quinta-feira, 14 de março de 2013

Pepinos em conserva.


 Ele já havia dado três mordidas. Era nítido que algo estava errado naquele sanduíche de salmão defumado, queijo estepe, alfaces americanas, cream-cheese e pepinos em conservas.
 Mas claro! Este amargor com cara de estragado é o pepino. Retirou a tampa de baguete com gergelim. Só podia ser. Lá estavam eles bem pequenininhos, apanhou um bocado e colocou na boca.
 Estavam moles e ruins. Mas como ter certeza de que o gosto não era aquele mesmo? Mandar trocar poderia ser uma injustiça. Afinal era um lugar elegante, charmoso e bem frequentado e pasmem havia gordinhas trabalhando lá.
 Em qual lugar da moda se veem gordinhas no salão? Exposição de fotos, cardápio inventivo, preços razoáveis? E fazer uma deselegância dessas? Trocar o prato?
 Ele tentou bem sutilmente.
 “Nossos pepinos em conserva são preparados em sei lá o que. Depois colocados sei lá onde. De maneira que você pode estranhar, mas o gosto é refinado e é este mesmo”.
 Bem sutilmente não tinha funcionado. Aquele maitre se retirou e deu o caso por encerrado.
 Logo ele não teve alternativa a não ser radicalizar. Agora ele queria vingança pela falta de delicadeza do maitre. Levantou-se para espanto das gordinhas e dos clientes e perguntou em alto em bom tom:
 “Pago aqui ou no caixa?”
 Desta vez o maitre voltou falando mansamente, ofereceu trocar pelo o que ele quisesse.
 Situação acalmada veio um clássico misto quente. O novo sanduiche não tinha nada de estranho, gosto de misto quente.
 Dois dias depois, ele volta, no mesmo horário de almoço novamente sozinho.
 “Um misto quente e um... Este suco aqui de limão, maçã, hortelã, gengibre, sem açúcar.”
 O suco chegou antes do misto, um líquido verde aguado, o suco tinha sido demasiadamente batido e coado. Ficando só algo que lembrava uma água suja de chuva.
 Tomou um pouquinho, ele não gostava de jogar nada fora, ter jogado um salmão fora, dias antes já o tinha feito sofrer de remorso.
 “Um guaraná zero com gelo e laranja, por favor”.
 Acabou que tomou o suco, comeu o misto, tomou o guaraná, comeu um pedaço de bolo e tomou um cafezinho. Na conta esqueceram de acrescentar o guaraná.
 E agora? Será que ele ficava quieto e não pagava o guaraná? O que era um guaranazinho afinal? Nisso tomou outro gole e ainda ouviu uma gordinha garçonete dizer para um cliente ao lado:
 “Antes era com o pepino em conserva, mas reclamaram tanto que mudamos.”
 E o cliente da mesa ao lado:
“Mas eu sonhei com este sanduiche com pepinos em conserva! Não tem mesmo como fazer? Era algo tão original.”
 “Sinto muito senhor”. Disse a gordinha e abaixou a cabeça.
 Foi quando ele se deu conta que todos os seus atos, por mais simples e cotidianos tinham reflexos na vida de outras pessoas, inclusive de pessoas que ele não conhecia.
 Conclui que pagar aquele guaraná era algo de mais valor do que real preço em si.
 “Faltou um guaraná.”
 O maitre disse que não. Que ficava pelo transtorno que ele sofrera na ultima visita.
 Então ele deixou 20 por cento de serviço e seguiu para o escritório.