domingo, 26 de dezembro de 2010

Você não queria se esconder... Capítulo 4 e final.

 ATO 2


PRIMEIRO QUADRO: (Paris, apartamento de Fred, um militante político. Campainha toca).

FRED- (Entrando em cena vai abrir a porta). Quem é que está aí?

ALE- É a Gestapo! Abra logo! (Fred sorri e vai abrir a porta, entra Juliana, agora Alexandra). Fred!

FRED- Você? Ale? (Os dois ficam se olhando).

ALE- Eu mesma, Alexandra. (Juliana está mudada, ficou madura e muito mais segura). Quanto tempo amigo.

FRED- Quando foi que você chegou em Paris?

ALE- Agora à noite, acabei de chegar.

FRED- Então é verdade! Ale... (Ele a abraça, depois de um tempo ela também o abraça, ele pega a mala dela e coloca para dentro). Você veio direto para cá?

ALE- O trem veio de Praga, foi uma burocracia para sair de lá. Daquele país.

FRED- Me disseram que você estava no México.

ALE- (Que se senta). México depois Havana, depois Praga e agora, Paris! (Suspira).

FRED- (Também se senta). Eu soube do que aconteceu. Amiga, eu fiquei...

ALE- Soube?

FRED- (Escolhendo as palavras). Ale que bom que você escapou.

ALE- (Mudando de assunto). E você Fred, escrevendo? Têm notícias do Brasil?

FRED- Arrumei um emprego num jornal Francês . Ale estou escrevendo em Francês , você acredita?

ALE- Um jornal de esquerda?

FRED- Não. Quer dizer... Um jornal ético. Se é esta a palavra. Mas me dão total liberdade. Ale, por que você não me escreveu dizendo que vinha? Eu teria arrumado as coisas. Você está com fome? Quero saber de tudo, por favor, me conte. Oh Ale! Nem acredito Alexandra a guerrilheira mais linda que existe, bem aqui no meu apartamento. (Olha para cima, e fala para o céu). E eu heim, que não acredito em você? Que loteria, ah, que dia feliz!

ALE- Não se preocupe, eu vim dar um alo. Vou arrumar um lugar para ficar. Um hotel, república sei lá.

FRED- De jeito nenhum. (Que faz uma cara de apaixonado). Você vai ficar aqui comigo, o apartamento é suficiente para os dois. (Olhando Ale e mudando de assunto). Como você está mudada.

ALE- Mas você está sozinho, digo... Você entendeu né Fred?

FRED- (Ainda abobado). Ale como você está realmente diferente.

ALE- É Fred o tempo passa, to meio sofrida. Você sabe. (Ela abaixa os olhos).

FRED- Não é isso, nunca te vi tão linda. (Ale ri). Quanto tempo você pretende ficar em Paris?

ALE- (Séria) O suficiente para resolver uma questão.

FRED- Questão?

ALE- (Sorri) Já está me mandando embora?

FRED- (Ainda feliz). Por mim, você pode ficar aqui até o dia em que voltarmos para o Brasil.

ALE- E quando será este dia? Paris é tão linda.

FRED- Pena que é tão tarde, mas se você não estiver cansada podemos sair, agora mesmo. Você viu o Sena? Ale...

ALE- Amanhã Fred. Amanhã. Agora o que eu preciso é dormir. Estou quebrada.

FRED- Aceita um conhaque?

ALE- Nossa! Finalmente, pensei que você não iria me oferecer nada. (Fred pega a garrafa e serve duas doses, os dois bebem). Fred, Fred, Fred. Você não sabe o que passei desde de a última vez que nos vimos. (Bebe).

FRED- Foi tudo tão rápido, Ale. Faz quase um ano que eu estou tentando te contatar. Tudo ficou tão mal resolvido.

ALE- Eu não estava bem para falar com ninguém.

FRED- Eu entendo.

ALE- (Séria encarando Fred). Entende?

FRED- Hei calma sou eu, o Fred.

ALE- Desculpe. Fred eu senti muito a sua falta. (Levanta e abraça Fred). Mas você acabou não me respondendo, Fred. Você o rei do deboche, o jornalista mais perseguido da república das bananas, continua sozinho?

FRED- Eu estou importante assim? O jornalista mais perseguido da república das bananas. Alias quando é que você Ale, começou a ler meus artigos? Ou você só repete o que ouve?

ALE- Não seja bobo, sou uma fã. Mas não fuja. Ta sozinho?

FRED- É claro que eu estou sozinho. (Se levanta e coloca um disco na vitrola). Vem cá dançar.

ALE- Estou morta de cansaço, você não faz idéia, do que é a burocracia, de vir de trem de Praga. Não faz idéia. (Se espreguiça).

FRED- Ah, que é isso? Lembra como costumávamos dançar? Eu e você?

ALE- Nossa que coisa burguesa! (Os dois dançam alguma música ao mesmo tempo pop, ao mesmo tempo um clássico hoje em dia, ambos muito felizes).

FRED- Vou te levar ver os vitrais de Notre-Dame.

ALE- Ah! Paris,cidade luz. Fred me diz por que é que você veio para Paris? Por causa da nouvelle vague? (A música continua hora eles dação, hora eles param).

FRED- Vim por causa da comida, da cozinha francesa.

ALE- Logo se vê que você emagreceu. (Ale ri. Fred chega mais perto os dois se olham e se beijam).

FRED- Aquele dia, como eu sonhei com aquele dia. Você era tão menina, nunca achei que você iria me notar... (Ale beija Fred novamente). Mas foi só uma noite. Depois veio tudo aquilo, mas agora estamos aqui em Paris.

ALE- Talvez eu tenha ficado grávida naquele dia.

FRED- Grávida? Conte-me tudo Ale. Se você quiser estou todo a ouvidos. (Abaixa o som).

ALE- (Aumenta o som novamente, e dança). Amanhã, Fred. Hoje eu não quero falar de passado, só de presente, hoje é hoje. Amanhã falaremos de hoje e de ontem.  (A luz vai descendo devagar). 


SEGUNDO QUADRO : (Mesmo apartamento, manhã seguinte, Fred lê sentado, entra Alexandra).

FRED- (Ao ver Ale, para de ler). Oi! eu não quis te acordar. (Ale está com uma cara séria de melancolia, seus movimentos são blasé). E aí. Vamos dar uma volta? Louvre, Jardim de Luxemburgo? (Se levanta). Ah, eu fiz café para você. Comprei uns croissants. (Ale se senta). E então?

ALE- Fred senta aqui. (Fred se senta). Eu estou bem. Fred... Tem tantas coisas que eu queria saber, queria te perguntar.

FRED- Já entendi. (Alexandra faz uma cara de quem esta esperando uma estória) Vamos lá. Eu tava saindo do jornal, indo pra casa, já era noite. Talvez fosse encontrar uns amigos num bar eu nem lembro. Um carro parou. No começo... (ele para) No começo achei que era imaginação minha, mas não.  Eles me colocaram dentro e me levaram para interrogatório. Era um dia quente. Depois foi uma longa noite, eu não sabia se era noite ou dia era uma sala fechada, ficou frio, passou sei lá quanto tempo. É isso.  Libertaram-me, negociaram minha troca e aqui estou. (Ri). Terei de viver com isso para sempre. Mas aqui na França têm tantos como eu que apanharam na guerra. A diferença é que eles derrotaram o inimigo.

ALE- Eu estava grávida.

FRED- Eu não sabia.

ALE-Talvez você fosse o pai. Fred, eu sempre te achei um cara sensacional, mas eu amava o Pedro. Você me disse que ele estava reencontrando a Marina, por isso fiquei aquela noite com você, acho que era por vingança, eu sou muito vingativa, mas eu amava o Pedro.
-

FRED- Você acabou na casa da Marina. Que tal é ela?

ALE- O que ela fez por mim eu não teria feito por ela.

FRED- Nós estudamos juntos. Mas eu não a conheço bem. Você me disse naquela noite que iria numa missão secreta. No dia seguinte é que eu fui pego.

ALE- A missão foi adiada. Fred me diz foi você?

FRED- Ale, você não sabe o que é ser...

ALE- O que? Torturado. Talvez o Pedro saiba.

FRED- (Suspira). Não seja como eles, pare agora.

ALE- Eu estava lá. Naquela casa.

FRED- Eu não sabia, você disse que iria embora em uma missão.

ALE- Por isso você falou?

FRED- Eu não sei o que eu falei. A gente não sabe o que esta falando, não tem controle quando estamos lá, não estamos completamente acordados. Não quero lembrar, não foi culpa minha! Você nunca passou por isso , não sabe de nada!

ALE- Me disseram que você foi entregando o aparelho, nem resistiu o normal, o mínimo.

FRED- Quem te deu esta informação não falou a verdade, nem existe este mínimo. Somos seres humanos. Temos reações humanas e basta.

ALE- Não , não basta. Você achou que matando o Pedro, eu ficaria com você Fred?

FRED- O que... O que é que você está insinuando que eu sou um assassino? Pare Ale, você está distorcendo tudo, nós somos aliados, eu , você, o Pedro, todos , o movimento.

ALE- Como você pode Fred?

FRED- Eu sou jornalista! Ale, eu não sou guerrilheiro.

ALE- Cala a boca, não deixe eu te odiar.

FRED- O Pedro não teria feito diferente, ele não te amava. Ele teria me entregado também. Não existem heróis. Era ele ou eu. Se eu não dissesse onde era o aparelho, eles me matavam você sabe. Matavam-me.

ALE- Covarde!

FRED- Eu lamento. Minha arma é imprensa, eu não sei usar armas não sou um soldado. Mas de uma coisa eu tenho certeza se eu soubesse que você Ale, não tinha ido naquela missão, eu teria morrido, mas não entregaria o aparelho. Eu te amo desde a primeira vez que eu te vi você sabe disso. Qualquer outro homem na minha situação teria feito o mesmo. O mesmo. Olha vamos esquecer isto, pelo menos por enquanto, acho que já fomos muito longe por hoje. Que tal darmos uma volta? Eu prometo que depois retomamos a conversa.

ALE- Uma vez Fred, o Pedro disse que você escrevia bem pacas. Se dói viver com o que você fez saiba que ele te admirava e muito. Mas ele não tinha o intelecto da Marina , nem a tua ironia e argumentação, há mas ele sabia lutar, ele acreditava. Ele , sim morreu para me salvar. Eu não acredito em você. Mesmo que você soubesse que eu estava lá teria falado. Gente que nem você só pensa em si mesmo.

FRED- Eu só escolhi o lado, era eu ou ele. Eu teria sido covarde se tivesse escolhido ele. Eu achei sim que você estivesse apaixonada por mim, ele estava saindo com a Marina, ela não te disse?

ALE- Eu também escolhi um lado Fred. (Ale tira uma arma da roupa e aponta para Fred).

FRED- Ale! Nunca amei alguém como você. Se você não acredita... Olha vamos sair logo e dar uma volta, almoçar, ver o Louvre... (Ale atira em Fred. Ele morre. Ela então limpa a arma e põe na mão dele, pega a sua mala e vai embora).

                                                

                                                             PANO


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