quarta-feira, 30 de maio de 2012

Skeeter e Scarlett.



 Scarlett O’Hara, exibicionista, linda. É obcecada pelo seu primo. Ama, ama,ama, ama, o amor é sua única preocupação na adolescência. Procedente do Sul dos estados unidos.
 Seu ideal de vida é que a civilização escravocrata se perpetue eternamente. Fazer com que suas terras permaneçam para sempre na sua família.
 Com a guerra, perde tudo. Não hesita em matar, roubar, enganar e casar sem amor, para continuar no poder. Ou seja, continuar com suas terras e títulos aristocráticos. A sua sensualidade lembra uma vilã dramática, ou ainda uma jovem apaixonada numa comédia romântica.  
 De tão estereótipo ela, Scarlett, se torna humana. E os homens são presenças essenciais no grande filme e o “Vento levou”.
 Leitora, quantas e quantas vezes, eu não me lembrei de Scarlett, depois de tomar um fora. De uma decepção amorosa. Inúmeras. Se ela a mulher mais linda do Sul era desprezada por um homem que de marcante não tem nada.
 E quantas e quantas vezes eu não me senti o capitão Red Butler também. Quando as minhas Scarletts me desprezaram, eu pensava: “Um dia, um dia, elas verão que eu é que sou o realmente o amor da vida delas.”
 Mas eis que ontem leitora, resolvo, depois de muito hesitar, assistir ao filme “Vidas cruzadas”.
 E lá estava ela, Eugenia Skeeter, cem anos depois da Scarllet, no mesmo Sul dos EUA. Mesma elite e civilização, que o pernambucano Gilberto Freire, dizia ser tão parecida com a Nordestina Brasileira. A comida apimentada, os costumes conservadores, as enormes fazendas de platation, lá algodão, aqui a cana. A escravidão.
Mas voltemos a Skeeter. Eugenia, não é uma princesa. Não ama ninguém aparentemente. Não é bonita. Não é exibicionista. Não é charmosa. Nem estilosa. Não tem convites pra sair. Não é querida pelas amigas, não é uma líder. Não é a filha que a sua mãe queria. Eugenia vem de uma rica família tradicional do Mississipi dos anos 60, e parece que é só. Agora o Sul vive de certa forma o sonho econômico americano. Mas a divisão racial está prestes a explodir em uma guerra civil, só que desta vez: Sul contra Sul. Americanos negros reivindicando seus direitos civis.
 Então Skeeter é uma líder política? Uma revolucionária? Errado ainda. Ela consegue um emprego no jornal local, para continuar com uma coluna de conselhos domésticos.
 Acontece que Skeeter tem criatividade na mesma proporção que tem coragem. E ela apesar de estar no atrasado Sul, é uma das criadoras, inventoras do New Journalism.
 Skeeter tem uma voz única e gigante. Eugenia Skeeter talvez não tivesse o infinito número de homens atrás dela, com Scarlett, porque no fundo os homens sabem que sempre serão inferiores a ela.
 Porque com Scarlett é um desejo, com Skeeter é uma admiração, amor, ela é uma personagem dramática, uma heroína, mas é mais que isso também. Ela me da inveja. Vontade de ser como ela.
 Já Scarlett, é um desejo de possuí-la. E para que a leitora não ache que eu sou sujeito mórbido, eu to falando dos personagens mulheres e não das atrizes que os interpretaram, ok?
 Skeeter viveu num mundo de duas opções, os afazeres domésticos das mulheres, a vida prática dos homens, os brancos privilegiados e negros oprimidos e humilhados.
 Ela não só denunciou este mundo, nem só quis transformá-lo. Ela só era uma desajustada. Talentosa e desajustada.
 O mundo se reconstrói por Scarletts. Mas novos mundos são inventados por gente desajustada, pessoas corajosas, talentosas e muito lindas, como Eugenia Skeeter. 

 (Fica a dica: "The help", no original. "E vidas cruzadas", no Brasil).