domingo, 30 de junho de 2013

Mas e a Claudinha?

Luciano entrou assim, por acaso, numa livraria. Estava com o dia livre. Olhava as prateleiras, pegava alguns livros, via por alguns segundos e os devolvia. Pela janela,  um dia nublado e frio.
 Não percebeu a menina se aproximar.
“Posso ajudar?”
 Não podia acreditar naquele anjo de pele branquinha e grandes olhos verdes. Pediu um livro do Rubens Fonseca.
 “Você quer dizer Rubem?”
 “Eu nunca sei se é Rubens ou Rubem.” Ele riu dele mesmo. Então ela sorriu e disse:
 “É Rubem. Eu lembro porque o meu pai também é Rubem.”
 Ele passou a frequentar a livraria. A estudante de psicologia e vendedora, Claudinha, sempre estava lá. Numa outra tarde, outro dia livre de Luciano, aliás, os dias livres de Luciano eram bem frequentes, ele pediu um Mário Vargas Llosa que ficava bem no alto.
 Claudinha, era Claudinha, pois era baixinha. Teve de subir na escada e Luciano pode ver aquele pedaço das costas da menina próximo a bunda, aquele que vemos quando uma menina levanta os braços.
 Ele ficou obcecado por aquele pedaço de costas branca. Voltou só três semanas depois, já que era verão e ele acabou indo viajar para a praia. Queria contar sobre o Mário Vargas Llosa. E qual não foi a sua surpresa ao ver a livraria fechada. Iriam construir um prédio no local. É o que um dos engenheiros que estava lá lhe disse.
 “Mas e a Claudinha?”
 O engenheiro disse que não sabia de nenhuma Claudinha. E que também não tinha o telefone do antigo dono da livraria.
 Passaram-se vinte anos. Luciano agora era um advogado, sócio de escritório renomado.
 Foi para um bar beber num fim de expediente. Pediu uma caipirinha de cachaça mesmo. Outro sócio passou no mesmo instante em que ele fazia o pedido. E comentou aquilo com um gesto de deboche:
 “Cachacinha né Doutor Luciano?” Gargalhou e seguiu para outra mesa.
 Aquilo o aborreceu demais. Mas escondeu a raiva. O celular toca, é sua namorada recente, Eduarda.
 Ela aparece com uma amiga. Claudinha. A mesma Claudinha, agora psicóloga. Ficam os três na mesa conversando e bebendo. Passam-se horas. Eduarda olha pela janela e diz:
 “Adoro este prédio.”
 “Sabe que ai era uma livraria antes?” Pergunta Luciano.
 “Claro que eu sei, eu lembro quando a Claudinha trabalhava nela”.
 “Você trabalhou na livraria que tinha aqui, Claudinha?”
 “Dois anos.”
 “Espera que eu vou lembrar o nome dela.”
 “Livraria Tavares.” Disse Claudinha. “Trabalhei dois anos nela.”
 “Então com certeza você me atendeu muito.”
 Claudinha olhou bem para Luciano.
 “Com certeza sim.”
 “Quanta coisa que já existiu em São Paulo.” Suspirou Eduarda.
 “Quantas vidas e histórias.” Completou Luciano.
 “Atendi tanta gente nesta livraria.”
 Neste momento Luciano reconheceu Claudinha.
 “Mas agora eu estou te reconhecendo.”
 “Eu também to vendo que você não é estranho.”
 “Das aulas de francês, lembra?”
 “Claro, naquela escola de línguas. Nossa! Lá se vão muitos anos. Uns cem?” Ri.
 “Acho que oito.” Concluiu Luciano. “Nós falávamos de Mário Vargas Llosa.”
 Claudinha não se lembrava disso, mas concordou.
 “Bem, tenho que ir.”
Claudinha levantou-se e quando foi pegar a bolsa, Luciano pode ver um pedaço branquinho de suas costas. Ficou fascinado com aquilo.
  Luciano e Eduarda não deram certo. Terminaram dias depois.

 Ele acabou casando com uma sócia do escritório, que as terças e quintas, faz terapia com uma psicóloga. A doutora Cláudia.