Ele já havia dado três mordidas. Era nítido que
algo estava errado naquele sanduíche de salmão defumado, queijo estepe, alfaces
americanas, cream-cheese e pepinos em conservas.
Mas claro!
Este amargor com cara de estragado é o pepino. Retirou a tampa de baguete com gergelim.
Só podia ser. Lá estavam eles bem pequenininhos, apanhou um bocado e colocou na
boca.
Estavam moles e ruins. Mas como ter certeza de
que o gosto não era aquele mesmo? Mandar trocar poderia ser uma injustiça. Afinal
era um lugar elegante, charmoso e bem frequentado e pasmem havia gordinhas
trabalhando lá.
Em
qual lugar da moda se veem gordinhas no salão? Exposição de fotos, cardápio inventivo,
preços razoáveis? E fazer uma deselegância dessas? Trocar o prato?
Ele
tentou bem sutilmente.
“Nossos
pepinos em conserva são preparados em sei lá o que. Depois colocados sei lá
onde. De maneira que você pode estranhar, mas o gosto é refinado e é este mesmo”.
Bem
sutilmente não tinha funcionado. Aquele maitre se retirou e deu o caso por
encerrado.
Logo
ele não teve alternativa a não ser radicalizar. Agora ele queria vingança pela
falta de delicadeza do maitre. Levantou-se para espanto das gordinhas e dos
clientes e perguntou em alto em bom tom:
“Pago
aqui ou no caixa?”
Desta
vez o maitre voltou falando mansamente, ofereceu trocar pelo o que ele
quisesse.
Situação acalmada veio um clássico misto
quente. O novo sanduiche não tinha nada de estranho, gosto de misto quente.
Dois
dias depois, ele volta, no mesmo horário de almoço novamente sozinho.
“Um
misto quente e um... Este suco aqui de limão, maçã, hortelã, gengibre, sem açúcar.”
O suco
chegou antes do misto, um líquido verde aguado, o suco tinha sido
demasiadamente batido e coado. Ficando só algo que lembrava uma água suja de
chuva.
Tomou
um pouquinho, ele não gostava de jogar nada fora, ter jogado um salmão fora,
dias antes já o tinha feito sofrer de remorso.
“Um guaraná
zero com gelo e laranja, por favor”.
Acabou
que tomou o suco, comeu o misto, tomou o guaraná, comeu um pedaço de bolo e
tomou um cafezinho. Na conta esqueceram de acrescentar o guaraná.
E
agora? Será que ele ficava quieto e não pagava o guaraná? O que era um
guaranazinho afinal? Nisso tomou outro gole e ainda ouviu uma gordinha
garçonete dizer para um cliente ao lado:
“Antes
era com o pepino em conserva, mas reclamaram tanto que mudamos.”
E o cliente
da mesa ao lado:
“Mas eu sonhei com este sanduiche com pepinos
em conserva! Não tem mesmo como fazer? Era algo tão original.”
“Sinto
muito senhor”. Disse a gordinha e abaixou a cabeça.
Foi
quando ele se deu conta que todos os seus atos, por mais simples e cotidianos
tinham reflexos na vida de outras pessoas, inclusive de pessoas que ele não
conhecia.
Conclui que pagar aquele guaraná era algo de
mais valor do que real preço em si.
“Faltou
um guaraná.”
O maitre
disse que não. Que ficava pelo transtorno que ele sofrera na ultima visita.
Então
ele deixou 20 por cento de serviço e seguiu para o escritório.
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