e com dois filhos. Já o Bruno, de dois em dois anos, eu o encontrava com diferentes novas namoradas de vinte. Não o vejo faz tempo. 
 Certa vez nós cinco fomos para a Bahia. Já tínhamos vinte anos e cada um numa faculdade diferente. Conhecêramos-nos no cursinho. 
 Sonhávamos com um Brasil de esquerda. E quatro de nós sonhavam com Gabi. 
 Enquanto ela discutia com a jovem hostess  de vinte anos eu me aproximei. Ela me deu oi, me olhou de cima pra baixo, depois se virou e junto com uma amiga falavam ao celular e discutiam com a hostess. 
 Gabi não me reconheceu. Cheguei em casa me olhei no espelho e também não me reconheci. 
 Onde está aquele jovem de vinte anos que disse naquele verão na Bahia que seria diretor de cinema? Que mudaria o Brasil? Transformaria o mundo. Será que era só mais um bêbado? 
 Abro então o facebook e lá está a mensagem de Gabi:
 "Você Leonardo continua o mesmo."
 "O mesmo?" Eu respondo a menssagem.
 ”O mesmo convencido. As minhas amigas te acharam um gatinho. Eu fiquei até nervosa, quase desmaiei. Você não mudou nada, me fez lembrar até daquele verão na Bahia que eu ficava com aqueles dois horrorosos só pra ver se você me notava. E você sempre escorregando... Até budista eu já fui pra ver se te agradava!!! Até roqueira. Lembra? Enfim adorei te ver. Quando quiser tomar um café, me ligue 9632-4892. 
 E a propósito você sabia que o Marcelão agora manda na moda do Brasil? Podíamos juntar todos de novo, né? Beijo e adorei te ver. Pena que vc... Beijo sabonete!”
 O que eu concluo que talvez eu não fosse tão revolucionário aos vinte anos. E que embora não soubesse não me faltava nada. Estilo nenhum.