segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Capítulo 12- Os irmãos Chavez

Aventura


 De dia o local é um sacolão e à noite se transforma em um enorme e interessante restaurante japonês que mais lembra o bairro da Liberdade e o Mercado Municipal, misturados à essência boemia da Vila Madalena.

Rubens e Beto foram para o tudo ou nada.

— Você não faz PUC? — perguntou Beto, e como ele nem sabia direito para qual das três se dirigir, as três não souberam tão pouco para quem era a pergunta.

— Eu faço.

Foi o que respondeu a terceira.

— Então é de lá.

— De lá o que?

As três que antes fizeram cara feia por serem interrompidas no papo onde resolveriam o que fariam no próximo feriado, agora depois do “então é de lá”, tiveram crise de risos, o que as deixou muito antipáticas.

Os dois deram sorte, pois a mais feinha das três consentiu que os dois sentassem. Logo o trio e a dupla tornou-se uma agradável mesa de cinco.

Beto disparou a falar. Rubens estava um tanto inseguro e constrangido, só observando calado. Beto quis saber o que elas faziam, mas antes que as meninas entre goles de saquê respondessem, ele já declarou em bom tom que o amigo era sociólogo da USP, veja bem: USP, com maiúscula. As três se impressionaram com o tímido. Talvez ele realmente fosse um intelectual e as estava desprezando, quem sabe?

Na empolgação Beto não escondeu seu entusiasmo por Freud e soltou:

— Já leram o mal estar na civilização? Novamente Beto errou feio. As três eram estudantes de psico e o que alguém acharia pedante e cômico como Rubens achou, para elas soou ofensivo. Como se ele estivesse brincando com algo sagrado sem ritual ou iniciação. Bola fora! Tudo bem, fora uma vitória, ao menos conseguiram sentar-se à mesa das três.

Rubens percebeu que o amigo ia afundar e tentou impedir o nocaute.

— Vocês estavam combinando o feriado? Faz um ano nesse feriado que eu e o Beto preparamos uma super festa com vinho, fondue, queijos. Foi à gente mesmo que fez. Convidamos uma turminha e várias gatas. O resultado do investimento foi que as gatas levaram os cachorros e nós dois sobramos tomando vinho e vendo os outros se beijarem.

As três agora se arrependiam muito de tê-los chamado para a mesma mesa. Não há mal nenhum em bater papo sem compromisso, porém as estudantes de psico não se entusiasmavam com o drama dos dois perdedores. Mas qual não foi o espanto dos cinco ao ouvirem:

— Rubens! Venha sentar com a gente.

Era com certeza a menina mais linda que elas já haviam visto. Seu nome? Gabriela Chavez. Lógico!

Neste momento a cotação dos dois subiu a mil por cento e as três psico, quer dizer, estudantes, permaneciam com os queixos caídos.

Beto mal pode crer que não era sonho. De uma mesa com três meras desconhecidas e sem importância fora agora sentar-se com a famosa Gabriela Chavez, a gata mais cobiçada de São Paulo.

Quando o amigo lhe contou que havia estado na ilha dos Chavez, ele desconfiou, porém sentia orgulho de Rubens e se esbaldava em ver as três psico tentando disfarçar a curiosidade do que agora rolava ali naquela mesa de celebridades formadas por Flavinha, Pedro Paulo, a Chavez e Rubens.

Enquanto Pedro Paulo expunha seus comentários sobre o lugar, Rubens se indagava onde estariam Carla e Ícaro.

— São tempos de esquerda, esses nossos. Este lugar é a própria tradução do militantismo descolado paulistano. Que apesar de não me fascinar tanto, posso dizer que é realmente um ambiente genuinamente latino-americano.

— Como assim? Desenvolva. — Pediu Beto.

— Ora, até os lugares ditos GLS são colonizados. Ainda não se firmou a figura do bissexual latino-americano. Hoje os gays têm hábitos nórdicos.

— Talvez exista uma necessidade de a comunidade gay mundial ser uma unidade e tornar a minoria mais forte. — Foi o que Gabriela disse.

— Onde está Ícaro? — Perguntou Rubens à Gabi.

— Saiu com a gelara do circo.

---E a Carla, onde foi?

Rubens percebeu que algo não cheirava bem e por isso desviou o assunto.

Despediam-se os cinco e Gabriela disse a Pedro Paulo que levaria Flavinha em casa. Beto assustou-se quando num surto, ao caminharem em direção ao carro Rubens lhe pedisse que fosse rápido. Deram três reais ao guardador de carro.

— Vai logo, vamos segui-la.

— Quem?

— Gabriela Chavez.

— Por quê?

— No caminho eu te falo. Olha lá o valet entregando a Cherokee preta e elas entrando. Vai!

Rubens estranhou a calma de Gabriela em relação ao seu namorado sumir e a sua melhor amiga também. Percebeu que Gabriela recebera uma ligação e quando Flavinha e Pedro Paulo que viram a amiga sorrir e falar baixinho, indagaram-na de quem era e ela disse: “Meu irmão”, sem explicar qual deles. O nosso detetive pensou: “tem coisa errada aí”. Fora Gabriela quem pedira a conta e estava ansiosa para quem disse que iria dormir. Não dizer o que levou Rubens a essa excitação; se realmente a curiosidade de saber o que uma deusa como Gabriela apronta por aí, o que aliás milhões de seres têm, vide os paparazzi, ou a relação que talvez isso tivesse com a sua amada Carla.

Gabriela deixou Flavinha em sua casa, naquele prédio na Cidade Jardim onde teve a festa de Flavinha no início da história, o primeiro beijo de Ícaro e coisa e tal. Seguiu pela Augusta e o carro sempre atrás da Cherokee.

— Tem certeza que ela não virou na Brasil?

— Absoluta!

Os dois estranharam muito que Gabriela permanecesse na Rua Augusta. Então, quando ela cruzou a Paulista os dois se deliciaram. “Vamos realmente ter aventura hoje à noite”, foi o quem pensaram.

A Cherokee passou pelo Anhangabaú, contornou a Praça da Sé e foi estacionar em um banco financeiro no largo de São Bento.

Eu sei leitor, que não é horário comercial, logo, o que ela estaria fazendo lá? É que agora é costume fazer festas no centro de São Paulo. Os dois pararam na própria rua. A música que vinha de um pequeno prédio de cinco andares no calçadão era animada. A Chavez misturou-se com um grupo que estava chegando e subiu as escadas com outras meninas que se vestiam no estilo dito “retro”.

O prédio com certeza era da década de quarenta e possuía um elevador desses de grade que se fecha manualmente.

Permaneceram em um local mais escuro observando a Chavez que dançava com alguns meninos. Ela dirigiu-se até a outra extremidade do andar onde havia um bar com as antigas enormes janelas abertas para o centro da metrópole e as estrelas. Enquanto pegavam cervejas Gabriela passou bem perto deles muito apressada, mas por sorte não os viu. Correram para o carro e puderam ver a Cherokee saindo. Dessa vez não era Gabriela que dirigia e sim um homem com um gorrinho azul.

A Cherokee deu muitas voltas até parar em um posto de gasolina com loja de conveniência vinte e quatro horas. Os dois desligaram o farol e estacionaram o carro na outra extremidade do posto fingindo verificar os pneus. Gabriela permaneceu no carro e a pessoa que dirigia desceu para comprar cigarros, agora sem o gorro; era um menino muito bonito, de cabelos loiros lisos e brilhantes.

Foi tudo muito rápido e quando Giovanni e Gabriela iam saindo Rubens e Beto... Sim, leitor, com certeza era Giovanni.

Rubens ia fechar a porta do carro, mas sentiu uma mão em seu ombro e viu um homem com olhos sofridos fingindo sorrir:

— Você por aqui, Rubens?

Pronto, não dava mais tempo. A Cherokee sumira e os dois detetives foram tomar uma cerveja com Guilherme Chavez na loja de conveniência. Nenhum dos três mencionou a Cherokee e seus ocupantes e eles fingiram ser apenas uma coincidência. Um encontro casual nessa enorme cidade. E foi só conversa jogada fora. Depois de se despedirem, Beto, que conduzia o amigo para casa, não dormiu aquela noite depois do nosso detetive lhe revelar o escândalo da irmã ser amante do namorado do irmão.

Para Beto que nunca teve amante e único risco sexual que já tivera fora o de ir à Love Story, aquela informação equivaleu à ida do homem à lua ou ao início da terceira guerra mundial.

Na cama, olhando para o teto ele se lamentava: “Por que não acontece nada na minha vida?” E Rubens que a todo instante era acordado pelo telefone, desistiu de atender na terceira vez:

— Não acredito! Dizia Beto do outro lado. — Não acredito!

— Pois então creia. Como diz o filósofo francês, aposte que é verdade, que existe, porque se apostar que não existe, existe mesmo de qualquer jeito. Boa noite... Quer dizer.

Rubens vê a rua iluminada através da janela.

--- Bom dia! E desliga.

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