quarta-feira, 31 de agosto de 2011

A foto do beijo.


 Combinaram num bar. Ele chegou antes. Pediu uma cerveja e ficou olhando pra rua, folhando um jornal.
 Ela com seu jeitão de moleca vinha tranqüila fumando um cigarro. Como se não estivesse em São Paulo e sim no Rio. Ela veio a pé, morava ali perto.
Deu um sorriso e mostrou o cigarro. Ele entendeu. Ela queria terminá-lo na rua. Ele fingiu que voltara a ler o jornal.
 “Oi.”
 “Oi.” Ele riu.
 “Que foi algum problema?”
 “Você é engraçada.”
 “Engraçado é ler jornal de ontem.” Ela disse.
 Foi aí que ele percebeu que o jornal era de ontem.
 “Você é bem inteligente sabia?”
 “Inteligente? Só porque eu vi que o jornal era de ontem?” Ela disse e fez um não com a cabeça. Depois riu.
 “Quer tomar alguma coisa?”
 “Não”. Pausa. "Você é engraçado.”
 “Um amigo meu diz que quando um casal de namorados ri um do outro, é porque eles se amam.”
 “Acho que quero uma cerveja.”
 “Traz mais um copo.” Ele pediu ao garçom. E ela riu de novo. “Já te disseram que você se parece com...”
 “Já.”
 “Quem disse?”
 “Você.”
 “Nossa, como eu estou repetitivo.” Ela riu.
 “Você é engraçado.”
 “Você não costuma tomar muito sol?”
 “Nós não somos namorados.” Ninguém riu.
 Ele pediu a quinta cerveja. Estavam agora falando de religião.
  “Você está rindo porque eu vou numa igreja?”
 “Não, eu estou rindo porque não somos namorados.” Ele disse.
 “Na verdade eu nunca tive um namorado.”
 O garçom trouxe a conta.
 “Estamos fechando.”
 Já não tinha mais ninguém e as portas quase todas abaixadas.  Pagaram à conta. E quando estavam quase na rua, ele parou, olhou as paredes e perguntou para o garçom e o caixa:
 “Cadê o quadro da foto do beijo?”
 “O que?” Fez o garçom. Olhando para parede também. Havia várias fotos, mas não aquela. A foto de um casal que se beijava, enquanto um garçom que já colocara as cadeiras em cima das outras mesas observava pronto para fechar o bar.
 “Eles tiraram.” Disse com tranqüilidade o caixa.
 Ele deu de ombros. Estava frio.
 “Eu ando um pouco com você.” Ele disse a ela.
 “Você que sabe.”
 Começaram a caminhar. Ele a olhava, ela realmente era uma moleca.
 Chegaram à esquina. Uma noite estrelada e fria.  
 “Tinha um quadro lá que era uma foto de um beijo. Linda a foto. Um beijo de fim de noite.” Ele disse.
 “É... Tem gente que espera uma noite toda para dar um beijo.” Ela riu.
 “Do que é que você está rindo?”
 “De nada, eu estou cansada.”
 Despediram-se. Com um abraço. E ele ainda disse:
 “Eu acho que o trabalho vai ficar ótimo. Eu gosto de trabalhar com você.”
 “Eu também. Você é legal.”
 E cada um foi para um lado.    

sábado, 20 de agosto de 2011

Só para você.


 Lembro-me que quando bem garoto eu amava as aulas de História e literatura. Às vezes geografia. As outras todas eu passava ora desenhando ora olhando as minhas colegas preferidas. Geralmente umas duas meninas, no máximo três delas.
 Certo dia, eu vi no jornal, no roteiro cultural a peça de um grupo do Paraná: “Aula que absurdo!” Eu ainda era estudante. Agora de teatro, lá se vai mais de década.
 Não sei quem é o autor do texto até hoje. Mas foi a única vez que a palavra, aula me interessou. Aula, seguida da palavra absurdo. 
 Cheguei ao teatro, era um dia frio como o de hoje. Não havia muita fila na bilheteria. Eram três salas. Numa delas estava à peça que eu fora assistir. Fui tomar um café. Vi o público das outras salas entrando.
 Dirigi-me a minha sala. Mas um funcionário pediu-me que eu ainda aguardasse um pouco. Ok, também eu nunca vi aula começar no horário. Sentei no hall do teatro. Deu nove e quinze e nada.
 Um rapaz e uma moça se aproximaram. O Rapaz me perguntou:
 “Então você é o tal que comprou o ingresso?”
 Foi aí que me dei conta. Eu era o único público. A única pessoa que estaria na platéia.
 “Você se incomodaria se nós devolvêssemos o seu dinheiro?” Ele falou isso e estendeu as pequenas notas. Peguei o dinheiro, coloquei no bolso e quando eu já estava na calçada, senti uma mão no meu ombro. Era a mesma moça, uma atriz.
 “Mudamos de idéia. Se você ainda quiser vamos fazer o espetáculo só para você.”
 Ela me olhava com os seus dois olhos verdes. Com uma seriedade. Naquele momento eu não responderia só por mim. Para aquela jovem atriz eu representava um público de mil pessoas.  
 Eles então colocaram uma cadeira no meio do palco. E me sentaram nela. A platéia inteira vazia. E eu lá sentado. Só eu, no meio do palco e aqueles cinco atores fazendo o espetáculo em volta de mim.
 Dizem que quando vamos ao teatro a gente se lembra de onde sentou. O lugar exato da platéia. Desta vez me senti mais que num teatro. Senti-me num sonho.
 Ontem fui numa grande sala. Um daqueles espetáculos de centenas de pessoas. Um sucesso. Eu com o meu eterno medo de chegar atrasado cheguei umas oito e quinze. O espetáculo começava as nove horas. Fui então tomar um café. Peguei o guia off e fui para a calçada folhear o livrinho. Então senti uma mão no meu ombro.
 Virei e vi uma mulher grande, linda. Sem seriedade alguma. Ela sorria. E tinha uns lindos, maravilhosos olhos verdes.
 “Hoje você não é o único.”
 Neste instante me lembrei de quinze anos antes. Era ela. Como eu nunca tinha percebido? Aquela atriz premiada, famosa, que eu tanto ouvia falar era ninguém menos que aquela menina persistente, obcecada que eu conhecera anos atrás. Ela conseguiu.
 Terminado o espetáculo, não sei como ela me viu e me mandou um beijo do palco.
 Talvez eu seja o seu público mais fiel. O mais antigo.
 Naquela noite quinze anos atrás. Ela me deu um beijo e voltou pro Paraná.
 Que história absurda. Uma verdadeira aula. Aula de perseverança.

  

segunda-feira, 8 de agosto de 2011

23 capítulo final.

 O leitor deve ler as postagens anteriores. Os capítulos I, II, III, IV, V, VI, VII e VIII. Valeu. 
 Os dois jogadores americanos corriam para dentro do gramado. Pedro vinha atrás com mais dois homens atirando.
 “Mas como eles fugiram?”
  “Um policial de nome Antonio sabia onde eles estavam e chegou antes da gente. Agora eles não querem mais cooperar e querem ver Letícia. Os dois são apaixonados por essa hippie.”
 “E o policial o Antonio?”
 “Está morto.” Responde Franco, um policial também agente duplo.
 “Então foda-se, paramos aqui.” 
 Pedro os segurou e pode ver os dois jogadores serem aplaudidos pela multidão.
 “Não temos mais tempo daqui a minutos o caça vai bombardear o estádio.”
 Juares desde sempre julgava o Brasil um império do Sul. O império do Norte eram os EUA. E hoje ele poderia com um só movimento acabar com as lideranças dos dois impérios. Uma América Latina mais forte e mais livre do imperialismo nasceria dali a poucos minutos.
 Seu grande líder na Venezuela ficaria orgulhoso dele. Na tribuna oficial os assessores do ministro da Defesa receberam a informação de que o caça havia se desviado do alvo, a plataforma X, e rumava para o estádio do Maracanã.
 Em Copacabana o helicóptero do Agente Torres recebe um pedido para decolar. Dessa vez Felipe e os outros ficaram no solo. Era talvez a última vez que veriam Torres e o piloto.
 Juares não pode ver de onde o Helicóptero veio. O caça com o impacto caiu na hora. Mas o piloto do helicóptero conseguiu fazer um pouso de emergência. E ambos sobreviveram. 
 Marcel passava os códigos para a plataforma X. E a pressão foi diminuída e todos os níveis voltaram ao normal.
 O jogo começava no Maracanã. E antes dele terminar o grupo 23 teria de encontrar Mariana e Pedro, para conseguir limpar o nome do movimento. Um movimento pacífico.
 Alex viu que havia um torpedo no seu celular:
 “Prenda Pedro e Mariana, eles são infiltrados. Eles são os verdadeiros terroristas.” Era enviado pelo comandante Alfredo Ferraz. Minutos antes do veneno fazer efeito. 
 Pedro entrou numa van e seguiu para um apartamento em Ipanema. Alex com vários agentes os seguiu.
 No apartamento Mariana e Pablo assistiam à televisão. Pararam quando Pedro entrou.
 “O que aconteceu? Porque o caça não terminou o serviço?”
 As ruas estavam vazias, Camila e Felipe chegaram em pouco tempo ao endereço. Lá embaixo viram Alex e os outros agentes. 
 Quando os EUA marcaram o gol a porta foi arrombada.
 Pedro tentou atirar de volta, mas foi baleado. Pablo e Mariana foram presos.
 Dizem que este jogo, esta final foi um divisor de águas na história do mundo. O Brasil acabou derrotando os EUA por cinco a zero.
 Pela primeira vez em 64 anos o Maracanã via o Brasil derrotar Golias. Perdêramos em 50 para David, mas agora éramos hexa campeões do mundo.
 No Rio e em todo o País era uma festa. A América Latina toda vibrava. A América Latina tinha derrotado os EUA. Mas agora os EUA já não era mais o velho EUA e sim também América Latina, porque estava se tornando uma potencia futebolística e uma decadência econômica.
 O continente Americano neste dia parecia um só.
 A operação de contenção dos atentados terroristas ficou conhecia como operação “Colombo.” Em homenagem ao nosso descobridor.
 Felipe Rulfo e os jovens Lucas e Letícia foram condecorados com medalhas de honra. E os agentes Camila, Torres e Alex também. As acusações foram retiradas, porque até os jogadores americanos confessaram que a idéia do "protesto" partira de Mariana, Pablo e os contatos venezuelanos.
 Letícia ficou grávida. Nem Lucas, nem Felipe sabiam quem era o pai. Os três seguiram em lua de mel para o México. E juraram fidelidade um aos outros.
 Os três haviam sido enganados pela mesma pessoa. Por outro lado foi Mariana que havia feito com que suas vidas se cruzassem.
 No parque de Chaputepec na cidade do México os três prometeram que a filha Franziska seria criada ali no verde de Polanco, na maior cidade Asteca do mundo. Na maior cidade do planeta. Ali começaria a revolução deles.
 Naquela cidade de 23 milhões de habitantes.


P S: Comecei esta história porque queria contar de alguma maneira a relação da esquerda dos anos sessenta com uma esquerda jovem atual. Uma esquerda pacífica versus uma violenta. Uma idealista e outra apenas poderosa e sanguinária. No final ficaram duas sanguinárias e monótonas.   
Mas a verdade é que inventei tanta trama e aventura épica que perdi o fôlego. Descobri só quase no final que deveria ter pensado em algo menor. Uma relação em São Paulo, de amor entre três jovens de vinte anos. Ou vinte e três.
Acredito muito nos jovens de vinte anos. Tão ou mais que nos da década de sessenta. Ufa! Terminei esta Copa do Mundo.    

domingo, 7 de agosto de 2011

De onde eu conheço este pé?


“O trabalho do ator é arrumar trabalho. Depois é diversão.” 
Morgan Freeman

 Quando eu faço um teste para ator, dependendo do trabalho, eu fico nervoso. Uma vez fiz um teste para “Romeu e Julieta”. Deram-me o papel do conde Paris que é o prometido de Julieta. Com quem a família quer que ela se case.
 Nossa como eu estudei para o teste. Convenci-me até que tinham me dado o personagem do conde Paris porque o diretor queria um grande e bonito ator, para fazer com que a união do jovem casal tornar-se ainda mais surpreendente. 
 Descobri também que em todas as adaptações do cinema e do teatro que havia assistido tinham sido diminuídas, quase excluídas, as cenas do conde Paris.
 Caramba! Como foi ruim o teste que eu fiz. Mas na época eu achei que estava certo. Eu era obstinado e muito inteligente. E este foi o problema. Eu acreditava que o pobre diretor pensava as coisas que eu pensava. Na verdade eu estava era fazendo um projeto de encenação paralelo e não sendo um garoto de vinte anos.
 As pessoas não esperam uma compreensão de Shakespeare de alguém com vinte anos. 
 Por outro lado as pessoas se esquecem que Shakespeare tinha uns vinte anos quando escreveu “Romeu e Julieta.”   
 Semana passada eu e um diretor estávamos escolhendo dentre 18 atrizes de vinte anos uma personagem para o nosso filme. É muito difícil escolher entre tantas Julietas. São tantas possibilidades e corpos e vozes e talentos. Não há a certa, e sim a escolhida.
 Mas não é para este tipo de pensamento que estamos aqui. 
 Eu a vi passando do lado de fora pela janela. Um perfil forte.
 Já no estúdio estava sentada enquanto o diretor a entrevistava. O diretor pediu que eu perguntasse alguma coisa.
 “De que diretor ou grupo de teatro você gosta?”
 Fui seco e rápido. E fiz uma pergunta fora do contexto. Afinal estamos fazendo um filme e não um espetáculo de teatro. 
 Ela se virou para o meu lado e como alguém que já viveu muito, no alto dos seus vinte anos me disse as suas preferências artísticas. Fez isso com uma confiança que pessoas de quarenta ainda não têm.
 Encarava-me não pedindo aprovação do que havia dito, nem provocando, apenas feliz por ter me dito. Por ter compartilhado. 
 E então veio a improvisação e aquele ser ria como uma criança. Um riso forte e honesto, cheio de vida.  
 Eu não sei ao certo que sentimentos eram aqueles que eu estava em relação ela. A Julieta. Digo a garota. É como se eu a conhecesse. Conhecesse de outra vida quem sabe? Quem sabe? Era como se conhecesse seus defeitos. Conhecesse suas qualidades. 
 A inteligência dela me era familiar. A velocidade precisa do que ela dizia. A falta de senso que faz todo sentido na arte. E uma paixão tranqüila.
 O pé dela me era muito familiar. O pé. Meus olhos foram para o pé dela. Me deu uma paz aqueles pés. 
 No outro dia, ela voltou. Eu não sei se ela gostou de mim. Eu sei é que ela gostou de estar lá.
 Aí eu fiquei uma semana pensando. Por que o pé? Conversei com muitas pessoas a respeito. Todas as pessoas me disseram: 
 "Ué Leo? Você ficou a fim da menina". Mas não era isso.
 O mundo é ainda mais simples do que isto.
 Daí eu entendi. Eu reconheci aquilo. Ela tem a mesma ambição. A mesma ambição artística que eu tinha.  
 Eu me vi naquela menina. Eu vi o menino que eu fui, nela.
 Um pé rebelde que não se prende. Mas ao mesmo tempo, um pé de moleca.
 Ok, ela tem também outras coisas. Uns olhos maravilhosos... E sabe-se lá o que eles enxergam. 

sexta-feira, 5 de agosto de 2011

Alguém aí, por favor, me ensine a chorar.


 Tempos atrás eu e o meu amigo Antonio fomos ver uma peça de uns amigos na Rua 13 de Maio. Um Shakespeare. Depois de termos comprado os ingressos Antonio olhou no relógio e disse:
 “Vamos até a rua para eu fumar um cigarro? Faltam ainda dez minutos”.
 Estávamos então na calçada quando ouvi um carro brecar e atropelar uma criancinha que atravessava a rua correndo de um bar num lado da rua, para uma padaria do outro lado. Foi exatamente na minha frente. 
 Era sábado e a rua estava cheia de moradores e turistas. Não lembro do sexo da criancinha. Só lembro dos parentes e amigos. Eles, ou melhor, elas gritavam e choravam e gemiam. Eu não consegui chorar e Antonio tão pouco. Fizemos uma cara de lamentação um pro outro, olhamos o relógio e fomos ver a peça.
 Claro que nenhum ator do mundo iria conseguir chegar ao grau trágico e frescor que os parentes da criancinha estavam. Mesmo assim eu gostei de ter visto Shakespeare.
 Hoje no parque do Ibirapuera escutei um som, gemidos e uma espécie de choro misturado com latido. Várias pessoas em volta de um cachorro, um Pastor Alemão que segurava um outro pequeno, bem pequeno cachorro pela boca.
 O Pastor Alemão ia trucidando o cachorrinho e ninguém conseguia o fazer parar. Éramos uns vinte humanos testemunhando um assassinato. Um cachorro matando outro.
 Acho que foi a primeira vez que eu vi alguém matando com a intenção de matar. No caso o alguém era um cachorro.
 Virei o olho e as vi. Duas meninas de uns 20 anos. Elas choravam como duas cachoeiras. O corpo, a respiração delas, tudo estava livre para o choro. Nenhum canal estava impedido. Um estilo, uma força, uma naturalidade.
 Eu nunca vou saber chorar assim. Nunca. Não sei se não aprendi ou desaprendi.
 Homem não chora. Nós temos vergonha de chorar? Não sei. Temos. Temos sim. Homem não chora. É o que elas sempre dizem da gente. 
 Ver aquelas duas meninas chorando me deu um prazer enorme. Não tenho a mínima idéia do por que.
 Não sei se foi a de ver uma humanidade tão forte nas duas?
 De ver talvez duas meninas de 20, parecidas com muitas outras meninas de vinte, que já me fizeram sofrer. Só que agora sofrendo elas mesmas?
 Alguém aí me ensine a chorar pelo amor de Deus!
 Por que depois de presenciar um cachorro ser morto de maneira tão bárbara eu ainda consigo jantar um filé?
 De me sentir bem, porque a criança atropelada não era meu parente. Não fui eu quem atropelou.
 O cachorro que morreu não era meu. Não era eu.
 E me deu uma pena do Pastor Alemão. A carinha dele. Ele não tinha a mínima idéia do que havia cometido. Uma cara meiga.
 E o choro das meninas completamente tomadas pela emoção, com nenhuma razão. Será que é assim? O homem só perde a razão para agredir e a mulher só perde a razão quando é testemunha ou vítima de agressão?
 Eu nunca vi meninos chorarem daquele jeito. E nunca vou ver. Já vi meninos num conflito entre não posso chorar e preciso chorar. Não posso e preciso. Não posso e preciso.
 E quando choramos é escondido de nós mesmos. Que inveja daquelas meninas. 
 Se cachorro chora, mulher chora, por que eu nunca aprendi? Que inveja daquelas duas meninas. Nasceram com um talento que eu nunca vou ter. Nasceram mulheres.  
  

quinta-feira, 4 de agosto de 2011

23 Capítulo VIII


O leitor deve ler os capítulos I, II, III, IV, V, VI e VII, postados anteriormente, antes de prosseguir pelo VIII. Grato.
  
 João Synge era um homem nos seus setenta anos. Mas ainda era forte e enérgico. Quando percebeu que os agentes já não mais se ocupavam de Marcel, ele se aproximou do engenheiro que o prontamente o seguiu.
 Há cinco anos João era o presidente da Petrobrás. A plataforma X fora um projeto dele que começara já com o presidente da republica anterior. 
 Era uma tecnologia de extração de óleo no pré-sal que nunca fora concebida antes na história. Por isso a espionagem não era só entre países, mas também industrial. E enorme.
 Os dispositivos de segurança eram grandes. Ricardo Larkin era anunciado como o grande engenheiro e criador da plataforma X. Porém a verdade é que Marcel era o responsável. Marcel era o verdadeiro nome que era mantido em sigilo. Claro que Ricardo tinha uma posição de destaque, era braço direito de Marcel.
Ricardo expôs os códigos secretos para Mariana. Não que ele tivesse percebido quando ela se apoderou do seu computador em uma das noites de luxúria em seu apartamento. O que Mariana não sabia é que aqueles códigos de segurança poderiam ser facilmente quebrados por outras senhas que na verdade Ricardo Larkin não conhecia.
 Por isso o único homem capaz de deter esta tragédia nuclear e de vazamento de óleo era Marcel.
 João o levou para um dos portões do estádio. Depois seguiram a pé entre a multidão em direção a um pequeno carro, onde um motorista a paisana os aguardava.
 Camila pode ouvir pelo rádio que ela fora responsabilizada, pela agora morte do comandante Alfredo Ferraz. A mensagem dizia para todas as unidades atirarem pra matar. Ao mesmo tempo ela telefonava para casa, enquanto acelerava o carro e passava os sinais vermelhos:
 “Alo Gordo! Segura a picanha que eu hoje vou demorar mais do que eu imaginei. Fala para as crianças dormirem e não me esperarem. E outra coisa... Gordo eu não sei quando foi à última vez que eu te disse, mas... Eu te amo!”
 Gordo desligou o telefone. Sabia que aquilo não podia ser coisa boa. Ele já estava ligado na televisão e sabia do desaparecimento dos jogadores doa seleção americana. Aliás, o assunto era acompanhado por todo o mundo. E se o planeta já para quando na final de uma Copa, imagine quando a final é da maior potencia com a maior nação futebolística. E quando dois jogadores misteriosamente evaporaram. 
 A audiência mundial subiu cinqüenta por cento. Os presidentes e assessores pareciam se estranhar no estádio. Esta pressão fez com que a presidente desse a ordem para dois caças bombardearem a plataforma X.
 Felipe mandou que Torres descesse no gramado do Maracanã. Os agentes informaram Mariana que já estava no estádio que o helicóptero se aproximava.
 “Mandem os atiradores para o gramado, se eles tentarem descer atirem no helicóptero!”
 Cerca de quarenta agentes e policiais foram para o gramado. Era como um show para a já grande platéia que estava presente no Maracanã.
 Longe dali no estacionamento, João reconheceu o carro, mas quando chegou bem perto viu que não era o conhecido motorista e sim um desconhecido no banco do motorista. Não teve dúvida tirou sua arma, mas foi alvejado antes que pudesse atirar. Pedro e dez homens os tinham surpreendido. Preparavam-se para agarrar Marcel, quando ouviram um carro arrebentar a entrada de veículos e vir atirando.
 Camila deu um cavalo de pau e quase tocou Marcel com o carro, sempre atirando. Abriu a porta e ordenou:
 “Entre! Eu sou a verdadeira polícia!”
 Ele ao ouvir os tiros vindo de um lado, e aquela baixinha louca, mas mulher do outro, só teve tempo de pular para dentro. Camila acelerou para cima dos agentes e fugiu do estacionamento. Seguiram pelo bairro da Tijuca e poucos minutos deixavam o Maracanã para trás.
 “Ele fugiu, o tal engenheiro Marcel. A Camila o resgatou.” Informou Pedro para Mariana.
 “Não se preocupe acabei de falar com o Venezuelano e vão colocá-lo no caça. A presidente deu a ordem”. Respondeu Mariana.
 “Então qual é o próximo passo?”
 “Solte os americanos e fuja do estádio o mais rápido possível!”
 Quando o piloto do helicóptero viu que os homens atiravam lá de baixo, levantou. Já em boa altura um outro helicóptero surgiu e junto com ele, tiros. Felipe começou a atirar de volta respondendo aos disparos. Pediu para Letícia e Lucas atirarem.
 Os dois jovens claro se negaram. Então não teve jeito passou a arma para Torres que assustado com tanto fogo amigo passou a atirar também contra a outra aeronave. Uma perseguição começou no céu. 
 Felipe pode ouvir o celular tocar.
 “Rulfo é Camila, a encomenda está comigo. Onde está você?”
 “Olhe para cima.” Ele brincou.
 Do Maracanã o piloto tentou fugir para a zona sul. O helicóptero recebeu vários tiros e começou a perder altitude já perto de Copacabana.
 “Alguém quer pegar uma praia?” Perguntou piloto, numa tentativa de acalmar o desespero. 
 Felipe avisou Camila para ela ir para Copacabana com a, encomenda, que era o engenheiro Marcel.
 Rulfo teve receio de estar sendo ouvido, mas que outro jeito ele teria. Mariana queria agora pegar Marcel de qualquer maneira. Era o que ele achava. Eles não sabiam que o plano dela estava indo totalmente de acordo e Marcel estar livre ou não tanto fazia.  
 Camila já na Avenida Atlântica com duas viaturas a perseguindo, viu o helicóptero aterrissar na praia.
 A Presidente do Brasil reunida com o ministro de defesa deu a ultima palavra. Desta maneira o óleo iria vazar, mas a usina de Angra estaria salva.
 “Ministro os faça decolarem, mas só eu darei a ordem de fogo. Antes eu quero a plataforma evacuada e a cidade de Angra dos Reis também. Não quero um civil morto ou ferido”.
 Na base da aeronáutica, um dos pilotos já estava morto pelos agentes criminosos a serviço de Mariana. Juares um piloto das forças Venezuelanas pegou o seu lugar e roupas. Já com capacete, ele entrou num caça Brasileiro e decolou antes do outro piloto. Desta vez Rubens Figueiredo, um legítimo e honesto piloto militar Brasileiro.  
 Juares tinha ordens claras. Seu alvo não era a plataforma X e sim outro lugar. Outro lugar com milhares de civis. O estádio do Maracanã. 
  


quarta-feira, 3 de agosto de 2011

23 Capítulo VII


 O leitor deve ler os capítulos I, II, III, IV, V e VI antes de prosseguir pelo VII. Grato.

 Felipe começou uma relação amorosa com o casal Letícia e Lucas. Tanto que em dois meses se mudou para a casa deles. Isso não quer dizer que ele soubesse de tudo que se passava na ONG  clube 23.
 O jovem casal não gostava que Felipe entrasse no escritório que ficava numa edícula da casa. E ele todos os dias saía para o seu disfarce, o escritório de paisagismo.
 A casa tinha uma atividade social intensa. Era sempre Letícia quem cozinhava. Um cardápio vegan. Uma cozinheira assistente foi contratada para ajudar nos jantares. Felipe descobriu que tanto a família de Letícia quanto a de Lucas eram bem abastadas, logo os recursos eram enormes.
  Vivia-se com todo o conforto na casa. Os móveis de designes famosos, geralmente peças contemporâneas de madeiras eram simples, porém caros. O ambiente não raras vezes destoava do comportamento e atitudes dos freqüentadores.
 Enquanto os dois viviam como burgueses, discutiam a revolução com os convidados e associados. Nestes jantares apesar deles gastarem muito, acabavam por arrecadar muitas doações de jovens também preocupados em salvar o planeta. Jovens tão ou mais ricos do que eles.
 Ninguém recusava o convite. E logo os salões da casa Vegan ficaram concorridos pela cidade. Artistas, publicitários, empresários e toda a fauna de modernos e alternativos eram recebidos por lá. Até presença esportistas sofisticados. Como os jogadores juniores do São Paulo futebol clube, Thomas e Mark.
 Felipe, ou Rodrigo como era agora conhecido, chegou a ficar com ciúmes da atenção que Letícia dava a Mark. Mas ele mesmo nunca presenciou nada. Nenhuma infidelidade nem de Lucas e nem de Letícia.
 Era como se para eles os três bastassem. Um dia eles confessaram a Felipe o significado de vinte e três.
 O numero dois significava o bissexualismo e o três a vida a três. Este era o comportamento transgressivo dos dois. A revolução da nova geração. Por isso eles Lucas e Letícia não se consideravam burgueses. Eles tinham uma vida diferente. E Felipe era o numero três deste estilo de vida. Felipe participou de algumas ações. Uma contra o consulado da China. Outra onde ele, Lucas e Letícia ficaram pelados e o corpo coberto por tinta. Um de cada cor. Azul, amarelo e verde. As cores unidas. Um trocadilho com o slogan da marca de roupas que destratava os animais. A imprensa os fotografou assim parados na porta de uma boutique da marca nos jardins. 
 Eles ensinaram Felipe a usar a tinta vermelha para fingir sangue.
 Meses se passaram e Letícia falou do seu desejo de engravidar. Ela queria uma família a quatro.
 Verdade é que Felipe avançava pouco. Suas descobertas eram quase todas sobre os eventos sociais. E doações legais. Ele não conseguia fazer a ligação disso com Pablo, ou outros membros da juventude esquerdista da América Latina. Lucas e Letícia participavam de fóruns mundiais sociais e liam revistas esquerdistas, porem pareciam pessoas politizadas de maneira pacífica. Inclusive eram ambos contra armas de fogo e qualquer tipo de armas.
 Felipe tomava café num lugar movimentado da região da Avenida Berrini. Esperava por Mariana. Um homem de uns trinta anos entra no lugar. Felipe o percebe se aproximando. Felipe já há meses não usava uma arma. Nunca seria aceito na casa Vegan com uma.
 O homem saca um documento e joga na mesa. Com calma se senta:
 “Eu vou deixar as minhas duas mãos em cima da mesa.”
 Felipe se acalma ao perceber que o homem era também da polícia federal.
 “Afinal quem é você?”
 “Felipe meu nome é Antonio Sampaio. Ouça-me com atenção.”
 Antonio disse a Felipe que o conteúdo da conversa não poderia ser revelado a ninguém. Felipe ouvia enquanto Antonia dizia que membros da operação, “verde que te quero verde”, estavam ligados a ONG clube 23.
 Felipe achou aquilo tudo um absurdo e disse a Antonio que iria comunicar isto aos seus superiores imediatamente. 
 "Não você não vai."
 Como eu não vou? Pensou Felipe. Afinal o que era aquilo? 
 "Depois do que eu te mostrar, eu garanto que você vai trabalhar para o meu lado. O lado da polícia." 
 Ele só se acalmou quando Antonio retirou uma das mãos da mesa e deu para Felipe um envelope.
 Felipe abriu o envelope e quase perdeu os sentidos. Eram fotos de Lucas e Letícia em vários lugares com uma bela mulher mais velha. Em restaurantes, parques, e até na praia. Eles beijavam-se e pareciam estar se divertindo muito. Parecia o verdadeiro trio 23.
 O que deixou Felipe desesperado é que ele também já tinha sido amante desta mesma mulher. Ela era Mariana a sua superiora. A chefa da operação “verde que te quero verde.”