quinta-feira, 7 de abril de 2011

A Trupe. Capítulo 8


 Comédia ou drama?

 “Vocês estavam quase lá.”
 Foi o que Matheus disse enquanto tomávamos chopes, nós dois no Bar Balcão.
 Duda nos havia dado dois dias de folga. O espetáculo estava indo muito bem. É uma delicia para o autor quando o que ele imaginou começa a tomar forma. Será que um arquiteto sente o mesmo?
 Resolvi aproveitar e dar um pulo em São Paulo.  Matheus estava com uns trinta e poucos anos. Agora além de professor, teórico e pesquisador de teatro, ele também escrevia para vários lugares. Jornais e revistas.
 “Leo, vocês formaram um grupo no qual ninguém era a estrela. Foram jovens que se juntaram aleatoriamente. De repente começam a trabalhar, são apaixonados incondicionalmente por teatro, pela vida e por vocês mesmos. E então, com a mão na maçaneta, só precisavam girar e abrir a porta, mas ao contrário, desistem. 
 E ficam separados por dez anos. Cada um segue um caminho. Bem da verdade. Mari decola a carreira, Bia e Rodolfo ficam ricos e famosos, Frederico se vira muito bem em musicais. Napoleão trabalha muito, mas só faz porcaria. Você e Duda ainda tentam outro elenco, e é constrangedor de ruim. Por fim um dia resolvem voltar. Dez anos depois. Por incrível que pareça ainda são jovens, por incrível que pareça eu também ainda sou jovem e acredito que vocês podem fazer história. Não só pela formação talentosa do grupo, mas pela fé que vocês têm. 
 Vocês fazem um teatro que não é clássico, graças a você Leo. Que não é experimental graças ao Duda. Que não é canastrão, graças a Mari que é quem puxa a interpretação. Que tem um fôlego e disciplina graças aos outros quatro. E que tem uma das atrizes mais carismáticas dos últimos anos. Quem já viu Bia em cena, e faz tempo que não vemos, pode falar isso.
 Por isso digo que esta é a sua chance Leo. Talvez você não seja um grande dramaturgo, mas é o dramaturgo da Trupe e você escreve para eles. Talvez o meu livro sobre vocês também de certo. É isso que veremos em poucos dias, por isso não percamos tempo.”
 Aquilo tudo que Matheus disse, me fez bem. Há anos eu não era ninguém e agora me sentia igual quando comecei teatro. No meu primeiro trabalho.
 O Bar Balcão fechou e fomos nós dois para o Filial. Saímos do chope e entramos na cachaça. Matheus me contou do musico que ele estava saindo e eu acabei contando sobre Bia. O agora jornalista ria.
 “Você sabe Leo que eu monitoro vocês todos. Já faz muitos anos.”
 Claro que eu sabia. A da obsessão dele por Tiradentes, pela Trupe de Azul, por Bia... O que eu não sabia é que ele, Matheus, talvez soubesse mais de mim do eu mesmo.
 “Não é porque ela é Bissexual, que ela não possa te amar.”
 Depois disso pedi que ele me explicasse do que se tratava aquilo. Claro que ele se referia a Mari. E se ele tivesse razão? Na porta da casa de Matheus, ele ainda disse:
 “Bia é a mulher ideal, Mari é a que você ama de verdade.”
 Aquilo tudo me atordoava. Primeiro porque Mari para mim não era uma mulher, era, mas também não era. Como Fred era Frederica. E bem possivelmente, por ela, Mari, não ser uma mulher dita “comum” fosse o motivo de eu me interessar. Ou por amá-la.
 Acordei de manhã e segui para a piscina do clube. Prometi para mim mesmo.
 “Hoje nada de pensar nem em mulher e nem em teatro.”
 Foi a aí a minha triste constatação: Eu não sei pensar em outra coisa. Drama ou comédia? 
 Nem uma coisa nem outra. Feijoada e Fernando Pessoa. E o sol brilhava naquele sábado na cidade de São Paulo. 
 Abri o jornal passei os olhos e vi a parte de teatro. Me deu uma saudade deles. Delas. E se eu fosse assistir a uma dança? 
 Acabei indo ver Tchekcov, nem drama e nem comédia. 


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