domingo, 22 de setembro de 2013

Ensaio sobre os Corleones.

 Ensaio sobre os Corleones.

 Meses atrás fui a uma palestra sobre a atual situação política da Síria. Mas não se preocupe leitor, isto não tem nada a ver com os dias de hoje e sim com a obra de ficção:  The Godfather de Mário Puzo, com contribuição de Francis Ford Coppola. Simples assim.
 Acontece que o palestrante daquele dia, no caso meu irmão mais novo, usou a obra como uma analogia para explicar política internacional. Interessante como cada um enxerga a trilogia cinematográfica, eu não li os livros, como quer. O que é ótimo. Aqui vou dar a minha interpretação pessoal sobre ela, a obra. Diferente, mas não melhor do que a do Guga.
 Começo falando da palestra, porque o meu irmão ter citado os Corleones me deixou com vontade rever esta trilogia. Demorei um pouco, mas este fim de semana eu mergulhei nos filmes.
 E ao contrário do que meu irmão e muitos acreditam, não acho que Michael Corleone se tornou o maior chefe da máfia norte americana por acaso. Por acidente. Não. Começo falando sobre Vito Corleone, seu pai.
 Me identifico com Vito. Ele era um artista. Improvisava, era simpático, ambicioso também. Mas qual imigrante não é pelo menos um tantinho ambicioso?
 Acho que ele sim foi longe sem querer. A máfia ainda não tinha seus postos conquistados, devidamente ocupados na América. Os mafiosos antes de Vito eram bufões amadores e exibicionistas, falastrões. Não foi difícil superá-los.
 Vito viu seu pai ser assassinado, depois seu irmão e finalmente sua mãe, esta ultima bem na sua frente, quando ele tinha apenas nove anos. Com um histórico deste não é de surpreender que ele fosse violento. Um garoto de nove anos que em 1901 atravessa o atlântico sozinho precisa sobreviver?
 Vito Corleone foi apenas um imigrante bem sucedido. Um dos muitos chefões do crime organizado de Nova York. Talvez por um pequeno período de tempo o maior deles. O primeiro do raking. Mas ele não conseguiu se segurar. A concorrência era faminta. E tudo entrou numa confusão. Seu pequeno império não demorou a desmoronar. Se não existisse o jovem Michael, tudo seria perdido logo após sua morte.
 Os irmãos de Michael, Fredo e Sony, eram fraquíssimos. Não eram líderes, aliás, não eram nada.
 Quando Vito é baleado, Michael entra em cena. Mas aí é que reside o erro. Achar que Michael não era extremamente ambicioso e focado. Ele queria um futuro maior para si. Maior até que o que seu pai Vito sonhara. Mas até então o jovem era distante e vivia como um universitário.
 Não é a toa que na terceira parte, Michael se torna além de um homem de negócios dentro da lei, com todas as atividades legalizadas, um dos homens mais ricos do planeta. Rico e influente.
 Vito... Vito coitado. Ok, ele era charmoso, e um sobrevivente. Seu charme e sorte o levaram para longe. Claro que era ousado. Mas no fundo há um certo limite para um imigrante.
 A segunda geração, a de Michael, é sempre a mais americana, ou brasileira no nosso caso. Michael precisa se agarrar a cultura americana. E aqui convenhamos é uma terra de imigrantes, nada mais nacional do que o filho do imigrante.
 Ele vai para faculdade e conhece Kay. É óbvio que Michael quer uma mulher não italiana. Ele desde cedo quer superar aquilo. Quer transcender as origens.
 É ele que faz o estado de Nevada. É um dos criadores de Las Vegas. Faz negócios com judeus, com americanos wasps (brancos protestantes). Tenta expandir seus negócios para Cuba e para o Oeste.
 Seu pai Vito, apesar de padrinho de Frank Sinatra era um provinciano perto de Michael. Provavelmente até Frank Sinatra fosse menos americano que Michael.
 É claro que ele acaba casando com uma siciliana, quando estava fugido e longe de Kay. Mas é um casamento de uma americano com uma siciliana. O sonho dele era ser grande, grande como o seu país, os EUA.
 É por isso que Michael se alista para lutar na segunda guerra. Ele ama os EUA. Ele é os EUA.
 Michael inova a máfia, ele a legaliza e está um passo na frente dos próprios políticos americanos. Isso deixava os poderosos americanos mais expostos, eles achavam que estavam lidando com um ítalo-americano, enquanto Michael era cem por cento americano.
 Ele se ofende quando recebe o título de o Ítalo-americano do ano. Ele nunca se auto refere como sendo um italiano e quando fala da Sicilia, ele diz: Este país, eles... E não, nós, e meu país.
 Eu acho que Michael não é uma continuação da Máfia, nem perpetuação das tradições milenares da Sicilia. Michael é o fim da máfia. Um fim que veio de dentro para fora.
 Ele confessa a irmã, já mais velho, que quanto ele mais sobe, quanto mais poder ele tem, quanto mais ele tenta ser honesto, mais podridão, mais miséria e corrupção ele vê.
 Michael é um herói trágico. Michael sempre odiou os mafiosos. Com exceção dos da sua família.
 “Eu preciso de advogados e não de valentões”.
 Vito e Michael não tem nada em comum. A não ser o fato de serem pai e filho. A cabeça de Michael é exata, ele nunca se confunde. Vito se esquece embaralha tudo e se salva com o seu charme pessoal.
 Michael é tão americano, quem sem se dar conta, seu filho Antony se torna um artista. Cantor de ópera. E não um italiano mafioso.
 E sua última frase no filme, ao sair da ópera de Palermo depois de uma performance de Tony, é:
 “Agora os Corleones serão lembrados por uma voz”.
 Infelizmente esta voz, é o grito de Al Pacino ao ver sua filha, Sofia Coppola cair baleada na sua frente, nas escadarias do lado de fora da Ópera. Lado de fora?

 Michael não conseguiu vencer a Sicilia. Lamentavelmente.