Uma amiga começou a treinar boxe. Ela que é uma amiga antiga se surpreendeu de quanto eu conheço sobre o assunto. Mas também alguém como eu, que dedica grande tempo à leitura, documentários, museus é natural que saiba um pouco de muitos assuntos, mas nem sempre muito de um assunto só.
O fato é que me lembrei de Billy Elliot que para mim é o filme que mais me perturbou até hoje, eu só o assisti uma única vez. Prestando atenção nele, eu identificava dois assuntos, ou ainda duas coisas que eu adoro, colocadas juntas: o boxe e o ballet.
Foi então que a minha amiga perguntou por que eu não treinava boxe com ela? “Vamos vai ser legal”.
Veio então o estalo, como diz outra amiga. Eu me perturbei com Billy Elliot, mas nada tem a ver com o boxe. É a escolha dele pelo ballet, em se assumir artista, em se aceitar é que sempre me perturbou.
E fui mais longe. Eu não gosto e nem nunca gostei de boxe. Em 35 anos de vida eu nunca vi uma só luta de boxe. A não ser as dezenas e dezenas de filmes americanos e umas duas lutas do Maguila pela televisão. Nunca uma ao vivo de verdade. E nem vou.
E o pior, sim leitor, que vergonha eu simplesmente amo ballet. Desde a primeira exibição que eu vi na vida. Freqüento dança pelo menos uma vez por mês. Mas por que então me enganar dizendo para os outros e pra mim mesmo que eu adoro boxe? Não tenho a menor idéia.
De carro uns dias atrás, passei numa rua a noite onde ocorria um linchamento de um rapaz por outros seis homens. Um quarteirão depois um casal se beijava. O casal com certeza desconhecia que a poucos metros dali um homem era espancado.
Eu nunca entendi se esse Billy Elliot é uma comédia ou o quanto ele é inspirado na vida do ator Laurence Olivier. O que acho incrível é o fato de eu ter demorado dez anos para entendê-lo. Agora outro filme interessantíssimo, mas nada perturbador é Karate Kid.
Com um passo de dança o herói liquida o vilão. Se não me falha a memória essa frase é de Seu Miag:
“A melhor maneira de se evitar um soco é não estar lá”.
Simples assim. “A alface não significa nada para o tigre, já para o coelho”...
quarta-feira, 25 de agosto de 2010
segunda-feira, 23 de agosto de 2010
Mr. Colde e a origem do pólo a mulas.
Ainda em Cambridge nas minhas pesquisas sobre a origem da sexta vogal me deparei com uma teoria sobre a origem do pólo a mulas. As coisas não acontecem por acaso. O historiador alemão Sodespy Huimcitec em viagem pelo Brasil, descobriu que no interior do Piauí, um criador de mulas, não se sabe exatamente por qual motivo, ao ver fotos de um jogo de pólo aquático numa enciclopédia acreditou que os nadadores estivessem montados em cavalos.
Ele durante algum tempo tentou ensinar suas mulas a arte da natação. Importou um técnico americano que se demitiu após surpreender o senhor Gonzaga, criador em questão, bolinando uma das suas alunas. E também por não acreditar em natação praticada em açudes.
Com um apreço pelos direitos dos animais esse senhor Gonzaga não aceitou o fato dos cavalos (mulas) ficarem dentro da água. Logo, tentando ainda nos anos vinte, adaptar o pólo para uma área sem piscinas, criou não o pólo clássico, mas o atual pólo contemporâneo. Um pólo jogado por quatro participantes em cima de quatro mulas.
Descobri na cidade de Teresina, capital da província do Piauí, que eles aqui são os campeões mundiais em pólo a mulas. Seguidos pelos cearenses.
Uma partida pode levar de duas horas a três dias inteiros dependendo se é época de eleição ou não. Porque nesse período os patrocinadores pedem que as mulas com seus painéis pintados fiquem mais tempo expostas.
Já sobre a sexta vogal ainda me é um mistério. Um outro historiador dessa vez o brasileiro, Wilmar da Costa Aguiar, teorizou que a descoberta da sexta vogal teria relação com o atentado da Rua Toneleros. Evento no qual o líder da oposição de Vargas, Carlos Lacerda quase foi morto. Tanto Lacerda quanto o presidente Getúlio Vargas tiveram acesso a sexta vogal. E sendo isso verdade, logo Vargas foi morto e depois forjaram um suicídio. Hora quem forjou? Eles. Obvio. Quem são eles? Hora quem? A CIA.
Tudo se encaixa nessa teoria da conspiração. O pólo a mulas, a sexta vogal, o suicídio de Getúlio e a descoberta do Guaraná, Santos Dumont a rede Globo, o Niemayer e eu ainda arriscaria aquele José Celso Martinez Correa.
Ele durante algum tempo tentou ensinar suas mulas a arte da natação. Importou um técnico americano que se demitiu após surpreender o senhor Gonzaga, criador em questão, bolinando uma das suas alunas. E também por não acreditar em natação praticada em açudes.
Com um apreço pelos direitos dos animais esse senhor Gonzaga não aceitou o fato dos cavalos (mulas) ficarem dentro da água. Logo, tentando ainda nos anos vinte, adaptar o pólo para uma área sem piscinas, criou não o pólo clássico, mas o atual pólo contemporâneo. Um pólo jogado por quatro participantes em cima de quatro mulas.
Descobri na cidade de Teresina, capital da província do Piauí, que eles aqui são os campeões mundiais em pólo a mulas. Seguidos pelos cearenses.
Uma partida pode levar de duas horas a três dias inteiros dependendo se é época de eleição ou não. Porque nesse período os patrocinadores pedem que as mulas com seus painéis pintados fiquem mais tempo expostas.
Já sobre a sexta vogal ainda me é um mistério. Um outro historiador dessa vez o brasileiro, Wilmar da Costa Aguiar, teorizou que a descoberta da sexta vogal teria relação com o atentado da Rua Toneleros. Evento no qual o líder da oposição de Vargas, Carlos Lacerda quase foi morto. Tanto Lacerda quanto o presidente Getúlio Vargas tiveram acesso a sexta vogal. E sendo isso verdade, logo Vargas foi morto e depois forjaram um suicídio. Hora quem forjou? Eles. Obvio. Quem são eles? Hora quem? A CIA.
Tudo se encaixa nessa teoria da conspiração. O pólo a mulas, a sexta vogal, o suicídio de Getúlio e a descoberta do Guaraná, Santos Dumont a rede Globo, o Niemayer e eu ainda arriscaria aquele José Celso Martinez Correa.
segunda-feira, 16 de agosto de 2010
Maria Califórnia
Era o seu primeiro dia. Alias era o primeiro trabalho também da jovem garçonete. Ela cursava faculdade e dava esse passo em direção a sua independência. Livrar-se-ia em breve de seus pais e conquistaria o mundo. O gerente um rapaz, um pouco menos jovem, porém bonito como ela não se impressionara quando ela dissera que já havia morado na Europa e que alem do inglês, falava um pouco de francês.
Eis que em uma mesa ela vê a sua primeira oportunidade rumo a uma carreira de sucesso. Ela identifica um cliente famoso. Um escritor. Ela corre até o gerente, um tanto quanto emocionada por logo no seu primeiro momento profissional da vida ter uma atitude tão competente.
O gerente olha para o casal famoso, mas só vê um homem triste e uma mulher contida ambos bem clássicos e caretas. Diria até uns nerds.
-Tem certeza? Pergunta o gerente.
-Absoluta. Seu nome é Marshall Smello. Escreveu “Maria Califórnia”. Aquele romance cult dos anos oitenta. Você sabe qual né? Aquele que influenciou o Kurt Cobain.
-Claro. Respondeu o gerente disfarçando a sua falta de cultura tanto pop quanto literária.
O gerente mandou o jantar de cortesia, ofereceu uma garrafa de vinho e a equipe foi até lá tirar fotografias com a celebridade.
O casal desde o início não compreendeu muita coisa. O cliente estava meio desconfiado, era um tanto pessimista. A esposa já tontinha com o vinho lhe disse para se acalmar. Finalmente o seu trabalho era reconhecido. Até que o homem não se conteve e perguntou ao gerente:
-Afinal o senhor me desculpe...
-Pois não. Disse o gerente já feliz em ter a posse da foto.
-Eu tenho uma memória fraca. Quem aqui é meu paciente?
-Paciente?
-Sim porque dos animais eu nunca esqueço, mas dos donos... Às vezes o senhor sabe.
O gerente, achando que era uma pegadinha falou que era fã dos livros do homem. Esse percebeu que algo não ia bem e insistiu na história dos pacientes.
-Mas eu tenho uma clínica veterinária. Disse o homem.
O experiente gerente sorriu e disse uma mentira gentil.
-Mas eu não levo a Iolanda sempre lá.
O veterinário sem graça fingiu lembrar-se de Iolanda e o casal agradeceu e dizendo que iriam retribuir com Iolanda, fosse quem fosse e seguiram embora. Foi a primeira vez que a mulher se orgulhou do marido. Cortesia num restaurante sofisticado. Mal pisaram na rua e ela telefonou para a irmã.
Já o gerente furioso dirigiu-se a novata agressivamente pedindo explicações.
- Mas eu o vi.
-O veterinário?
-No programa do Edney Silvestre. Nisso ela vê ninguém menos do que Ney Matogrosso em outra mesa logo ali ao lado.
Ela aponta e diz: - Ney Matogrosso!
O gerente não se contendo a manda embora pra casa.
Já o cliente que fora confundido com o cantor pergunta ao gerente o que estava acontecendo. O gerente já tão atordoado resolve usar a sinceridade com o cliente.
-Me desculpe senhor, mas foi o primeiro e último dia dela aqui e entre muitas confusões ela confundiu o senhor... Imagine que louca, com o Ney Matogrosso. O cliente não riu. Aliás, ele e seu acompanhante fecharam à cara.
O gerente se afastou. Ficou com uma ponta de dúvida. Não é que aquele homem normal era parecido com Ney Matogrosso. Mas e os paetês? As plumas e as asas de borboleta? Imagine claro que não era. Pelo sim pelo não o cliente foi embora depois de ter pagado com cartão de crédito. O nome no cartão? Era outro, mas também foi o acompanhante quem pagou.
Duas semanas depois o veterinário volta ao restaurante. Dessa vez com os cabelos despenteados, a barba mal feita e acompanhado não mais pela esposa e sim por uma garota de vinte anos. Pediu logo uma garrafa de uísque. Ele e a menina riam num tom alto e se beijavam. O veterinário, hora ficava em pé, hora abraçava a moça e gesticulava as mãos e falava e falava. O gerente se aproximou e perguntou da clínica.
-Que clínica meu querido? Que clínica? Tome uma conosco.
-Mas o senhor não é veterinário.
Dessa vez a garota acompanhante respondeu:
- Ele é o famoso Marshall Smello, o autor de “Maria Califórnia”.
- E o veterinário? Perguntou o já assombrado gerente. E a menina:
- Aquele é o outro. Marshall escreve seus romances psicografando.
Foi então que o belo gerente entendeu menos ainda. Porém aprendeu que às vezes subestimamos um estagiário. Devia desculpas aquela menina, ex-garçonete.
No dia seguinte pregou a foto do veterinário na parede junto das outras celebridades. E junto do chefe criaram a sobremesa: Panquecas de frutas com recheio de Marshall Smello.
Eis que em uma mesa ela vê a sua primeira oportunidade rumo a uma carreira de sucesso. Ela identifica um cliente famoso. Um escritor. Ela corre até o gerente, um tanto quanto emocionada por logo no seu primeiro momento profissional da vida ter uma atitude tão competente.
O gerente olha para o casal famoso, mas só vê um homem triste e uma mulher contida ambos bem clássicos e caretas. Diria até uns nerds.
-Tem certeza? Pergunta o gerente.
-Absoluta. Seu nome é Marshall Smello. Escreveu “Maria Califórnia”. Aquele romance cult dos anos oitenta. Você sabe qual né? Aquele que influenciou o Kurt Cobain.
-Claro. Respondeu o gerente disfarçando a sua falta de cultura tanto pop quanto literária.
O gerente mandou o jantar de cortesia, ofereceu uma garrafa de vinho e a equipe foi até lá tirar fotografias com a celebridade.
O casal desde o início não compreendeu muita coisa. O cliente estava meio desconfiado, era um tanto pessimista. A esposa já tontinha com o vinho lhe disse para se acalmar. Finalmente o seu trabalho era reconhecido. Até que o homem não se conteve e perguntou ao gerente:
-Afinal o senhor me desculpe...
-Pois não. Disse o gerente já feliz em ter a posse da foto.
-Eu tenho uma memória fraca. Quem aqui é meu paciente?
-Paciente?
-Sim porque dos animais eu nunca esqueço, mas dos donos... Às vezes o senhor sabe.
O gerente, achando que era uma pegadinha falou que era fã dos livros do homem. Esse percebeu que algo não ia bem e insistiu na história dos pacientes.
-Mas eu tenho uma clínica veterinária. Disse o homem.
O experiente gerente sorriu e disse uma mentira gentil.
-Mas eu não levo a Iolanda sempre lá.
O veterinário sem graça fingiu lembrar-se de Iolanda e o casal agradeceu e dizendo que iriam retribuir com Iolanda, fosse quem fosse e seguiram embora. Foi a primeira vez que a mulher se orgulhou do marido. Cortesia num restaurante sofisticado. Mal pisaram na rua e ela telefonou para a irmã.
Já o gerente furioso dirigiu-se a novata agressivamente pedindo explicações.
- Mas eu o vi.
-O veterinário?
-No programa do Edney Silvestre. Nisso ela vê ninguém menos do que Ney Matogrosso em outra mesa logo ali ao lado.
Ela aponta e diz: - Ney Matogrosso!
O gerente não se contendo a manda embora pra casa.
Já o cliente que fora confundido com o cantor pergunta ao gerente o que estava acontecendo. O gerente já tão atordoado resolve usar a sinceridade com o cliente.
-Me desculpe senhor, mas foi o primeiro e último dia dela aqui e entre muitas confusões ela confundiu o senhor... Imagine que louca, com o Ney Matogrosso. O cliente não riu. Aliás, ele e seu acompanhante fecharam à cara.
O gerente se afastou. Ficou com uma ponta de dúvida. Não é que aquele homem normal era parecido com Ney Matogrosso. Mas e os paetês? As plumas e as asas de borboleta? Imagine claro que não era. Pelo sim pelo não o cliente foi embora depois de ter pagado com cartão de crédito. O nome no cartão? Era outro, mas também foi o acompanhante quem pagou.
Duas semanas depois o veterinário volta ao restaurante. Dessa vez com os cabelos despenteados, a barba mal feita e acompanhado não mais pela esposa e sim por uma garota de vinte anos. Pediu logo uma garrafa de uísque. Ele e a menina riam num tom alto e se beijavam. O veterinário, hora ficava em pé, hora abraçava a moça e gesticulava as mãos e falava e falava. O gerente se aproximou e perguntou da clínica.
-Que clínica meu querido? Que clínica? Tome uma conosco.
-Mas o senhor não é veterinário.
Dessa vez a garota acompanhante respondeu:
- Ele é o famoso Marshall Smello, o autor de “Maria Califórnia”.
- E o veterinário? Perguntou o já assombrado gerente. E a menina:
- Aquele é o outro. Marshall escreve seus romances psicografando.
Foi então que o belo gerente entendeu menos ainda. Porém aprendeu que às vezes subestimamos um estagiário. Devia desculpas aquela menina, ex-garçonete.
No dia seguinte pregou a foto do veterinário na parede junto das outras celebridades. E junto do chefe criaram a sobremesa: Panquecas de frutas com recheio de Marshall Smello.
sábado, 14 de agosto de 2010
Amigos, pero no mucho
-Luz na platéia! Para o ensaio!
Pediu o diretor. –Me desculpe, mas essa moça é muito gordinha pra fazer a Branca de Neve.
Eu como assistente e amigo da atriz argumentei que ela iria emagrecer até a estréia.
-Ok. Manda continuar. E eu:
-Continuem! Pouco depois o nosso experiente diretor manda parar novamente.
-Mas Leo, a menina é uma anã.
E novamente eu lutei pela colega e disse que os atores que fariam os anões ficariam de joelhos na montagem.
-Fiquem de joelhos. E um dos atores:
-Já estamos de joelhos. E o diretor:
-Mas eles já estão de joelhos e ela continua mais baixa que eles.
Veio-me a solução, sapatos de saltos altíssimos.
-Ok manda continuar.
-Continuem! Gritei também da platéia naquele enorme teatro à tarde.
Passados alguns minutos em que o nosso experiente diretor hora olhava para o palco, hora olhava para mim, olhava o palco, olhava para mim e falava baixo consigo mesmo. Até que ele se virou:
-Mas Leo... A moça vai fazer a Branca de Neve?
-Sim. Eu disse.
-Branca como a Neve?
-Isso.
Foi aí que mesmo eu me dei conta. Antes mesmo de o derretido diretor manifestar a sua descoberta, o produtor avança pelo teatro e grita:
-Mas a moça é negra!
A premiada figurinista, e cenógrafa, que também assistia ao ensaio e era japonesa tomou as dores e disse que a Branca de Neve não era do Disney, ou só dele era antes de tudo dos irmãos Grimm. E podia ter a forma que eles quisessem.
Às vezes eu acho que até Napoleão Bonaparte seria recusado para fazer ele mesmo no teatro. O argumento: Baixinho.
Imagino alguém dizendo a Roberto Gomes Bolanos que o texto dele é bom, mas que irão chamar um garoto de oito anos para fazer o Chaves. Ou ainda alguém falar para o Buster Keaton que ele era bonito demais pra ser um clown.
Foi numa noite de sábado, eu e ela estávamos indecisos sobre o que fazer. Ela pediu uma comédia. Dava tempo, uns vinte minutos para irmos ver: “Amigas, Pero no Mucho”. Uma comédia que havia anos estava em cartaz e eu por conta de preconceito ainda não tinha assistido. Pensava que uma comédia sobre quatro amigas, feito por quatro atores homens seria uma bobagem sem igual. Ledo engano.
Casa lotada. Chegamos em cima da hora eu e ela. Pegamos um lugar no galinheiro, lá onde à turma chama de balcão, a famosa segunda classe do teatro.
Ela estava linda de vestido solto e para minha surpresa também amou a peça.
No dia seguinte eu estava só na platéia e dessa vez ela é quem estava no palco, interpretando ela mesma. Uma das maiores cantoras do Brasil. E era preciso muito talento para interpretar ela mesmo.
Alias no palco é preciso muito talento. Existem pessoas tão excepcionais que nos fazem crer, que mesmo quando são negras ou latinas, de que elas são sim Brancas de Neves. Pra quem conhece o Dzi Croquettes então.
Pessoas que mesmo altas são anãs e mesmo anãs são gigantes. Afinal esse é o jogo, esse é o palco. Por exemplo. Esquecemos que aquela cantora, não é uma Deusa sobrenatural, feiticeira, fada, bruxa, princesa e rainha. É uma menina, meiga, às vezes tímida e às vezes uma amiga. Pero no mucho. Lamentavelmente.
“Se um diretor e uma atriz resolverem de que em determinada cena a atriz deva ficar nua, a platéia vai achar que ela nunca esteve tão bem vestida”. Ziembinski.
Pediu o diretor. –Me desculpe, mas essa moça é muito gordinha pra fazer a Branca de Neve.
Eu como assistente e amigo da atriz argumentei que ela iria emagrecer até a estréia.
-Ok. Manda continuar. E eu:
-Continuem! Pouco depois o nosso experiente diretor manda parar novamente.
-Mas Leo, a menina é uma anã.
E novamente eu lutei pela colega e disse que os atores que fariam os anões ficariam de joelhos na montagem.
-Fiquem de joelhos. E um dos atores:
-Já estamos de joelhos. E o diretor:
-Mas eles já estão de joelhos e ela continua mais baixa que eles.
Veio-me a solução, sapatos de saltos altíssimos.
-Ok manda continuar.
-Continuem! Gritei também da platéia naquele enorme teatro à tarde.
Passados alguns minutos em que o nosso experiente diretor hora olhava para o palco, hora olhava para mim, olhava o palco, olhava para mim e falava baixo consigo mesmo. Até que ele se virou:
-Mas Leo... A moça vai fazer a Branca de Neve?
-Sim. Eu disse.
-Branca como a Neve?
-Isso.
Foi aí que mesmo eu me dei conta. Antes mesmo de o derretido diretor manifestar a sua descoberta, o produtor avança pelo teatro e grita:
-Mas a moça é negra!
A premiada figurinista, e cenógrafa, que também assistia ao ensaio e era japonesa tomou as dores e disse que a Branca de Neve não era do Disney, ou só dele era antes de tudo dos irmãos Grimm. E podia ter a forma que eles quisessem.
Às vezes eu acho que até Napoleão Bonaparte seria recusado para fazer ele mesmo no teatro. O argumento: Baixinho.
Imagino alguém dizendo a Roberto Gomes Bolanos que o texto dele é bom, mas que irão chamar um garoto de oito anos para fazer o Chaves. Ou ainda alguém falar para o Buster Keaton que ele era bonito demais pra ser um clown.
Foi numa noite de sábado, eu e ela estávamos indecisos sobre o que fazer. Ela pediu uma comédia. Dava tempo, uns vinte minutos para irmos ver: “Amigas, Pero no Mucho”. Uma comédia que havia anos estava em cartaz e eu por conta de preconceito ainda não tinha assistido. Pensava que uma comédia sobre quatro amigas, feito por quatro atores homens seria uma bobagem sem igual. Ledo engano.
Casa lotada. Chegamos em cima da hora eu e ela. Pegamos um lugar no galinheiro, lá onde à turma chama de balcão, a famosa segunda classe do teatro.
Ela estava linda de vestido solto e para minha surpresa também amou a peça.
No dia seguinte eu estava só na platéia e dessa vez ela é quem estava no palco, interpretando ela mesma. Uma das maiores cantoras do Brasil. E era preciso muito talento para interpretar ela mesmo.
Alias no palco é preciso muito talento. Existem pessoas tão excepcionais que nos fazem crer, que mesmo quando são negras ou latinas, de que elas são sim Brancas de Neves. Pra quem conhece o Dzi Croquettes então.
Pessoas que mesmo altas são anãs e mesmo anãs são gigantes. Afinal esse é o jogo, esse é o palco. Por exemplo. Esquecemos que aquela cantora, não é uma Deusa sobrenatural, feiticeira, fada, bruxa, princesa e rainha. É uma menina, meiga, às vezes tímida e às vezes uma amiga. Pero no mucho. Lamentavelmente.
“Se um diretor e uma atriz resolverem de que em determinada cena a atriz deva ficar nua, a platéia vai achar que ela nunca esteve tão bem vestida”. Ziembinski.
quarta-feira, 11 de agosto de 2010
Convidado a se retirar do Éden.
-Leo não precisa ser hoje não precisa ser já, mas quando você puder ir fazendo as suas malas...
Sócrates dizia que nascemos muitos e morremos um só. Ele dizia que vários Sócrates nasceram. Um provavelmente jogador de futebol, outro cozinheiro, um ladrão e finalmente o Sócrates filósofo que era mais forte do que todos e foi o mais tonto que tomou o veneno e morreu.
Já Fernando Pessoa convivia bem com todos os seus eu(s) e não dispensava nenhum. Mas aqui estávamos falando de Fernanda e não de Fernando.
-Leo não precisa ser hoje e não precisa ser já, mas quando você puder indo fazer...
-Já entendemos, não precisa repetir. Nós respondemos. Sim porque quando aquela menina de um metro e oitenta nos disse aquilo com uma emoção difícil de captar, ela pegou todos os Leos desprevenidos. Acreditem ou não todos os Leos eram completamente apaixonados por ela inteira, menos um.
Nessa tarde o Leo artista quis beber. O Leo bêbado criar. O Leo machista no mesmo instante quis obrigá-la a transar com ele a força. Já o Leo feminino quis cair de joelhos. O hippie cogitou uma greve de fome no que o Leo ator apoiou. O claustrofóbico queria ir atrás de uma flor. O Leo poeta sentou olhando para o infinito.
Mas teve um deles que não se abalou. Deu de ombros. Este Leo, sempre achou a menina meio desengonçada, com uns olhos de peixe morto, que tinha um tique chato de coçar a garganta. Foi ele que consolou os outros. Foi ele que pouco a pouco, de um em um foi os pondo pra cima e fazendo os rir. Tomou o leme do barco e enfrentou as ondas e a tempestade, enquanto os outros queriam se jogar do barco.
Este mesmo Leo, que é o mais alto e poderoso deles e o único que nunca havia lido Olavo Bilac, porque até o Leo arquiteto frustrado se emocionava com Olavo Bilac. Enfim esse mesmo Leo, que apesar de ser o mais ignorante é o mais sábio se lembrou da história do seu tetra-tris-tris-tris-tris-tristristristris trisavô. O Adão. E entendeu que Deus é bom.
“E Adão, vendo fechar-se a porta do Éden, vendo que Eva olhava o deserto e hesitava tremendo,
Disse:
-Chega-te a mim! E entra no meu amor,”
Esse Leo entendeu que Deus não tirou o paraíso de Adão, porque o paraíso é qualquer lugar onde estivesse Eva.
Já seus companheiros haviam sido sim expulsos do paraíso. Teve dó deles, mas tocou o barco. Esse Leo, sempre teve uma malinha e sempre pegou a estrada. É o mais aventureiro de todos e o único Leo que tem nome. O único que já enfrentou o picadeiro do circo e não teve medo.
É o palhaço Leleco. Mostrou a língua, deu de ombros. Fingiu que ia chorar e gargalhou. Eu acho que mesmo hoje tanto tempo depois os Leos ainda sentem falta dela. Ele o Leleco não sente nada. Absolutamente nada por ela. Prefere as bailarinas.
Sócrates dizia que nascemos muitos e morremos um só. Ele dizia que vários Sócrates nasceram. Um provavelmente jogador de futebol, outro cozinheiro, um ladrão e finalmente o Sócrates filósofo que era mais forte do que todos e foi o mais tonto que tomou o veneno e morreu.
Já Fernando Pessoa convivia bem com todos os seus eu(s) e não dispensava nenhum. Mas aqui estávamos falando de Fernanda e não de Fernando.
-Leo não precisa ser hoje e não precisa ser já, mas quando você puder indo fazer...
-Já entendemos, não precisa repetir. Nós respondemos. Sim porque quando aquela menina de um metro e oitenta nos disse aquilo com uma emoção difícil de captar, ela pegou todos os Leos desprevenidos. Acreditem ou não todos os Leos eram completamente apaixonados por ela inteira, menos um.
Nessa tarde o Leo artista quis beber. O Leo bêbado criar. O Leo machista no mesmo instante quis obrigá-la a transar com ele a força. Já o Leo feminino quis cair de joelhos. O hippie cogitou uma greve de fome no que o Leo ator apoiou. O claustrofóbico queria ir atrás de uma flor. O Leo poeta sentou olhando para o infinito.
Mas teve um deles que não se abalou. Deu de ombros. Este Leo, sempre achou a menina meio desengonçada, com uns olhos de peixe morto, que tinha um tique chato de coçar a garganta. Foi ele que consolou os outros. Foi ele que pouco a pouco, de um em um foi os pondo pra cima e fazendo os rir. Tomou o leme do barco e enfrentou as ondas e a tempestade, enquanto os outros queriam se jogar do barco.
Este mesmo Leo, que é o mais alto e poderoso deles e o único que nunca havia lido Olavo Bilac, porque até o Leo arquiteto frustrado se emocionava com Olavo Bilac. Enfim esse mesmo Leo, que apesar de ser o mais ignorante é o mais sábio se lembrou da história do seu tetra-tris-tris-tris-tris-tristristristris trisavô. O Adão. E entendeu que Deus é bom.
“E Adão, vendo fechar-se a porta do Éden, vendo que Eva olhava o deserto e hesitava tremendo,
Disse:
-Chega-te a mim! E entra no meu amor,”
Esse Leo entendeu que Deus não tirou o paraíso de Adão, porque o paraíso é qualquer lugar onde estivesse Eva.
Já seus companheiros haviam sido sim expulsos do paraíso. Teve dó deles, mas tocou o barco. Esse Leo, sempre teve uma malinha e sempre pegou a estrada. É o mais aventureiro de todos e o único Leo que tem nome. O único que já enfrentou o picadeiro do circo e não teve medo.
É o palhaço Leleco. Mostrou a língua, deu de ombros. Fingiu que ia chorar e gargalhou. Eu acho que mesmo hoje tanto tempo depois os Leos ainda sentem falta dela. Ele o Leleco não sente nada. Absolutamente nada por ela. Prefere as bailarinas.
sexta-feira, 6 de agosto de 2010
Amor colegial
Leo,
Eu sempre imagino que eu posso sair na rua e esbarrar com você. Acaba que eu nunca o encontro, afinal São Paulo é enorme. E hoje nessa sexta feira nublada e eu lá, encostada na parede do “espaço Unibanco”, vendo as pessoas passarem pela Augusta. Eu ali no frio dessa sexta nublada, esperando dar o horário do filme, vejo um rapaz passando e ele também me vê. Ele me reconhece e para.
Como sempre ele me dá um abraço bem caloroso, que ele dá sempre em todo mundo. Ele esboça um meio sorriso e eu dou um sorriso de uma menininha que acaba de ganhar uma boneca linda que ela sonhava.
Ele mal para e só pergunta:
-Você vai ao cinema?
Pergunta assim só para preencher uma fala, ouvir a resposta afirmativa que ele já sabe e poder continuar seu caminho e cinco ou dois minutos depois se esquecer de ter me visto.
Eu ainda tento falar algo mais, acontece que ele nem ouve só diz já subindo a Augusta:
-Bom te ver.
Imaginei quer dizer sonhei que ele pudesse ter parado naquele dia frio e ter se convidado para me acompanhar no filme. Depois iríamos jantar, tomaríamos umas cervejas e ele confessaria que sempre me amou. Ou que sempre me achou linda. Falaria que meus cabelos curtos ficaram sensacionais.
E já de noite, com todo aquele movimento de sexta à noite na Rua Augusta, aqueles jovens indo e vindo dos bares, nas boates, nos cafés e nos teatros, ele de repente me beija. E os nossos dois corpos no vento frio se aquecem. Ele me olha nos olhos e diz:
-Você é a mulher mais linda que existe.
Não preciso dizer quem era esse rapaz, você estava lá Leo. E essa sexta seria sublime. Mas você não parou e eu assisti ao filme sozinha, um casal falava atrás de mim, um outro homem se levantou para atender ao celular e o filme me deu um resto de contentamento. Uma saída da realidade que é a função de um filme ou das drogas.
Eu sei que um dia eu vou te esquecer. Que você nunca mais vai querer saber de mim. Eu vi hoje nos seus olhos que eu sou só uma conhecida. Que eu sou um filme que você já viu. Um filme que você não quer rever. Um filme que você não quer participar.
Mas você Leo é o filme da minha vida! Eu nunca amei ninguém assim. E tenho certeza que eu jamais amarei. Você é perfeito.
E esse seu jeito correto, esse seu caráter honesto me faz só ficar mais apaixonada. Somado a este seu jeitinho único de andar, com esses cílios e esses cabelos despenteados. Nunca alguém me provocou tanto.
Agora vou continuar saindo pela Augusta procurando entre os rapazes aquele que me faz tremer e terei fé, afinal milagres acontecem todos os dias. Você mesmo é um milagre.
P S: Eu recomendo o filme apesar de tudo. E você? Continua indo muito ao teatro? Está escrevendo? Adoro os seus textos. Beijos.
Não leitora eu nunca recebi um e-mail desses. Aliás, eu nunca recebo e-mails nem parecidos com este. E lamentavelmente eu já os escrevi as centenas. Mas quem sabe leitora se numa dessas sextas frias nós não nos cruzamos por aí nesta cidade de São Paulo. É quando a gente menos espera. Não é assim nos filmes?
Eu sempre imagino que eu posso sair na rua e esbarrar com você. Acaba que eu nunca o encontro, afinal São Paulo é enorme. E hoje nessa sexta feira nublada e eu lá, encostada na parede do “espaço Unibanco”, vendo as pessoas passarem pela Augusta. Eu ali no frio dessa sexta nublada, esperando dar o horário do filme, vejo um rapaz passando e ele também me vê. Ele me reconhece e para.
Como sempre ele me dá um abraço bem caloroso, que ele dá sempre em todo mundo. Ele esboça um meio sorriso e eu dou um sorriso de uma menininha que acaba de ganhar uma boneca linda que ela sonhava.
Ele mal para e só pergunta:
-Você vai ao cinema?
Pergunta assim só para preencher uma fala, ouvir a resposta afirmativa que ele já sabe e poder continuar seu caminho e cinco ou dois minutos depois se esquecer de ter me visto.
Eu ainda tento falar algo mais, acontece que ele nem ouve só diz já subindo a Augusta:
-Bom te ver.
Imaginei quer dizer sonhei que ele pudesse ter parado naquele dia frio e ter se convidado para me acompanhar no filme. Depois iríamos jantar, tomaríamos umas cervejas e ele confessaria que sempre me amou. Ou que sempre me achou linda. Falaria que meus cabelos curtos ficaram sensacionais.
E já de noite, com todo aquele movimento de sexta à noite na Rua Augusta, aqueles jovens indo e vindo dos bares, nas boates, nos cafés e nos teatros, ele de repente me beija. E os nossos dois corpos no vento frio se aquecem. Ele me olha nos olhos e diz:
-Você é a mulher mais linda que existe.
Não preciso dizer quem era esse rapaz, você estava lá Leo. E essa sexta seria sublime. Mas você não parou e eu assisti ao filme sozinha, um casal falava atrás de mim, um outro homem se levantou para atender ao celular e o filme me deu um resto de contentamento. Uma saída da realidade que é a função de um filme ou das drogas.
Eu sei que um dia eu vou te esquecer. Que você nunca mais vai querer saber de mim. Eu vi hoje nos seus olhos que eu sou só uma conhecida. Que eu sou um filme que você já viu. Um filme que você não quer rever. Um filme que você não quer participar.
Mas você Leo é o filme da minha vida! Eu nunca amei ninguém assim. E tenho certeza que eu jamais amarei. Você é perfeito.
E esse seu jeito correto, esse seu caráter honesto me faz só ficar mais apaixonada. Somado a este seu jeitinho único de andar, com esses cílios e esses cabelos despenteados. Nunca alguém me provocou tanto.
Agora vou continuar saindo pela Augusta procurando entre os rapazes aquele que me faz tremer e terei fé, afinal milagres acontecem todos os dias. Você mesmo é um milagre.
P S: Eu recomendo o filme apesar de tudo. E você? Continua indo muito ao teatro? Está escrevendo? Adoro os seus textos. Beijos.
Não leitora eu nunca recebi um e-mail desses. Aliás, eu nunca recebo e-mails nem parecidos com este. E lamentavelmente eu já os escrevi as centenas. Mas quem sabe leitora se numa dessas sextas frias nós não nos cruzamos por aí nesta cidade de São Paulo. É quando a gente menos espera. Não é assim nos filmes?
quarta-feira, 4 de agosto de 2010
Meu nome não é fazenda, é chacra.
Uma moça com amigos em comum se aproxima de mim numa festa e pergunta:
-Como está a decoração?
-Decoração?
Eu digo surpreso. Decoração de que? De que texto?
-Você está famoso decorando um monte de casa de bacanas.
A moça, aliás, bem sem charme da uma risadinha e me sai com essa:
-Tchau Leo Selteman.
Grito que meu nome é Chacra, James Chacra, quer dizer Leo Bond. Oh bebedeira. Tarde demais ela nem ouve. Uma amiga que presenciou me explica que Leo Shehtman é um famoso decorador e a moça provavelmente confunde Chacra com Shehtman.
Eis que alguns dias depois, o meu celular toca e dessa vez para a minha alegria, uma voz feminina me pergunta se eu sou o famoso dramaturgo Leo Chacra. Agora sim, nada de Da Vinci, de Leo Karma, Leo Jaime ela queria uma entrevista comigo mesmo. Eu confirmei três vezes é comigo mesmo? E ela:
-Claro com você Leo Chacra diretor de teatro. Tem outro?
Pensei por um instante e disse que tinha um Leo Chacra no facebook. Pela foto é um mal encarado, parece um personagem do Tarantino e provavelmente não fala português, pois nunca me respondeu nenhuma mensagem oculta e olha que eu já o xinguei muito.
-Estou aqui em baixo desce.
Eu não tinha a mínima idéia do que eu fosse encontrar. Ela me disse que era estudante de letras. Tentarei descrevê-la leitor. Sabe aquele tipo de pessoa que quando você a conhece, o kilo da Augusta, por exemplo, onde fomos almoçar vira um palácio renascentista com vista para o mediterrâneo? Ao som de Louis Armstrong ao vivo?
Que a presença dela transforma a livraria da Vila, com seus livros de arte no museu do Louvre? Aquela mulher a qual andando na rua deixa São Paulo mais charmosa que Veneza?
Então era uma jovem menina assim. Boca cor de um vermelho que eu nunca tinha visto, cabelos curtinhos, um pescoço de enfartar qualquer vampiro. Enfim um conjunto de deixar Michelangelo com inveja do ser que a criou.
Durante a tarde em que passamos juntos ela perguntou sobe minha carreira. Discorreu sobre os caminhos futuros da arte. Falou-me sobre seus cineastas preferidos. E fomos ver a vila modernista de Flávio de Carvalho na Lorena. Que ao lado dela é um lugar como outro qualquer. E o que aquilo pode ter de especial ao lado de um ser mais belo que a mais bela obra de arte? Mas refletido nos olhos dela aquela casa se transformava em algo mais do que o senhor Niemeyer sonhou um dia.
Não leitor. Eu não a beijei, pelo simples fato de não se poder beijar obras de arte. E também pela nossa escancarada diferença de década e meia de idade. Mas que eu tentei eu tentei.
Ofereci uma carona para a sua casa ela achou justo. Chegando à porta da casa dela ela me disse que a entrevista havia ficado ótima. Nem perguntei para onde era. E quando ela já ia entrando parou e voltou:
-Só mais uma coisa.
-Pode dizer.
E ela meio sem graça.
-Depois eu queria falar sobre o seu pai. Ficou faltando.
-Meu pai?
Ela fez uma cara de entediada com a minha reação.
-É o seu pai sim. O seu pai o Plínio Marcos. #
#nota do autor: Leo Lama é diretor e autor de teatro. É também filho do grande dramaturgo Plínio Marcos.
-Como está a decoração?
-Decoração?
Eu digo surpreso. Decoração de que? De que texto?
-Você está famoso decorando um monte de casa de bacanas.
A moça, aliás, bem sem charme da uma risadinha e me sai com essa:
-Tchau Leo Selteman.
Grito que meu nome é Chacra, James Chacra, quer dizer Leo Bond. Oh bebedeira. Tarde demais ela nem ouve. Uma amiga que presenciou me explica que Leo Shehtman é um famoso decorador e a moça provavelmente confunde Chacra com Shehtman.
Eis que alguns dias depois, o meu celular toca e dessa vez para a minha alegria, uma voz feminina me pergunta se eu sou o famoso dramaturgo Leo Chacra. Agora sim, nada de Da Vinci, de Leo Karma, Leo Jaime ela queria uma entrevista comigo mesmo. Eu confirmei três vezes é comigo mesmo? E ela:
-Claro com você Leo Chacra diretor de teatro. Tem outro?
Pensei por um instante e disse que tinha um Leo Chacra no facebook. Pela foto é um mal encarado, parece um personagem do Tarantino e provavelmente não fala português, pois nunca me respondeu nenhuma mensagem oculta e olha que eu já o xinguei muito.
-Estou aqui em baixo desce.
Eu não tinha a mínima idéia do que eu fosse encontrar. Ela me disse que era estudante de letras. Tentarei descrevê-la leitor. Sabe aquele tipo de pessoa que quando você a conhece, o kilo da Augusta, por exemplo, onde fomos almoçar vira um palácio renascentista com vista para o mediterrâneo? Ao som de Louis Armstrong ao vivo?
Que a presença dela transforma a livraria da Vila, com seus livros de arte no museu do Louvre? Aquela mulher a qual andando na rua deixa São Paulo mais charmosa que Veneza?
Então era uma jovem menina assim. Boca cor de um vermelho que eu nunca tinha visto, cabelos curtinhos, um pescoço de enfartar qualquer vampiro. Enfim um conjunto de deixar Michelangelo com inveja do ser que a criou.
Durante a tarde em que passamos juntos ela perguntou sobe minha carreira. Discorreu sobre os caminhos futuros da arte. Falou-me sobre seus cineastas preferidos. E fomos ver a vila modernista de Flávio de Carvalho na Lorena. Que ao lado dela é um lugar como outro qualquer. E o que aquilo pode ter de especial ao lado de um ser mais belo que a mais bela obra de arte? Mas refletido nos olhos dela aquela casa se transformava em algo mais do que o senhor Niemeyer sonhou um dia.
Não leitor. Eu não a beijei, pelo simples fato de não se poder beijar obras de arte. E também pela nossa escancarada diferença de década e meia de idade. Mas que eu tentei eu tentei.
Ofereci uma carona para a sua casa ela achou justo. Chegando à porta da casa dela ela me disse que a entrevista havia ficado ótima. Nem perguntei para onde era. E quando ela já ia entrando parou e voltou:
-Só mais uma coisa.
-Pode dizer.
E ela meio sem graça.
-Depois eu queria falar sobre o seu pai. Ficou faltando.
-Meu pai?
Ela fez uma cara de entediada com a minha reação.
-É o seu pai sim. O seu pai o Plínio Marcos. #
#nota do autor: Leo Lama é diretor e autor de teatro. É também filho do grande dramaturgo Plínio Marcos.
segunda-feira, 2 de agosto de 2010
Minha primeira vez
Lembro-me que na minha primeira vez não senti absolutamente nada. Meu pai havia nos levado, eu e meus irmãos, ao estádio assistir a uma partida de futebol. Fiquei fascinado com os rojões antes do jogo propriamente dito. Depois dos fogos não me recordo de nada. Nem quem eram os times, nem quanto foi o jogo.
A minha relação com futebol sempre foi a de relação alguma. É uma eterna sensação de ser um espião estrangeiro dentro do meu próprio país. Não há um dia se quer que algum outro ser humano do sexo masculino, principalmente porteiros de prédio e taxistas que não venham me perguntar:
“Viu o jogo ontem”? “Sabe quanto ta o jogo”? “E o Santos”? No que eu não posso responder a verdade: “Claro que não vi o jogo”. “Mas não me interessa mesmo o resultado do jogo”. “O Santos continua lá em Santos e eu aqui em São Paulo”.
Não, eu não dou esses tipos de respostas, aprendi uma técnica que rende até quarenta minutos de conversa sem que eles desconfiem que eu seja um E.T. Consiste em só concordar com o interlocutor. Se ele disser que o jogo foi fraco, concorde. Fraquíssimo. Se ele for palmeirense seja também. Se disser que tal jogador é melhor do que o outro, claro que é.
Nesta primeira visita ao estádio e última, me recordo de me dar um sono, uma angustia, aquilo foi uma chatice só.
Mas também por que dizer que futebol é brasileiro? Tem no mundo todo. Acontece que aqui aceitamos tudo. O homem pode até ser ateu, gay, bêbado, louco, ator, bailarino, travesti, agora se alguém disser que não gosta de futebol é considerado um traidor da pátria amada, um criminoso terrorista.
Você mesmo leitor já está com raiva de mim. Confesse, está. No Brasil futebol é a coisa mais sagrada que existe. E eu sou um inimigo público!
Mas digo que mesmo que todos virem rinocerontes eu continuo um ser humano. Podem me cercar. Podem tirar a minha vida. Mas nunca vão tirar a minha... Liberdade. Ok, “Ionesco” e “Coração valente”.
Uma amiga me levou a um clube em que só as mulheres freqüentam. Nessas reuniões elas me orientaram que não se pode falar de futebol e que devíamos relatar decepções amorosas e também falar mal de outras pessoas não presentes. No que eu pensei. “Vou acabar presidente desse clube”.
Concluindo certa vez numa festa junina eu ainda menino, entrei na barraca da cigana que lia o futuro, ela pegou minha mão e não teve dúvida: “Você vai ser jogador de futebol quando crescer”. Acho que foi aí que eu descobri o teatro. Dei uma piscadinha para a cigana-atriz e disse: “Então Deus queira, que eu não cresça nunca”.
A minha relação com futebol sempre foi a de relação alguma. É uma eterna sensação de ser um espião estrangeiro dentro do meu próprio país. Não há um dia se quer que algum outro ser humano do sexo masculino, principalmente porteiros de prédio e taxistas que não venham me perguntar:
“Viu o jogo ontem”? “Sabe quanto ta o jogo”? “E o Santos”? No que eu não posso responder a verdade: “Claro que não vi o jogo”. “Mas não me interessa mesmo o resultado do jogo”. “O Santos continua lá em Santos e eu aqui em São Paulo”.
Não, eu não dou esses tipos de respostas, aprendi uma técnica que rende até quarenta minutos de conversa sem que eles desconfiem que eu seja um E.T. Consiste em só concordar com o interlocutor. Se ele disser que o jogo foi fraco, concorde. Fraquíssimo. Se ele for palmeirense seja também. Se disser que tal jogador é melhor do que o outro, claro que é.
Nesta primeira visita ao estádio e última, me recordo de me dar um sono, uma angustia, aquilo foi uma chatice só.
Mas também por que dizer que futebol é brasileiro? Tem no mundo todo. Acontece que aqui aceitamos tudo. O homem pode até ser ateu, gay, bêbado, louco, ator, bailarino, travesti, agora se alguém disser que não gosta de futebol é considerado um traidor da pátria amada, um criminoso terrorista.
Você mesmo leitor já está com raiva de mim. Confesse, está. No Brasil futebol é a coisa mais sagrada que existe. E eu sou um inimigo público!
Mas digo que mesmo que todos virem rinocerontes eu continuo um ser humano. Podem me cercar. Podem tirar a minha vida. Mas nunca vão tirar a minha... Liberdade. Ok, “Ionesco” e “Coração valente”.
Uma amiga me levou a um clube em que só as mulheres freqüentam. Nessas reuniões elas me orientaram que não se pode falar de futebol e que devíamos relatar decepções amorosas e também falar mal de outras pessoas não presentes. No que eu pensei. “Vou acabar presidente desse clube”.
Concluindo certa vez numa festa junina eu ainda menino, entrei na barraca da cigana que lia o futuro, ela pegou minha mão e não teve dúvida: “Você vai ser jogador de futebol quando crescer”. Acho que foi aí que eu descobri o teatro. Dei uma piscadinha para a cigana-atriz e disse: “Então Deus queira, que eu não cresça nunca”.
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