quinta-feira, 23 de julho de 2015

Tipos de diretores de Teatro:

Existem infinitos estilos de diretores de teatro. Aqui apenas faço uma brincadeira. Colocando alguns tipos mais comuns, que fui conhecendo durante a minha trajetória.
 Em absoluto acredito que exista um jeito, regra ou fórmula de dirigir. Seja um diretor invisível, que de mais espaço para o texto aparecer, ou ainda um diretor com cores mais fortes, que atravesse o texto, tanto faz. Sou e sempre fui a favor da diversidade. Da possibilidade infinita. Dito isto, lá vão os tipos:




O INSEGURO:



 O diretor inseguro, já começa indeciso quanto ao texto que irá montar. Clássico ou contemporâneo? Texto nacional ou estrangeiro? Comédia ou drama?
 Como ele é inseguro, suas decisões são tomadas junto a outras pessoas. Ele pergunta o que o produtor acha, o que os atores acham. Chega até perguntar para sua esposa, para sua mãe e até para sogra.
 Ora se decide por Molière, ora resolve fazer teatro físico. A frase que mais diz durante os ensaios é: “O que vocês acham”?
 O diretor inseguro, deixa toda equipe insegura. O autor, se é vivo, fica inseguro. O produtor fica inseguro, o elenco fica inseguro. As vezes a própria plateia fica insegura.
 O diretor inseguro, deixa os técnicos inseguros. Será que é para dar o terceiro sinal já?
 O bilheteiro fica inseguro se cobrou certo, se era convite, ou inteira. O público, fica inseguro quanto ao lugar, a poltrona.
 Até o crítico fica inseguro, quanto a crítica. “Será que era ruim mesmo”?
 O cenógrafo nem se fale. “Acho que era pra ser um verde mais escuro ali”.
 A temporada toda, mesmo se forem meses, todos os dias, todos se perguntaram: “E se mudarmos ali”? Acho que aquela cena deve sair. Colocar mais luz no fundo. A música tava melhor quando era mais alto o volume.
 A atriz, que faz a japonesa, era melhor quando era a negra, e não esta loira. A negra tinha mais cara de coreana.
 Já para o pai dela, melhor o ator parar de ser gago. E tirar a barba. Já o policial, melhor se ele falar mais baixo, mais doce.
 O que? Não tem policial? Mas o crítico disse que aquele personagem ali, é na verdade um policial.
 O que? O crítico voltou atrás e deu mais estrela? É claro que eu gosto da atriz. Só não sei se ela é boa atriz. O que você acha? Você acha que eu troco ela? Trocar a roupa dela? Mas se já vai trocar o figurino, já troca o elenco também.
 Você acha que eu deveria ter feito o clássico de uma vez?
 Às vezes acho que é melhor mudar de Teatro. Ou deixar de ser sexta, sábado e domingo. Ser sábado, terça e domingo. O que você acha de mudar o título?
 O diretor inseguro não decide nem a cantina apoiadora que vão comemorar após a estreia. Se é a Piolim, ou a Planeta’s.




 O DORMINHOCO:


 Este tipo acredite ou não, é pontual. O diretor dorminhoco chega até antes, pois adora ficar conversando com os atores. O ensaio atrasa uma meia hora, as vezes até mais. Mas sempre termina no horário, nem um minuto a mais. Como um terapeuta encerrando a sessão.
 O diretor dorminhoco, tem sempre um excelente assistente. Destes mais sargentos. O diretor lhe dá toda autoridade de ensaiar com braço com forte. Anotar bem as marcas. Afiar a luz. Um assistente pouco criativo, mas executor, e autoritário com o elenco.
 O assistente passa um aquecimento bem puxado. Com vários exercícios físicos. Isso dá a impressão ao elenco que eles estão rendendo, ensaiando.
 Depois o diretor pega um caderno, uma caneta, um lápis, e começa a desenhar. O elenco terá a sensação de que ele está anotando coisas referentes ao ensaio, ao espetáculo. Mas não são notas que o diretor dorminhoco faz. E sim desenhos. Sua cabeça vai longe. Viaja.
 Desenha, desenha, e quando o assistente o questiona sobre o que fazer. Ele manda repassar a cena, ou escolhe outra para ensaiarem.
 Avisa que está indo tomar um café na padaria, que depois no fim do ensaio quer ver tudo passado. E sai. Volta dez minutos antes de acabar o ensaio.
 Ele está lá sempre sentado, calmo. Muitas vezes o diretor dorminhoco, tem dúvidas sobre a profissão que seguiu. Mas também como não estudou mais nada. E já tem alguns espetáculos na carreira, ele continua sempre em frente. No automático.
 Muitos críticos, teóricos e observadores de teatro, acreditam que este tipo de direção ausente, até pode acarretar um excelente espetáculo, quando feito por bons atores.
 Porque a verdade é que bons atores, sabem fazer as cenas. Mas bons atores também gostam de que sempre tenham alguém a observa-los. Coisa que fica a cargo do assistente sargento.
 Mas a verdade é que alguns dias antes da estreia, o diretor dorminhoco, acorda e passa a achar seu próprio espetáculo lindo. Fica levemente mais empolgado. Pois o este tipo, adora teatro, adora ser plateia, o que ele não gosta é de trabalhar, ensaiar e claro atuar.
 Eles são ótimos para formar novos diretores. Porque eu mesmo leitor, confesso, que a primeira assistência de direção que eu fiz, primeira e única, foi para um diretor dorminhoco. Ele me mandava repetir e repetir a cena com os atores exaustivamente, e saia.
 A única vez que ele levantou da poltrona, tomei até um susto. Ele estava atrás de um cinzeiro a poucos metros. Pegou o cinzeiro e voltou a ficar no seu mundo.
 Depois da estreia, o diretor dorminhoco, sai de férias. Ou dorme dois, as vezes até três dias seguidos. Pois está exausto.





 O CRIATIVO:


 Dizem que este tipo surgiu com a invenção da lâmpada. Lá pelos idos de 1880. Em Paris, e depois se difundiu pelo mundo. Antes poucos recursos eram disponibilizados numa apresentação de teatro. Poucos, mas suficientes.
 Texto, atores e plateia. Mas agora, com a lâmpada o céu era o limite. Aliás, dizem que o diretor em geral surgiu com a eletricidade. O estilo de direção. Mas isto é outra polêmica, para teóricos e historiadores.
 Ele agora, o diretor de teatro, pode deixar os atores no escuro, pode fazer a tudo amarelo, pôr do sol, tudo azul. Pode colocar música que quiser, enfim, fazer a atmosfera que quiser. Apagar e acender as luzes, o tempo todo. Até mexer no ar condicionado, ele pode.
 Claro que todos estes recursos, vieram para colaborar, para servir. O problema é quando o texto e os atores, ficam servindo os efeitos. 
 O diretor criativo, é o pesadelo dos autores. Porque bem da verdade ele é apaixonado pelo palco, e não por histórias (estórias).
 Ele se preocupa única exclusivamente com a equipe técnica. Iluminador, sonoplasta, cenógrafo, e muito, mas muito dinheiro no orçamento para gastar.
 Aqui vão três anões, ali duas loiras, perto da piscina, atrás do leão.
 Geralmente os criativos se cansam dos palcos Italianos convencionais. O edifício do teatro como conhecemos, o auditório com o palco.
 Preferem explodir o espaço cênico. Encenar a peça em Igrejas, em barcos, na fachada de prédios. Sim isso mesmo, na fachada, com atores pendurados como o Homem Aranha. Por que não? Vai ver quem quer.
 O texto? O texto é pretexto. Desde que o ponto de partida, seja um nome como Saramago, Tolstoy, Dostoyevsky, Machado de Assis, e as vezes um texto baseado em pintores, ou arquitetos, ou em chefes de cozinha, Picasso, ou Le Corbusier, Ferran Adria...  Em cineastas, em atrizes que já morreram, ou em qualquer coisa, artística ou não. Não importa. Pode ser baseado até neles mesmos, ou em uma notícia de jornal.
 Colocam os atores dando falas no escuro. Colocam um ator fazendo Shakespeare em grego contracenando com um ator alemão fazendo Nelson Rodrigues em japonês. Convidam celebridades para atuar, misturam vídeo, fazem cenas na rua.
 Colocam a plateia no palco, e o elenco na plateia. Às vezes acho que são para o teatro, o que arte conceitual é para as artes plásticas.
 Quando este tipo, criativo, tem de verdade uma personalidade forte, é seguro, pode sim acarretar um ótimo espetáculo. E as vezes até aparecer com uma forma narrativa interessante.
 Mas alguns aparecem com coisas que já foram feitas e refeitas há mais de cem anos. E vendem isso como inovação. Mas o que seria do mundo das artes convencional, sem os verdadeiramente criativos? Aliás, o que seria do mundo sem eles?
 Cabe lembrar que um destes diretores, que era outras coisas também, vereador, autor, teórico, era tão criativo, mas tão criativo, que fazia coisas sem dinheiro.
 Inventou o Teatro Invisível, o Teatro Fórum. Mas me acorre que Augusto Boal, fosse realmente um inventor, e não um criador.





 O BREGA: 


 O Diretor Brega, não tem muito segredo não. Ele tira toda forma de reflexão, polêmica, filosofia, sofisticação de um espetáculo. Ele simplesmente faz o famoso Teatrão. Ele possui um gosto duvidoso. Não é questão de fazer pizza, ou gastronomia refinada. Seria o famoso restaurante Paris 6, por exemplo. A função é agradar.
 Não que algo mais reflexivo, caprichado, não agrade tanto quanto.
 Alguns são bem resolvidos com apenas agradar o público em geral.
 O problema, se dá com os não verdadeiramente assumidos diretores bregas, que passam a querer ter uma imagem mais aceita pela opinião dita mais culta.
 E aí que se tornam mais bregas ainda. Pois muitas vezes são artesões que desejam parecer artistas. Mas um artista mais para o lado de um cantor sertanejo, astro de rock. Claro que as referências, serão Marco Nanini, Possi Neto, misturados com Tom Cruise e Suzana Vieira.
 O diretor Brega, é aquele indivíduo que não abrir mão de nada. No seu inconsciente ele quer ser como a rede Globo. Chique, com audiência, e ainda esbanjando cultura.
 Acontece que a Globo não faz teatro, tentou e quebrou a cara. Ou bem da verdade nunca quis. Nem tem nada a ver. Teatro não é indústria, propriamente dita. Se bem que os números financeiros dos atuais musicais, desmentem isso.
  Enfim, voltando, o cara quer ter tudo, beleza, dinheiro, Oscar de Hollywood, prestigio, e ainda ser um grande artista. Não dá. Pois pouquíssimas pessoas têm tudo. Se é que alguém tem tudo.
  O que eles fazem? Leis e mais leis Rouanets, correm atrás de atores famosos e assessores de imprensa que invariavelmente os acabam mandando para programas televisivos bregas, e frequentando estreias de espetáculos ditos mais artísticos, onde artistas fogem deles.
 De cinco em cinco em anos, arrumam uma enormidade de dinheiro, fazem um espetáculo caro, com elenco televisivo, um pé no musical, e seguem em frente.
 O espetáculo as vezes pode vir a ser até bom. Pois apesar de tudo, o diretor Brega, é sim um obstinado. Um lutador.
 Quem já não teve noites agradáveis com aquela menina brega, bem breguinha mesmo, mas com um sorriso lindo, e uma enorme vontade de vencer?
 Eu já tive. Desconfio as vezes que o teatro só não morre, por conta dos bregas. As vezes a peça toda é ruim, mas as vezes tem alguma cena, uma só que seja, tão brega, mas tão brega, que ela fica até verdadeira.
 É quando a alma deles é revelada.
 Agora ninguém, mas ninguém supera o coquetel de estreia de um diretor Brega. São os melhores.
 Porque para uma equipe brega, por mais que desejassem serem reconhecidos como artistas, o que define o sucesso pra eles, é sim, o lugar comum, uma casa cheia.
 E numa estreia a casa é sempre lotada. É muita felicidade. E muito champanhe.





 O TÉCNICO:


 Este tipo de diretor, é aquele prático. Objetivo. Ele pega o texto, destrincha ele todo. Quando reúne o elenco, ele lê cada personagem, para cada ator, que fará o personagem especifico.
 Define todos os gestos, o volume de cada fala, cada intenção, é extremamente matemático, metódico.
 A palavra que ele mais gosta é método. E é claro, ele tem o método dele. Que na verdade seria um método mais clássico desenvolvido para os dias atuais, para o ator contemporâneo. Mas é dele.
 O diretor Técnico, obviamente é professor. Já foi diversas vezes para Europa. Já morou em Moscou, em Londres e até estudou teatro oriental na Índia e no Japão. Ou pelo menos diz, que já fez tudo isso.
 Suas influências são Freud, Stanislavski, Lacan e Buda. Tudo parte do ator, e seu método. Até o cenógrafo tem que fazer os laboratórios do método. Porque tudo parte do ator, o cenário, o texto, o figurino, a luz, a direção, partem do ator.
 O ator é o centro do seu teatro. Aliás, centro do universo. Bonito, né? As atrizes jovens adoram.
 Deus é o método, e o método é Deus. E o ator sem ele, diretor técnico, não é nada. Pois ele, o diretor técnico, estudou com o discípulo do grande outro mestre.
 Ele possui a mágica que fará você, ator e atriz, serem grandes. Sem ele, e sem o método, vocês não são verdadeiros. Vocês não são nada.
 O diretor técnico cria então uma seita. Promete um fazer um teatro que nunca foi feito antes. Grita para o mundo que todos os outros teatros não estão certos. A não ser alguns trabalhos do Antunes, e do Grotowski.
 Geralmente este tipo de diretor, não sabe fazer comédia. E nem quer. Pois comédia não se encaixa nos seus laboratórios.
 Adora colocar atores andando para trás, esbugalhando os olhos. Em silêncio. Atores sentindo. Com desequilíbrio.
 Dizem que seus atores sentem muito. A plateia também sente. Sente arrependimento de estar lá.
 Muitos deles no Brasil colocam guardas chuvas em cena, em tentativa de copiar o mestre Antunes Filho, este realmente um diretor técnico. Técnico, mas genial.
 Por mais que o diretor técnico se torne uma caricatura dele mesmo, são eles que topam enfrentar a profunda busca no ator dentro dele mesmo.
 Acaba que o ator realmente sai valorizado do processo. O ruim é quando o ator não sai do processo.
 Muitos atores tendem a se apaixonar pelas teorias de teatro. Uma bobagem, pois teatro é prático e físico. Mas acaba que muitos atores se apaixonam também pelo seu mestre, o diretor Técnico. E não poucas vezes se tornam fanáticos, como em qualquer seita.
 A estreia geralmente é sem plateia. Pois o diretor técnico está em busca de um teatro puro.
 E as plateias nunca são puras, pois não estão preparadas para o seu teatro. Na verdade, os atores também não estão.























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