segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Capítulo 10- Os irmãos Chavez

Barroco




Se me perguntassem por que os cabelos de Gabriela Chavez, loiros eram tão bonitos, eu não saberia dizer. Esses pêlos eram diferentes e o jeito que ela gingava ao andar e o barulho de sua respiração que podia ser ouvida por Cris em uma noite tão quieta e que nós sabemos também tão agitada. Às vezes tenho a sensação de que os opostos realmente se atraem como diz o ditado, que erroneamente é creditado aos amantes. Mas o pequeno segue o grande, o comprido só o é na presença do curto. Noite segue o dia, e o dia a noite, a vigília segue o sono e o sono a vigília. E a vida segue a morte.

Mas o preto virará branco e o branco virará preto, e o tempo passa e o tempo passa e o jovem torna-se velho e o velho, criança. O barroco, antigo e o rock, moderno.

— Eles desistiram, todo mundo desistiu, Gabriela! Não tem mais banda, eu acho ótimo. Sabe por quê? Eu quero aprender flauta barroca.

 E a menina resolveu se sentar em um pequeno muro onde Cris colocou o pé e deu um gole na cerveja, olhou para cima e viram estrelas, as mesmas que estavam lá desde o século XVII. Depois viu a cruz na torre da catedral, essa que já foi testemunha de muitos beijos naquela praça que dava para o mar, onde a uns cinqüenta metros existia um píer de onde os marinheiros viriam para buscá-los e conduzi-los de volta à ilha dos Chavez.

— Você está me dizendo que quer mudar de estilo musical, Cris? Por que a galerinha não quer mais tocar?

— A gente tem que ser algo na vida, não tem?

— Mas o começo é sempre difícil!

— Não estou falando só disso.

 Cris se irritou, mas Gabi permanecia ali, linda, com os joelhos indo e voltando, batendo-se, ora abriam-se. A boquinha aberta e os olhinhos encarando, mas com a testinha apontada. Apesar de Cris ser seu irmão... Bem, uma saia, uma garota bebendo cerveja, o barulho do mar, as estrelas, a igreja, o vento, que eram espíritos boêmios que passavam e subiam, e os irmãos.

— Gabi, eu quero ser amado!

— Eu te amo, Cris!

— E eu estou cansando.

— Cris, nós não fomos os primeiros nem os últimos a... Fazer... A literatura está cheia disto. Um monte de gente é que nem eu e você, mas ninguém fica sabendo. E esse é o jeito que eu te amo e é sincero. Vem cá!

 Gabriela tentava explicar a Cris enquanto ao mesmo tempo lhe fazia um cafuné, que não era a intensidade do amor dela, que era pouca,  o problema real é que Cris quer outra coisa.

— Concordo carinha, eu não te conheci num bar. Nós não temos um roteiro juntos. Você não me viu atravessando a rua e se apaixonou. Qual é? Eu nunca vou te perder. A gente vai se amar sempre! Então qual é o grilo? Você não é careta, eu menos ainda. Só que o que pega é que eu conheço cada pedacinho seu essa mãozinha, esse narizinho, essa boca que eu adoro beijar, esse cabelo!

 Gabriela tentou mudar de assunto e passava os dedos pelos cabelos de Cris. De repente ele se levantou e foi embora para dentro da escuridão da noite. Ela não foi atrás dele porque era óbvio que ele voltaria. Talvez só tivesse ido fazer xixi. Nunca que ele a deixaria ali sozinha, a sua irmãzinha amada.

 O vento aumentou e as nuvens fecharam-se de novo. Gabriela ouviu um barulho ao longe e começou a chorar. “Cris não faria isso comigo, Duda sim, mas não meu doce irmão”. E agora aquela praça que parecia tão calma tornara-se sinistra. Um terror. A caçula dos Chavez se lembrou da história do estuprador de Paraty, a qual os empregados da ilha vinham contando.

 Do outro lado da praça, Gabriela viu a silhueta de um homem. Na verdade era o Puritano que se adiantara do grupo para alcançar Cris e Gabriela e por sorte talvez pegá-la sozinha e declarar o seu amor, pois já estava desesperado. A praça ficou escura; por causa da tempestade a luz acabara no centro histórico todo, por isso quando o Puritano foi em sua direção, Gabriela fugiu. Correu pela escuridão. Já estava cansada e não sabia mais para onde ir. Olhava para trás, mas não tinha certeza se alguém ainda a seguia. Foi quando ouviu uma voz conhecida, parou e reconheceu aquele menino. Sentiu-se salva, porém o menino não sorriu e tinha alguma coisa na mão. Uma faca talvez?

— Tem alguém caído ali! — Duda avistara um contorno na rua deserta, que poderia ser de uma pessoa caída, como também um tronco de árvore trazido pela chuva que agora diminuía de intensidade. Mas era ela e os três altos irmãos pegaram-na e ajudaram-na a levantar.

Gabriela tinha sangue nas roupas, mas nenhum corte. Ela estava desmaiada e acordou assim que os irmãos a levantaram. O dia amanhecia. E uma chuva agora caia.

 Nosso detetive Rubens foi o primeiro a ver os quatro Chavez, molhados, chegando a uma padaria do centro histórico. Carla, Pedro Paulo e o resto das pessoas admirarem-se com aquela cena dos quatro esgotados e o sol nascendo.

 Entraram no barco e partiram em direção à ilha no que seria um dia de céu azul e quente. Ninguém se lembrou do casal de Puritanos, que também como Gabriela se perdera durante a tempestade.

 Gabriela não contou a ninguém sobre o menino. Quando Carla disse achar ter visto Caio no centro, ela se fingiu de esgotada e fez que nem ouviu. E o barco seguia em direção a ilha, ela adormeceu, mas Cris pode ouvi-la ainda dizer: ---Ícaro.

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